PSP admite queixa
ao MP contra sindicato que insinua que mulher agredida tem “doenças”
“A Polícia de
Segurança Pública não se revê em qualquer conteúdo que deprecie ou sugestione a
desconsideração de qualquer pessoa, independentemente do motivo”, refere a PSP.
Mulher de 42 anos acusa agente de a agredir em frente a filha de oito anos.
Líder de sindicato é ex-candidato a lista europeia de André Ventura e não quis
comentar. Processo está a ser investigado pelo Ministério Público da Amadora e
encontra-se em segredo de justiça.
Joana Gorjão
Henriques 22 de Janeiro de 2020, 16:14
A Direcção
Nacional da PSP afirmou ao PÚBLICO que pondera encaminhar uma queixa para as
entidades competentes, nomeadamente o Ministério Público (MP), contra o post
que o Sindicato Unificado da Polícia de Segurança Pública publicou em defesa do
agente acusado de agredir uma mulher na Amadora.
Nesse post, o
sindicato escreve: “As melhoras ao colega e espero que as análises sejam todas
negativas a doenças graves. Contudo a defesa da cidadã está a começar a ser
orquestrada pelo ódiomor [sic] de brancos.” Partilham também fotos dos
arranhões e das mordidas no braço do polícia envolvido nas agressões.
Ao PÚBLICO, a PSP
afirmou: “A Polícia de Segurança Pública não se revê em qualquer conteúdo que
deprecie ou sugestione a desconsideração de qualquer pessoa, independentemente
do motivo”. O gabinete de comunicação esclareceu que o post em causa está
“absolutamente incluído” nesta posição.
“Como decorre da
lei e dos normativos internos, quaisquer posicionamentos – em posts, tweets,
documentos escritos, afirmações públicas – individuais ou organizacionais, que
não sejam respeitadores de todos os cidadãos enquanto tal, serão encaminhados
para as entidades competentes e escrutinados”.
O porta-voz
esclareceu que não tem ainda conhecimento sobre se outras entidades já
encaminharam a queixa, mas que pondera fazê-lo para entidades como o Ministério
Público, para que avalie os “conteúdos racistas e xenófobos”. O PÚBLICO
contactou a Procuradoria-Geral da República mas ainda aguarda resposta.
Peixoto
Rodrigues, que foi candidato na lista do líder de extrema-direita André Ventura
às eleições europeias, lidera o sindicato ao qual pertencem 16 dos 17 polícias
da Esquadra de Alfragide que foram a julgamento acusados de racismo e tortura
contra seis jovens da Cova da Moura – oito foram condenados por agressão e
sequestro. “A publicação é a que está e nada mais. Não tenho nada a comentar”,
afirmou ao PÚBLICO.
Mulher acusa
polícia de agressão e racismo. PSP chamou bombeiros e disse que era “uma queda”
Mulher acusa
polícia de agressão e racismo. PSP chamou bombeiros e disse que era “uma queda”
Sobre a eventual
queixa da parte da Direcção Nacional da PSP diz: “Cada um é que sabe.” Disse
também que não conhece o agente em causa.
Peixoto Rodrigues
apareceu a falar do Movimento Zero publicamente e é arguido num processo de
fraude que lesou o Estado em milhares de euros. Foi alvo de uma pena
disciplinar de aposentação compulsiva aplicada pelo Ministério da Administração
Interna (MAI) depois de faltar 83 dias sem justificação, em Julho do ano
passado.
MAI abre
inquérito
Entretanto, o
Ministro da Administração Interna pediu à Inspecção Geral da Administração
Interna (IGAI) a abertura de um inquérito para apurar os factos relacionados
com a actuação policial neste caso. Segundo o ministério, a PSP transmitirá à
IGAI todos os elementos da averiguação interna que tem estado a realizar. O
processo está agora em segredo de justiça Cláudia Simões foi ouvida na
terça-feira pelo Ministério Público da Amadora. A advogada de Cláudia Simões pediu
a incorporação neste processo do outro em que é queixosa e aguarda para saber
se o polícia será constituído arguido.
Cláudia Simões,
42 anos, acusou um polícia de a ter agredido no domingo, depois de uma
intervenção em sequência de uma viagem de autocarro. Presente a tribunal na
terça-feira por o agente ter, por seu lado, feito queixa dela, Cláudia Simões
estava com a cara deformada e lábios com escoriações. É arguida e ficou com
termo de identidade e residência. A PSP, por seu lado, afirma que a cidadã “se
mostrou agressiva” e “mordeu o agente”. A Direcção Nacional da Polícia já abriu
um processo de averiguação interna e irá “apurar se os danos físicos são
consentâneos com uma actuação policial correcta ou se aparentam uso excessivo
de força”.
A cidadã
portuguesa e angolana referiu ao PÚBLICO na terça-feira que as agressões pelo
mesmo agente da PSP, Canha, ocorreram em dois momentos. O primeiro terá sido
pouco depois das 20h30, na rua. Num vídeo que foi filmado por um jovem vê-se um
agente da PSP a manietar a senhora, com as pernas dobradas em cima das suas
costas e as mãos a agarrar no cabelo, puxando-o para trás. A voz dela balbucia
palavras, mas vê-se o rosto de Cláudia Simões sem marcas ou feridas e uma voz a
dizer: “Ela não está a resistir.” Num segundo momento, acusa, o polícia
agrediu-a no carro da PSP, com ela algemada, enquanto a insultava: “‘Grita
agora sua filha da puta, preta, macacos, vocês são lixo, uma merda’.”
Segundo se
queixou, a PSP deixou-a inconsciente à porta da esquadra. Segundo disse ao
PÚBLICO o comandante dos Bombeiros da Amadora, Mário Conde, os meios foram
accionados “como queda”, por iniciativa da esquadra. Cláudia Simões estava fora
da esquadra quando lá chegaram, pelas 22h. No local, foi visível que se tratava
de outro motivo – os bombeiros referiram que tinha existido um conflito entre a
cidadã e a PSP, afirmou.
Segundo contou,
tudo se iniciou no autocarro 163, da Vimeca, que faz o percurso Colégio
Militar-Massamá. A filha esquecera-se do passe e Cláudia disse ao motorista que
o filho estaria na paragem de saída com o documento (os passes de ambas estão
em dia, mostraram ao PÚBLICO, mas de qualquer forma até aos 12 anos as crianças
não pagam, apenas precisam de ter o documento). Sentaram-se e tudo decorreu
normalmente, até que entrou uma senhora brasileira com a neta de quatro anos e
o motorista forçou-as a sair por a menina não ter passe. Gerson Calveto, o
sobrinho que assistiu a tudo, disse ao PÚBLICO que de seguida o motorista
começou a gritar: “‘isso é na tua terra, vocês estão aqui a dar cabo do nosso
país’. E começou a gritar nomes: ‘seus pretos, andam a estragar o nosso país,
pensam que isso é só chegar e andar sem passe’.”
Contactada pelo
PÚBLICO, a Vimeca ainda não comentou nem deu explicações sobre o caso.
Quando chegaram à
paragem de destino o motorista chamou um polícia que os abordou perguntando se
queriam agredir o motorista. Houve troca de argumentos e a gota de água terá
sido um comentário que Cláudia fez acusando o agente de estar “a cheirar a
álcool”, diz Gerson. “O tipo agarrou o pescoço da minha tia e jogou-a ao chão
de imediato.”
Segundo o comunicado
oficial da PSP, o agente foi chamado pelo motorista e entrou dentro do
autocarro pelo facto de a cidadã se recusar a pagar o bilhete de transporte da
filha, e de o ter ameaçado e injuriado. Afirma ainda que Cláudia Simões estava
“agressiva” e empurrava o agente. Baseado no auto de notícia, o comunicado
refere que “o polícia, que se encontrava sozinho, para fazer cessar as
agressões da cidadã detida, procedeu à algemagem da mesma, utilizando a força
estritamente necessária para o efeito” e que foi necessário prestar-lhe
assistência hospitalar.
tp.ocilbup@hgj
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