EDITORIAL
Quando a polícia
alimenta o extremismo
Os portugueses
precisam de continuar a confiar nos seus polícias. Episódios como o desta
terça-feira apenas servem os propósitos dos que a querem destruir.
22 de Janeiro de
2020, 6:18
MANUEL CARVALHO
Só há uma forma
de a PSP salvar a face no episódio de extrema violência exercida sobre uma
cidadã na Amadora: provar de forma clara e inequívoca que não foi um dos seus
agentes a deixar-lhe as marcas que revelam uma agressão tão bárbara como
covarde. Num país onde prevalece o Estado de direito, as forças de segurança
têm de ser as primeiras a respeitar regras básicas consagradas na Constituição,
como as da proporcionalidade ou da igualdade, independentemente da raça ou cor.
Uma cidadã
apanhada num autocarro com um filho menor sem título de transporte jamais
poderia ser alvo de uma agressão com a violência que as imagens difundidas
pelos jornais atestam; mesmo que essa cidadã tenha ripostado, nada justifica
que, como tudo parece indicar, fosse metida num carro da polícia e sovada por
agentes da autoridade.
Ainda que a
prudência e o bom senso nos convidem a analisar com cautela uma situação sobre
a qual ainda não sabemos tudo, o que é conhecido é suficientemente grave para
que se exija ao comando da PSP e ao ministro da Administração Interna um
inquérito rigoroso e imparcial. Por três razões de supremo interesse público:
para que se faça justiça à cidadã agredida; para evitar que a PSP seja
contaminada pela suspeita de que está a ser alvo da infiltração da
extrema-direita; e para retirar argumentos aos extremistas dos movimentos
antirracistas que encontram nestes tristes exemplos terreno fértil para
transformar Portugal e os portugueses em expoentes máximos do racismo.
Para lá de um
intolerável abuso sobre uma cidadã cujo “crime” foi não ter levado o passe de um
filho menor, a agressão bárbara de um agente da PSP acentua a sensação de que,
no país, caminhamos para um conflito que, em vez de demolir as graves barreiras
raciais que existem, apenas servirá para as erguer mais alto.
O que aconteceu
na Amadora tem de ser esclarecido rapidamente. O que sabemos é demasiado
horrível para suportar a teia de procedimentos burocráticos dos inquéritos que
tantas vezes esconde um propósito corporativo.
Um polícia que
humilha uma cidadã em público, que alegadamente a agride dentro de um carro
oficial e depois chama uma ambulância alegando uma queda está longe de cumprir
os mínimos que se exigem a um agente da autoridade. Mesmo que tenha de
beneficiar da presunção de inocência, deve ser suspenso das suas actividades. E
enquanto tudo não se esclarecer, é urgente avançar com a obrigação de os
polícias filmarem as suas intervenções.
Os portugueses
precisam de continuar a confiar nos seus polícias. Episódios como o desta
terça-feira apenas servem os propósitos dos que a querem destruir.
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