terça-feira, 21 de janeiro de 2020

Aeroporto do Montijo avança com parecer favorável condicionado / Montijo: Oito organizações ambientalistas recorrem a tribunais e Comissão Europeia



AEROPORTO DO MONTIJO
Montijo: Oito organizações ambientalistas recorrem a tribunais e Comissão Europeia

No entender das associações, o Estudo de Impacto Ambiental do novo aeroporto “tem insuficiências graves”.

Lusa 22 de Janeiro de 2020, 1:11

Oito organizações ambientalistas vão recorrer aos tribunais e à Comissão Europeia para travar o aeroporto no Montijo, por considerarem “ir contra as leis nacionais, as directivas europeias e os tratados internacionais”.

A Agência Portuguesa do Ambiente confirmou na terça-feira a viabilidade ambiental do novo aeroporto no Montijo, projecto que recebeu uma decisão favorável condicionada em sede de Declaração de Impacte Ambiental (DIA).

Queixa contra Portugal por colocar em risco aves afectadas por aeroporto no Montijo

Almargem, ANP/WWF, A Rocha, GEOTA, LPN, FAPAS, SPEA e Zero reiteram que todo o processo referente ao novo aeroporto, considerado estratégico para o país, “tem forçosamente que ser apreciado no contexto de uma avaliação ambiental estratégica” em que sejam ponderadas todas as opções possíveis.

“A construção de um novo aeroporto não pode ser decidida como um projecto avulso, desenquadrado dos instrumentos de planeamento estratégico aos quais o país está vinculado, e tem de ter como base o conhecimento mais completo e actual de todas as componentes (climática, ecológica, social, económica, etc.)”, salientam os ambientalistas.

Entendem as associações que ficam na DIA várias respostas por dar, por exemplo sobre cenários de crescimento do turismo, sobre alternativas ao transporte aéreo (como o comboio, menos poluidor) ou sobre as alternativas ao Montijo. Questões que teriam resposta com uma avaliação ambiental estratégica, que contemplasse também a expansão do aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa.

No entender das associações, o Estudo de Impacto Ambiental do novo aeroporto “tem insuficiências graves” porque não avalia correctamente o impacto ambiental do projecto e estabelece medidas desadequadas de compensação e mitigação.

Não se considera devidamente os impactos sobre os valores naturais, nem os impactos para a saúde pública ou para a qualidade de vida das populações. E nem é, dizem também, considerada a questão das alterações climáticas e as emissões de gases com efeito de estufa, que o Governo quer reduzir, nem é considerada ainda a segurança de pessoas e bens.

“As falhas na informação apresentada levam as associações a questionar a forma como a própria segurança das operações aéreas está a ser avaliada, dado o risco posto por espécies que não foram devidamente estudadas. É o caso, por exemplo, dos 60 mil milherangos ou das 50 mil íbis-pretas que invernam (...) no local, sendo que as últimas têm vindo a aumentar todos os invernos e são praticamente ignoradas pelo estudo”, escrevem os ambientalistas no comunicado.

Estas entidades acrescentam que o Governo tem falhado nas obrigações de proteger as espécies e habitats da zona húmida mais importante do país, classificada como Reserva Natural e como Rede Natura 2000, por ser “das mais importantes da União Europeia”.

Com tudo isto, frisam as associações, o valor da compensação financeira proposta não tem qualquer fundamento quanto à valorização do que se perde, nem qualquer fundamento quanto à eficácia na resolução de um problema real.

“Dado que o Governo não deu importância a estas e outras preocupações graves levantadas por inúmeras entidades durante o processo de consulta pública, as organizações de ambiente não vêem outra alternativa que não seja pô-las à consideração do sistema judicial e das autoridades europeias”, diz-se no comunicado.

 Aeroporto do Montijo avança com parecer favorável condicionado

Declaração de Impacte Ambiental final foi emitida esta terça-feira à noite pela Agência Portuguesa do Ambiente e implica o pagamento “de uma taxa de 4,5 euros por movimento aéreo”. Espera-se agora a conclusão das negociações entre o Governo e a ANA.

Luís Villalobos
Luís Villalobos 21 de Janeiro de 2020, 23:47


A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) emitiu esta terça-feira, já perto da meia-noite, a sua Declaração de Impacte Ambiental (DIA) final relativa ao aeroporto do Montijo. De acordo com a nota da APA, foi confirmada a decisão favorável condicionada à infra-estrutura aeroportuária que irá dar apoio ao aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa. “Esta decisão mantém o quadro de medidas de minimização e compensação (cerca de 160) que a ANA terá de dar cumprimento”, refere a nota, e que implicam cerca de 48 milhões de euros por parte da empresa que gere os aeroportos nacionais, detida pelo grupo francês Vinci.

Entre as medidas destaca-se o apoio à avifauna, que requer a constituição de uma sociedade veículo por parte do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) para implementar “medidas de compensação” ligadas à protecção e conservação das aves selvagens. Esta implica não só o pagamento de 7,2 milhões de euros como requer também, de forma complementar, o pagamento “de uma taxa de 4,5 euros por movimento aéreo” que, embora não seja explícito, deverá ser custeada pelas companhias aéreas. Exige-se também a “aquisição de salinas numa área total no mínimo igual à área sujeita a perturbação forte, ou seja 1467 ha”, e a compra de terrenos ou contratos de gestão ou a aplicação de “medidas compensatórias por perca de produtividade nos campos agrícolas na Lezíria do Tejo.

No que respeita ao ruído, e à diminuição do seu impacto nos edifícios e população mais afectada, terão de ser aplicadas medidas avaliadas entre 15 e 20 milhões. Fica proibido o tráfego aéreo entre a meia-noite e as seis da manhã (aparentemente sem excepções) e entre as 23h e à meia-noite e entre as seis e as sete da manhã há um condicionamento de 2983 movimentos anuais para o ano de 2022 (quando se estima que o aeroporto esteja operacional).

A ANA tem ainda de adquirir dois navios, eléctricos, de transporte de passageiros, assegurando assim “o aumento da oferta de transporte fluvial”, a alocar “em exclusividade ao transporte entre o Cais do Seixalinho e Lisboa”. Já no acesso entre o aeroporto do Montijo e o Cais do Seixalinho (ponto de chegadas e de partidas das embarcações) deve ser garantido um serviço tecnologicamente evoluído e eficiente, tendo por base veículos de emissões muito baixas ou nulas (por exemplo, veículos eléctricos ou a hidrogénio), tendo em conta a maturidade das tecnologias”. E, na ligação do aeroporto à Gare do Oriente/Estação ferroviária do Pinhal Novo, deve-se “estudar a criação de serviços rápidos de autocarros (tipo shuttle)”, tendo também “preferencialmente por base veículos de emissões muito baixas ou nulas”.

A 30 de Outubro, a APA já tinha comunicado que, no âmbito da avaliação de impacte ambiental (AIA), tinha concluído, após a análise da comissão de avaliação, por um parecer favorável condicionado, viabilizando o projecto na sua vertente ambiental com exigências de medidas de minimização e compensação ambiental cujo valor ascendia até cerca de 48 milhões de euros. As verbas servem para diminuir o impacto do ruído, para criar um mecanismo financeiro para a avifauna, e para a compra de dois barcos para a Transtejo.

Em resposta, a ANA afirmou logo publicamente que via com “surpresa e apreensão algumas das medidas propostas”. Depois disso, enviou a sua reacção oficial à APA, na qual dizia que não concordava com algumas das 159 medidas apresentadas, sem especificar. No entanto, defendeu a criação de “um fundo com um sistema de governança colegial” cujo objectivo passa por “potenciar as acções de mitigação e compensação dos impactes ambientais das aeronaves, nomeadamente para a redução do impacto sonoro e protecção da natureza”. Este fundo seria “uma iniciativa conjunta” com todos os intervenientes no processo, abrangendo as medidas do projecto de Declaração de Impacte Ambiental (DIA) “referentes aos impactos das aeronaves”, bem como “as que venham a ser identificadas no futuro”.

Contrato renegociado
O documento da APA agora divulgado é um passo fundamental para a concretização da nova infra-estrutura aeroportuária, e surge um ano depois da assinatura do acordo entre o Governo e a ANA para a extensão da capacidade aeroportuária na região de Lisboa. Na altura – fez este mês um ano – ficou estipulado o compromisso de “finalizar o processo de negociação [das alterações ao contrato de concessão em vigor, que teve início em 2012] tão cedo quando possível, desejavelmente até 30 dias úteis após a emissão da Declaração de Impacte Ambiental relativa ao aeroporto do Montijo”.

Uma coisa é certa: o Governo quer assegurar que não há o envolvimento de dinheiro público no projecto. Assim, falta clarificar como é que a ANA será compensada. Fora da mesa das negociações tem estado o prolongamento do prazo de concessão (50 anos), assumindo-se as tarifas como fortes candidatas na angariação de receitas por via da Portela. Em Janeiro do ano passado ficou acordado que as taxas do Montijo devem “ser atractivas”, isto é, ficar entre “15% a 20% abaixo das do aeroporto Humberto Delgado, em linha com a repartição dos investimentos entre os dois aeroportos”.

Críticas ao projecto
A aposta no Montijo tem sido alvo de fortes críticas de associações ambientalistas pelos impactos na região (ao nível do ruído na população afectada, e na avifauna e na flora) e pela falta de procura de alternativas, e já originou queixas formais. A Associação Zero interpôs no ano passado uma acção judicial no Tribunal Administrativo de Lisboa para “obrigar à realização de uma Avaliação Ambiental Estratégica relativa à decisão de instalar um aeroporto complementar no Montijo”.

Esta é mais profunda e abrangente do que um estudo de impacte ambiental (o que foi feito no caso do Montijo, mas o primeiro estudo foi considerado insuficiente e teve de ser efectuado um novo, provocando atrasos no processo). Antes disso, já tinha enviada uma queixa à Comissão Europeia pela inexistência deste tipo de avaliação, que engloba o estudo de outras alternativas para a nova infra-estrutura aeroportuária. Alguns autarcas da região e diversas forças políticas, como o BE, Verdes e PCP, também já se mostraram contra. Uma das críticas mais fortes foi a de que, com a assinatura do contrato entre o Governo e a ANA, em Janeiro de 2019, o Montijo se apresentou como um “facto consumado” mesmo antes da decisão da APA.

A saturação do aeroporto Humberto Delgado, na Portela, e a necessidade de encontrar uma solução rápida e com custos acessíveis tem sido apontada como a razão da opção do Montijo. Nos últimos sete anos, o aeroporto de Lisboa duplicou o número de passageiros. Com o apoio da nova infra-estrutura, as obras planeadas para a Portela (como o fim da pista secundária) e alterações na gestão do espaço aéreo estima-se que seja possível o aumento dos actuais 38 para 72 movimentos/hora no sistema aeroportuário de Lisboa e comportar “uma procura estimada superior a 50 milhões de passageiros por ano”. Até aqui, a abertura do aeroporto do Montijo tem sido apontada para 2022, mas não é impossível que haja um atraso para 2023.

No acordo de Janeiro de 2019 ficou estipulado que a abertura do Montijo ocorreria “no prazo aproximado de 36 meses após a assinatura da adenda ao contrato de concessão”.

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