João Duque: “Os preços das casas podem vir a cair por aí
abaixo”
Rodolfo Alexandre
Reis e Shrikesh Laxmidas 27 Março 2020, 09:25
Economista fala em “paragem absoluta” no mercado.
Agentes, inquilinos, proprietários e consultores pintam ao JE um cenário
dramático.
“Uma paragem
absoluta. Passámos para uma coisa que era absolutamente inesperada. Neste
momento não devem andar-se a vender casas”. É desta forma que João Duque olha
para o impacto que o surto da Covid-19 já tem no setor imobiliário em Portugal.
O economista, tal como os principais players no mercado, diz que é prematuro
falar em números sobre os preços das casas, mas diz ser possível que “venham
por aí abaixo”.
Alarmado com esta
situação está também Luís Lima, presidente da Associação dos Profissionais e
Empresas de Mediação Imobiliária de Portugal (APEMIP). “Na conjuntura atual
quem é que se atreve a entrar dentro de casa alguém?” Luís Lima pede ao Governo
para que não se esqueça de um setor do qual “dependem 40 mil pessoas”. Em
relação aos preços, responde de forma pragmática: “Se não há mercado… está tudo
dito”.
Com o estado de
emergência decretado na semana passada muitas foram as áreas da sociedade que
pararam a sua atividade ou aderiram ao teletrabalho. No setor da construção,
foi uma paragem parcial. “Tudo o que é trabalho intelectual (projetistas,
diretores de obra) está em teletrabalho, mas quem realmente põe a ‘mão na
massa’ continua no terreno”, afirma Nuno Garcia, diretor-geral da GesConsult,
empresa de gestão e fiscalização de obras. “As obras continuam a rolar e com
alguma normalidade dentro do possível”.
Assume, contudo,
que se começa a notar “alguma dificuldade no fornecimento de materiais e
mão-de-obra contagiada”, já que “a construção por si só é um meio onde o risco
de contágio é brutal, as regras básicas de higiene são difíceis de implementar
numa obra, como por exemplo lavar as mãos constantemente e o cumprimentar a
outra pessoa continua a ver-se muito”, refere.
Os especialistas
assumem que a quebra no valor das rendas também se vai fazer sentir. Romão
Lavadinho, presidente da Associação dos Inquilinos Lisbonenses (AIL), mostra-se
preocupado com o valor das rendas especulativas como “aquelas que existem
dentro de Lisboa ou no Porto, que é pagar 20 e 30 eurosm2 por uma renda, ou
seja, uma casa com 50m2 se pagar 20eurosm2, paga mil euros de renda por um T1 e
isso é completamente impossível”, sublinha.
Esta semana, a
AIL apresentou uma proposta ao Governo para baixar a renda na mesma percentagem
em que baixe o rendimento.
Luís Menezes
Leitão, presidente da Associação Lisbonense de Proprietários (ALP), refere que
a queda das rendas “é um fator claríssimo, em virtude da falta de rendimento”
deixando um reparo ao Governo. “Andámos nos últimos tempos a queixar-nos do
turismo e a fazer restrições ao alojamento local e agora, de repente vamos ter
muitas saudades do funcionamento do imobiliário nos termos em que estava”,
alerta.
O alojamento
local será por isso um dos segmentos do imobiliário que poderá sofrer mais com
esta crise, e ao mesmo tempo readaptar-se. “No início do ano já estávamos a
registar movimentos de pequenos proprietários que tinham duas ou três casas em
alojamento local e que estavam a transitar para o arrendamento tradicional.
Estamos a ver agora com a queda abrupta no turismo, que muitos deles têm
prejuízos e isso cria uma necessidade de venda ou então optarem por ter a casa
em regime de arrendamento e ganhar menos”, refere Ricardo Sousa, CEO da
Century21 Portugal. Acredita que neste ponto “vamos ver também um aumento da
oferta, quem tinha três casas poderá vender duas”.
Francisco Horta e
Costa, managing director da CBRE, diz ser “natural que os preços das casas
abrandem ou desçam, porque o nível de confiança das pessoas desceu
drasticamente numa semana”. “Tudo aquilo que tínhamos por garantido de repente
foi posto em causa em meia dúzia de dias”, diz, adiantando que “quem tiver
liquidez para investir provavelmente vai comprar melhor, e comprar para
arrendar neste momento é uma boa opção”.
Por serem “áreas
mais expostas, o alojamento local, os hotéis e o comércio (centros comerciais e
de rua) serão as mais afetadas no imediato” diz Pedro Lancastre, CEO da JLL
Portugal, que traça um cenário geral dos segmentos. “O residencial é das áreas
mais defensivas quando falamos em transações imobiliárias, porque quando há um
clima de incerteza as pessoas demoram mais tempo a tomar decisões”. O CEO
considera que o teletrabalho para a área de escritórios “é um teste gigantesco
a todos nós e que na esmagadora maioria dos casos está a ser superado”.
Sentimento
partilhado por Eric van Leuven, CEO da Cushman & Wakefield. “Não acredito
de todo no fim dos escritórios, porque também vamos dar-nos conta de que
gostamos de estar rodeados das pessoas e precisamos delas para trocar ideias,
mas acredito que o teletrabalho terá uma expressão ainda maior”, realça.
João Duque diz
que a grande questão é saber quanto tempo o mercado imobiliário vai demorar a
ser reanimado. “A minha expetativa é que no primeiro trimestre de 2021 consiga
mais ou menos recuperar”, conclui.
Notícia publicada
na edição semanal do Jornal Económico de 27 de março
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