segunda-feira, 16 de março de 2020

No terminal dois do aeroporto de Lisboa, o coronavírus não evita enchentes




CORONAVÍRUS
No terminal dois do aeroporto de Lisboa, o coronavírus não evita enchentes

Fotografias tiradas este domingo mostram cenário de grande concentração de pessoas em espaço reduzido do aeroporto. Funcionário denuncia: "Repete-se diariamente. As pessoas ficam preocupadas".

Gonçalo Correia
Texto
Nuno Vinha
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16 mar 2020, 08:27 4

Boa parte do país entrou em isolamento voluntário para evitar propagar o novo coronavírus, a Autoridade Marítima Nacional proibiu “atividades desportivas ou de lazer que impliquem aglomerados das pessoas nas praias”, vários espaços comerciais foram obrigados a encerrar em alguns períodos horários e a limitar a sua ocupação (é o caso, por exemplo, de restaurantes, centros comerciais e esplanadas) e as autoridades recomendam genericamente que sejam evitados ajuntamentos em espaços exíguos. As recomendações, porém, parecem não ser inteiramente seguidas no Aeroporto de Lisboa.

Algumas fotografias enviadas este domingo ao Observador, tiradas a partir da hora de almoço deste mesmo dia, 15 de março, ilustram um cenário algo contraditório com as recomendações das autoridades de saúde: na zona do terminal dois do aeroporto da capital portuguesa, é possível ver uma concentração de um grande número de pessoas.

A situação foi denunciada por um Técnico de Tráfego de Assistência em Escala (ITAE) da empresa de handling Portway ao Observador, que confirmou a autenticidade das fotografias e a informação de que foram tiradas efetivamente já este fim-de-semana. O trabalhador preferiu não se identificar, por receio de eventuais consequências profissionais na sequência das suas denúncias.

“Estas situações repetem-se diariamente, por volta da hora de almoço e das 17h. São momentos de especial afluência de passageiros e em que se registam atrasos de voos, o que somado faz com que as pessoas se aglomerem em espaços muito reduzidos, a meu ver com poucas condições de higiene e segurança“, queixa-se este funcionário, que trabalha especificamente “na área do check in e de embarques”, ou seja no terminal 2 do Aeroporto de Lisboa, há alguns anos — e que já trabalha no Aeroporto há mais de uma década.

Estar nesta situação cria um incómodo para os funcionários e os passageiros. Não faz muito sentido ouvir as recomendações para evitar concentrações e depois ver grandes aglomerados de pessoas em espaços tão pequenos como este o é. O terminal 2 não tem capacidade para aglomerar tanta gente e perante recomendações de distanciamento social é normal que as pessoas fiquem mais preocupadas, estando ali confinadas com tanta gente”, critica o técnico.

O funcionário da Portway diz ainda que “só há três ou quatro dias” a empresa disponibilizou “luvas, máscaras e desinfetantes” a funcionários que trabalham em zonas tão movimentadas do Aeroporto de Lisboa quando o terminal 2, o que considera demasiado tardia visto que “a situação [do surto] já é uma realidade há mais tempo”. Segundo o técnico, vários funcionários, antes de terem recebido material de proteção, dirigiram-se a colegas seguranças do aeroporto de Lisboa solicitando-lhes que lhes dispensassem material como luvas, por exemplo.

O Observador contactou mais um funcionário que trabalha na empresa em funções similares que corroborou as queixas. “Há vários picos de afluência, pelo menos dois a três picos durante o dia. Um dos picos é de manhã, outro a seguir ao almoço e depois à tarde”.

O país está em estado de alerta e estas notícias todas deixam-nos preocupados. Vemos as coisas todas a fechar, os estabelecimentos que recebem multidões com restrições — centros comerciais, cinemas e por aí fora — e nós estamos ali naquelas condições”, lamentou o segundo funcionário ouvido pelo Observador.

A empresa, apontou este segundo funcionário, “tem enviado e-mails dia sim dia não, com atualizações do que vai ser feito daqui para a frente, mas são apenas medidas preventivas, como lavar as mãos”. Relativamente ao material de proteção, este segundo funcionário revelou que este domingo “havia desinfetante mas não havia luvas”. Esta é uma situação “que se percebe, porque sabemos que estamos numa situação em que há escassez”, mas que motiva preocupações aos funcionários, que a empresa tentou acalmar na última circular interna, em que garantia estar a “fazer esforços para repor o material — luvas e desinfetantes —, para que isso não faltasse”.

Quanto à ausência de material de proteção numa fase inicial de propagação do surto, a informação foi corroborada pelo segundo funcionário ao Observador: “Sem certeza absoluta, mas penso que o material chegou à empresa há três dias. Antes não havia material, não nos tinha sido dado nada, e sei que houve material como luvas pedido a seguranças” do aeroporto, apontou.

ANA remete responsabilidades para os passageiros
Contactada pelo Observador sobre as queixas de “concentração e aglomeração de pessoas na zona do terminal dois do Aeroporto de Lisboa”, a ANA – Aeroportos de Portugal, que gere aeroportos como o Humberto Delgado, em Lisboa, reagiu rejeitando responsabilidades por essa alegada aglomeração excessiva.

Em mensagem escrita, a empresa defende: “A ANA, através de avisos colocados na aerogare e das suas equipas no AHD, comunica as recomendações da DGS aos passageiros, incluindo o respeito pela distância mínima entre as pessoas, pedindo a colaboração cívica dos passageiros e das pessoas que se encontram na área pública dos aeroportos”.

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