AQUECIMENTO
GLOBAL
Oceanos nunca
foram tão quentes na história humana como em 2019. E aumento da temperatura
está a acelerar
Cientistas de
institutos de todo o mundo avisam que, mesmo que se reduzam os gases com efeito
de estufa, a temperatura da água vai continuar a aumentar no futuro mais
próximo.
Patrícia Carvalho
Patrícia Carvalho
13 de Janeiro de 2020, 20:12
Os últimos anos
têm sido de recordes para os oceanos, mas daqueles que eram dispensáveis. Os
dados de um estudo agora revelado mostram que os oceanos atingiram nos últimos
cinco anos as temperaturas mais elevadas desde os anos 1950 e que não há
registo na história humana de as suas águas alguma vez terem estado mais
quentes do que em 2019. E como se este cenário não fosse já suficientemente
pesado, os 14 cientistas de 11 institutos de todo o mundo que participaram no
estudo concluíram que este aumento da temperatura tem acelerado e muito nos
últimos anos e que, apesar de a necessidade de agir ser urgente, a resposta dos
oceanos será lenta e não é previsível que a situação melhore rapidamente.
O artigo com os
resultados obtidos pela equipa de cientistas liderada por Lijing Cheng, do
Centro para o Clima e as Ciências Ambientais do Instituto da Física Atmosférica
(IAP, na sigla inglesa) da Academia Chinesa de Ciências, foi publicado esta
segunda-feira na edição online da Advances in Atmospheric Sciences, e vai no
mesmo sentido dos relatórios mais recentes sobre o estado dos oceanos,
nomeadamente o do ano passado do Painel Intergovernamental para as Alterações
Climáticas (IPCC) das Nações Unidas dedicado aos oceanos e à criosfera.
Um dos efeitos
das emissões crescentes de gases com efeito de estufa (GEE) é o aumento da
temperatura dos oceanos (que absorvem mais de 90% do excesso de temperatura),
sobretudo até aos 2000 metros de profundidade, com todas as consequências
negativas que daí advêm para a biodiversidade, as zonas costeiras (por causa da
subida do nível médio do mar) e o aumento de fenómenos climáticos extremos, que
em conjunto causam perdas de vidas e prejuízos económicos e ambientais
elevadíssimos. Os alertas para a necessidade urgente de redução dessas emissões
têm-se sucedido, com particular impacto no último ano e após a divulgação de
três importantes relatórios do IPCC, mas a verdade é que os dados disponíveis
mostram que elas têm continuado a aumentar e que a capacidade de o mundo cumprir
as metas do Acordo de Paris – que apontam para um aumento da temperatura abaixo
dos dois graus Celsius e, se possível, não superior a 1,5 graus em relação aos
níveis pré-industriais – está cada vez mais comprometida, a menos que se actue
de imediato.
A análise dos
dados recolhidos pelo IAP e também pela NOAA, a agência dos Estados Unidos para
o oceano e a atmosfera, mostra que o aquecimento global está a fazer-se sentir
em toda a sua intensidade na temperatura da água dos oceanos. Lijing Cheng e os
restantes cientistas concluíram que os últimos dez anos estão no Top 10 dos
mais quentes para os oceanos, desde os anos 1950, e que, desse grupo, os
últimos cinco foram os mais quentes de todos. Já o ano de 2019 foi aquele em
que os oceanos do mundo apresentaram as temperaturas “mais quentes registadas
na história humana”, lê-se no artigo. Esse aquecimento faz-se sentir sobretudo
em profundidades até aos 2000 metros, mas ele está presente em toda a extensão
dos oceanos, até ao seu fundo, indicam os dados analisados.
Os cientistas
precisam também que o aumento da temperatura dos oceanos tem vindo a acelerar
muito nos anos mais recentes. Olhando para o período entre 1955 e 1986, os
investigadores concluíram que o aquecimento dos oceanos “foi relativamente
constante”, mas tudo mudou no período seguinte, entre 1987 e 2019. Aí,
refere-se no artigo, o aquecimento foi cerca de 450% do anteriormente
registado, “reflectindo um grande aumento no nível das alterações climáticas
globais”.
No comunicado que
acompanha o artigo, explica-se que em 2019 a temperatura dos oceanos estava
cerca de 0,075 graus Celsius acima da média alcançada no período entre 1981 e
2010. Aí, Lijing Cheng compara a quantidade de calor que o oceano teve de
absorver para atingir este aumento com a energia libertada pela bomba de
Hiroxima. “A quantidade de calor que colocámos nos oceanos do mundo nos últimos
25 anos equivale a 3600 milhões de explosões da bomba atómica em Hiroxima”,
disse. Para o cientista não há mais lugar para quaisquer dúvidas sobre as
alterações climáticas e o que as está a causar. “Este aquecimento dos oceanos é
irrefutável e mais uma prova do aquecimento global. Não há alternativas
razoáveis para o explicar além da emissão de gases que aprisionam o calor
provocada pelos humanos.”
As vozes destes
cientistas juntam-se, assim, às de tantos outros que têm pedido uma acção
imediata na redução de emissões de GEE. O problema é que mesmo que ela aconteça
e que as metas do Acordo de Paris sejam alcançadas, nos próximos anos o
aquecimento dos oceanos vai continuar. Isto porque eles, tais como outros sistemas
terrestres (incluindo os lençóis de gelo), são lentos a responder a alterações.
Ainda assim, defendem os investigadores, “os níveis e a magnitude do
aquecimento dos oceanos e os riscos associados serão menores com menos emissões
de GEE”. Por isso, “acções humanas apropriadas” são essenciais para inverter o
cenário actual, “reduzindo assim os riscos para os humanos e outra vida na
Terra”, avisam.
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