Número de
brasileiros a viver em Portugal subiu 43%. Já são 151 mil
No ano passado, o
SEF atribuiu mais de um terço das novas autorizações de residência em Portugal
a cidadãos brasileiros. Nunca houve tantos imigrantes no país: 580 mil, mais
100 mil do que no ano anterior. Há novos perfis, “gente mais qualificada” e
famílias, referem especialistas. “Não vêm só para ganhar dinheiro, mas para
ganhar qualidade de vida.”
Joana Gorjão
Henriques 16 de Janeiro de 2020, 6:00
O número de
brasileiros com autorização de residência a viver em Portugal aumentou 43% de
2018 para 2019, revelam dados provisórios do Serviço de Estrangeiros e
Fronteiras (SEF) fornecidos ao PÚBLICO. Em números totais, os brasileiros
chegam agora quase aos 151 mil, o maior número de sempre. Em 2018 eram 105.423.
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“ilegal”
A subida
acompanha o crescimento que se verificou em 2019 do número total de imigrantes
em Portugal, que ultrapassou pela primeira vez a barreira do meio milhão: são
580 mil. Os brasileiros representam, assim, um quarto do total.
Já em 2018 se
verificara uma subida de brasileiros, depois de dois anos de queda, em 2015 e
2016. Em 2019 foram emitidos 48.627 novos títulos de residência para imigrantes
desta nacionalidade, mais 20.417 do que no ano anterior, o que representa mais
de um terço do total das novas autorizações concedidas a estrangeiros pelo SEF,
que chegaram às 135 mil — no ano anterior tinham sido 93 mil.
Os brasileiros,
de longe a maior comunidade de estrangeiros em Portugal, têm tido uma presença
constante, sobretudo desde os anos 80. Embora tenha abrandado durante alguns
anos, o fluxo de imigração brasileira não parou. O pico foi em 2010, ano em que
chegou aos 119.363 brasileiros, segundo os dados do SEF. Ao contrário de outros
imigrantes extracomunitários como os cabo-verdianos, o segundo maior grupo, os
brasileiros não precisam de visto de entrada, por causa dos acordos entre os
dois países.
O fenómeno está
longe de ser novo e no aumento de 43% está reflectida uma realidade que vem de
há “pelo menos dois anos”, diz a presidente da Casa do Brasil de Lisboa, Cyntia
de Paula. Isto porque os processos de autorizações de residência são longos e,
portanto, as pessoas só “aparecem” nas estatísticas do SEF mais tarde.
A associação que
dá apoio aos brasileiros há anos refere que todos os dias tem gente recém-chegada
nos seus escritórios. “Essa realidade é diária na associação e nos diferentes
projectos.” Quem chega? “Um mix de perfis”, responde. Mas está a chegar “mais
gente mais qualificada”, refere, “licenciados” e muitos com o objectivo de
“continuar os estudos”: “Há advogados, engenheiros, médicos, psicólogos,
publicitários…”
Desde a
destituição da Presidente Dilma Rousseff em 2016, e da recuperação económica de
Portugal, que se tem notado um aumento de brasileiros com perfis
diversificados, contextualiza. No início de 2000 a imigração brasileira estava
focada no trabalho e tinha perspectiva de retornar ao Brasil, refere Cyntia de
Paula. O trabalho exercido nem sempre correspondia às suas qualificações, a
maioria trabalhava na restauração, construção civil e outros serviços. Essa
vaga para trabalhar nunca desapareceu, mas a ela juntaram-se outros perfis,
acrescenta.
Em 2008 e 2009
chegaram muitos estudantes para o ensino superior, um grupo que continuou a vir
mesmo em períodos de crise e que neste momento é bastante expressivo.
“Somaram-se outros grupos mais qualificados, pequenos empreendedores,
aposentados, gente ligada ao activismo e aos direitos humanos que não se sente
protegida no Brasil. Os discursos de migração mudaram: não vêm só para ganhar dinheiro,
mas para ganhar qualidade de vida”, acrescenta.
Na área do
empreendedorismo, muitos abrem empresas que, por sua vez, empregam pessoas,
continua. “Notamos que é difícil a entrada no mercado qualificado. Os
brasileiros queixam-se diariamente de que não conseguem trabalhar nas suas
áreas e têm dificuldade com o reconhecimento do seu diploma, mas também que a
entidade empregadora reconheça o seu percurso profissional. Isso tem a ver com
preconceitos, com a ideia de que o nosso ensino e experiência profissional são
inferiores”, analisa.
As famílias
Há ainda um
fenómeno que se destaca na nova vaga migratória: a chegada de famílias. Duval
Fernandes, demógrafo, professor da Pontífice Universidade Católica de Minas
Gerais, que está a fazer um projecto de investigação sobre a nova vaga
migratória de brasileiros em Portugal, refere que há uma maior presença de
famílias que chegam em conjunto. “Temos tentado compreender essa migração mais
recente, onde não há um padrão único, e que coloca desafios”, refere, elencando
também os aposentados, os empresários que pedem visto gold e os estudantes.
“Quando se trata de famílias, falamos de crianças e de jovens que têm de ir à
escola; falamos de mulheres num momento reprodutivo.”
Nesse aspecto,
muda também a questão das remessas, refere, porque as famílias, estando todos
os elementos em Portugal, não enviam dinheiro para o Brasil e os aposentados
até trazem as suas economias para Portugal. “O grande sonho de construir uma
casa reverte-se e as pessoas olham para Portugal como uma opção migratória. O
projecto dos portugueses que foram para o Brasil talvez esteja a ser repensado
pelos brasileiros em Portugal.”
Porém, como
referiu ao PÚBLICO em Outubro, Carlos Vianna, membro do Conselho das Migrações,
e fundador da Casa do Brasil, estes dados oficiais podem estar abaixo das
estatísticas. Calcula que haverá 200 mil brasileiros em Portugal, entre
imigrantes não regularizados, imigrantes com autorização de residência e
brasileiros que obtiveram a nacionalidade portuguesa. “Acredito que haja em
Portugal cerca de 40 a 50 mil portugueses de origem brasileira como eu, que já
sou português há quase 20 anos. No Brasil há imensos novos portugueses porque
não há família com portugueses que não incentive os filhos a ter a
nacionalidade. Quem tem avô brasileiro vai pedir a nacionalidade.”
Imigrantes chegam
aos 580 mil
O número total de
estrangeiros em Portugal nunca foi tão alto, anunciou ontem o ministro da
Administração Interna Eduardo Cabrita durante a audição parlamentar sobre o
Orçamento do Estado para 2020. “Os dados preliminares [580 mil residentes
estrangeiros] levam a dizer que em 2019, pela primeira vez na nossa história, é
ultrapassada a barreira do meio milhão de cidadãos estrangeiros a residir em
Portugal”, disse. Já em 2018 os 480 mil imigrantes representaram o maior número
de sempre.
Eduardo Cabrita
disse ainda que as autorizações de residência atribuídas pelo Serviço de
Estrangeiros e Fronteiras (SEF) subiram de 35 mil em 2015 para 135 mil em 2019.
Acrescentou que Portugal tem “uma política de atracção de quadros qualificados
e trabalhadores” porque precisa de imigrantes.
Segundos dados
provisórios de 2019 fornecidos ao PÚBLICO pelo SEF, o Brasil continua no topo
das nacionalidades estrangeiras a viver em Portugal (150.864), com quatro vezes
mais imigrantes que a comunidade seguinte, a cabo-verdiana (37.393). Segue-se o
Reino Unido, com 34.340 residentes, a Roménia, com 31.056 e a Ucrânia com
29.671.
Tal como o
PÚBLICO tinha noticiado em Outubro, a grande novidade no top cinco das novas
autorizações de residência em 2019 foi a entrada dos indianos com 6255
concessões. Essa tabela foi liderada pelo Brasil (quase 50 mil), seguida de
Reino Unido (8349), Itália (7867) e finalizada pelo Nepal (4986).
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