OPINIÃO
Demita-se,
sr. governador
PEDRO SOUSA CARVALHO
18/02/2016 - PÚBLICO
António Costa faz
bem em barafustar e em confrontar o Banco de Portugal com as suas
próprias incongruências
Não é um
frente-a-frente. É uma luta de costas. António Costa contra Carlos
Costa. Quem tem razão? O Costa, naturalmente. É um duelo entre o
Governo e o governador; um que tenta governar e outro que faz de
conta que governa. Não basta ter os cabelos grisalhos, fazer um
semblante carregado e ter à volta uma batelada de assessores para se
concluir que Costa é competente. A competência mede-se pelos
resultados. Costa, o António, ainda não teve tempo de mostrar se o
é a governar. Costa, o Carlos, já teve mais do que tempo e já
mostrou que a competência não é o seu forte.
É difícil olhar
para o que se passou na banca nos últimos anos e chegar à conclusão
de que o Banco de Portugal está a fazer um trabalho competente. Os
casos BPN, BPP, BCP, Finantia, BES e Banif, durante os mandatos de
Vítor Constâncio e Carlos Costa, ficam bem num currículo de quem
vai candidatar-se para trabalhar numa fábrica de pirotecnia. Não
para quem vai supervisionar bancos. E o trabalho de Carlos Costa está
a ser feito de uma forma pouco transparente, hermética, enviesada,
atrasada e aparentemente traiçoeira, com uma grande obsessão pela
imagem.
Fará algum sentido
que o Novo Banco tenha fechado em Dezembro de 2015 um negócio para
vender uma sucursal em Cabo Verde a uma empresa ligada a José Veiga
e que só esta semana é que o Banco de Portugal se tenha lembrado de
dizer que não aprova o negócio? O mais estranho é que o próprio
supervisor de Cabo Verde já tinha impedido José Veiga de abrir um
banco local no passado, com base num parecer do próprio Banco de
Portugal, que, supostamente alegava falta de idoneidade. Perante
isto, o que faz o Banco de Portugal, depois de não ter feito nada
nos últimos dois meses? Emite um comunicado, impresso na impressora
de Pilatos, a dizer que este processo de venda “foi exclusivamente
conduzido pelo Novo Banco”.
António Costa não
gosta de Carlos Costa porque o governador se colou em demasia a
Passos Coelho e politicamente escolheu ficar com as dores do anterior
Governo no caso BES. E apesar de Maria Luís Albuquerque ter dito que
a supervisão “falhou” no caso BES, Carlos Costa recebeu o prémio
devido pelo PSD-CDS; foi reeleito para mais cinco anos, apesar de no
seu primeiro mandato Portugal ter assistido à maior derrocada de
sempre do sistema financeiro. O império da família Espírito Santo
ruiu e Carlos Costa ainda está abananado a tentar perceber o que lhe
caiu em cima. Até ao dia de hoje ainda não percebemos o que andou
Carlos Costa a fazer entre Novembro de 2013 (quando soube pela
primeira vez que havia irregularidades no grupo) e Julho de 2014
(quando Ricardo Salgado saiu do banco). Se calhar, a mesma coisa que
andou a fazer agora nos dois meses em que Stock da Cunha se preparava
para vender uma parte do banco a José Veiga.
Carlos Costa terá
com certeza as costas largas, mas há coisas que são difíceis de
perceber. Por que é que António Costa diz que o Banco de Portugal
não se dignou a nomear um representante para participar nas reuniões
para tentar resolver o problema dos lesados do papel comercial do
BES, e o Banco de Portugal vem dizer que a reunião já está marcada
e vai realizar-se esta semana? Além de estarem de costas voltadas,
também não têm telefone para falarem um com o outro?
António Costa faz
bem em barafustar e em confrontar o Banco de Portugal com as suas
próprias incongruências. Afinal, não foi o próprio Banco de
Portugal que obrigou o BES a fazer uma provisão de 700 milhões de
euros para reembolsar esses investidores do papel comercial? Isso não
criou uma expectativa de reembolso? E agora lava as mãos como o
senhor da impressora?
O Governo não pode
esticar em demasia a corda. Quem nos olha lá de fora já desconfia
de um Governo antiausteridade, apoiado por dois partidos de esquerda
radical. Se resolvem tentar exonerar o governador de um banco central
sem ter uma razão sólida e objectiva, arriscam-se a fazer capotar a
geringonça. Ainda se lembram, em plena crise grega, do plano secreto
da ala mais radical do Syriza que passava por mandar prender o
governador do banco central grego? Não queiramos passar uma imagem
parecida.
António Costa sabe
que Carlos Costa tem as costas quentes porque está num cargo em que
é praticamente inamovível, a não ser que o governador seja
apanhado a cometer uma “falha grave” no exercício das suas
funções. É esta “falha grave” que socialistas e bloquistas
procuram quando pedem, com toda a legitimidade, que o Banco de
Portugal torne público um relatório da Boston Consulting Group
(BCG) que avaliou, a pedido do próprio Carlos Costa, a actuação do
supervisor no caso BES. Estranhamente, o governador recusa-se a
divulgar o conteúdo do relatório, invocando o “dever de
confidencialidade”, como lembrava nesta quinta-feira o Diário
Económico. Então o governador gasta 300 mil euros a mandar fazer um
relatório para avaliar o seu trabalho e quando o relatório chega
esconde-o atrás das costas? Faz lembrar aquelas crianças que
tiveram um medíocre no exame e quando chegam a casa tentam esconder
a nota dos pais. Mas Carlos Costa, com os seus cabelos grisalhos, já
não tem idade para isso.
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