Porto
volta a atacar: TAP vai cortar 70% da operação, acusa a autarquia
RAQUEL ALMEIDA
CORREIA 14/02/2016 - 14:41 (actualizado às 15:58)
Depois
de uma semana de intensa polémica em redor dos voos da companhia no
Sá Carneiro, levanta-se agora dúvidas sobre a legitimidade da
chamada “ponte aérea”.
A Câmara do Porto
não parece mesmo disposta a baixar os braços relativamente aos
cortes na operação da TAP no aeroporto Francisco Sá Carneiro.
Neste domingo, a autarquia lançou novas críticas à companhia, que
acusa de ter cortado em 70% o número de voos na região. Acusações
que surgem a poucos dias da reunião entre António Costa e Rui
Moreira, marcada para quarta-feira.
Num artigo publicado
no site Porto.pt, a câmara diz que a cidade “perde 70% dos seus
voos TAP e o número de lugares disponíveis em rotas como Madrid ou
Genebra baixa radicalmente, além de Roma, Milão, Bruxelas,
Barcelona e Londres verem frequências reduzidas a zero ou
parcialmente”.
A decisão de
reestruturar a operação no aeroporto Francisco Sá Carneiro foi
tomada depois de a transportadora aérea ter sido vendida, pelo
anterior governo PSD/CDS, ao consórcio Atlantic Gateway, de Humberto
Pedrosa e David Neeleman. E tem causado muita controvérsia,
sobretudo desde que o executivo de António Costa alterou as
condições da venda, acordando com os privados que o Estado passará
a ter 50% do capital (e não os actuais 39%).
O texto publicado
pela autarquia liderada por Rui Moreira aprofunda, em especial, a
situação da PGA e da chamada “ponte aérea” que a TAP vai
iniciar entre Lisboa e Porto, no próximo dia 27 de Março. Serão
voos de hora a hora, operados pela TAP Express, a antiga PGA, mas
também com recurso a aviões e tripulações da White (grupo Omni).
A TAP, que já recorria ao fretamento de dois aviões da White,
subirá agora a fasquia para oito ATR, aviões com maior capacidade
que vêm substituir os ATR mais antigo e alguns Embraer.
“A Portugália
[PGA] custou ao Estado 140 milhões de euros, pagos há oito anos ao
BES. Desaparece a 27 de Março e os seus voos serão entregues à
privada White sob a designação TAP Express e sem qualquer capital
público envolvido”, começa por afirmar a Câmara Municipal do
Porto.
“Os voos que a TAP
anunciou recentemente pretender suprimir a partir do Porto, bem como
alguns outros que a TAP não comunicou mas que também vai suprimir
ou onde vai baixar o número de lugares disponíveis, são quase
todos operados pela Portugália”, lê-se no site Porto.pt.
Mas o documento vai
mais longe, analisando o negócio de venda da PGA à TAP e as
condições impostas na altura pela Autoridade da Concorrência para
que este se realizasse. Por entender que poderia estar em causa uma
concentração com risco de posição dominante, o regulador obrigou
a companhia de bandeira ceder slots aos concorrentes no trajecto
Porto-Lisboa, Lisboa-Funchal e Porto-Funchal. Além disso, a TAP
assumiu o compromisso de não aumentar o número de frequências
oferecidas entre Lisboa e Porto por um determinado período de
tempo”, relembra a autarquia, juntando os anexos que comprovam a
existência destas obrigações.
“A Autoridade da
Concorrência estava, por isso, preocupada com a concentração da
operação na rota Porto-Lisboa. Ou seja, estava preocupada com a
possível criação de uma ‘ponte aérea’”, refere.
Em Outubro de 2015,
o regulador aprovou a privatização da TAP, considerando que
"nenhuma das partes adquirentes tem actividade nas rotas aéreas
que a TAP opera, nem existe o risco de eliminação de concorrência
potencial sobre a TAP nas rotas para o Brasil".
Mas, como lembra a
autarquia, o regulador “não analisou as alterações anunciadas em
Janeiro por Fernando Pinto [presidente da TAP], que estarão em vigor
em 27 de Março e que podem representar uma distorção objectiva e
completa ao mercado de aviação civil em Portugal, com uma enorme
concentração de operação num só operador que, anteriormente, nem
sequer tinha qualquer voo regular no mercado doméstico: a White”.
A mesma empresa cujos aviões “têm origem na brasileira Azul [de
David Neeleman], em regime de locação”, acrescenta.
Para a câmara
liderada por Rui Moreira, “o desaparecimento da Portugália e sua
substituição pela TAP Express não foi, pois, uma mera operação
de marketing ou de mudança de naming, mas a verdadeira transmissão
para uma terceira parte, uma fatia considerável da operação aérea
comercial em Portugal, nomeadamente, 16 voos diários entre o Porto e
Lisboa”.
“Toda esta
operação, que antes estava na esfera pública e passou agora a ser
operada por privados, não está, por isso, incluída no controlo do
Estado, nem sequer a 50%, se a reversão parcial da privatização
foi concretizada, como anunciou o Governo. Foi, por assim dizer, uma
espécie de subconcessão, mas cujas regras e contornos não foram
públicos”, sublinha.
O texto termina com
a promessa de que a autarquia não vai parar por aqui. “Esta
investigação (…) continuará nos próximos dias, com a
apresentação dos números reais que nunca foram assumidos pela TAP
e que representam um impacto negativo para o Porto muito superior ao
que, até agora, se julgava existir”. Recorde-se que, no final da
semana passada, a companhia enviou um documento a associações do
Norte em que justificava o encerramento de rotas com prejuízos de
oito milhões de euros.
O texto publicado no
Porto.pt surge a poucos dias de António Costa receber em Lisboa o
presidente da Câmara do Porto, depois de Rui Moreira ter pedido uma
audiência urgente com o primeiro-ministro para debater a situação
da TAP. O encontro está agendado para quarta-feira, ainda sem hora
fechada.
Contactada pelo
PÚBLICO, a TAP preferiu não fazer comentários.
Relatórios
e Contas da TAP e Portugália desmentem prejuízos nos voos do Porto
e confirmam descalabro em Lisboa e no Brasil
O Porto.pt teve
acesso aos relatórios de contas dos últimos oito anos da Portugália
e apurou que a companhia não apenas é lucrativa como a sua operação
e procura são sustentáveis, contrariando a ideia de que os voos
descontinuados no Porto eram deficitários. Ao contrário da operação
da TAP, centrada no "hub" em Lisboa, que em 2016 deu 46
milhões de euros de prejuízo. Muito graves são os resultados das
empresas brasileiras do Grupo, criadas pelo ainda presidente da
comissão executiva da empresa. Só a TAP - Manutenção e Engenharia
do Brasil perdeu mais de 22 milhões de euros em 2014, que elevaram
os prejuízos do grupo para 85 milhões de euros nesse ano.
As empresas de
manutenção da TAP no Brasil somam centenas de milhões de euros de
prejuízos, consecutivamente desde a sua criação. O Porto.pt tentou
consultar o relatório e contas desta empresa brasileira, detida pela
TAP, agora 50% pública, depois da reversão operada pelo atual
Governo, mas o site da empresa de manutenção? estava em manutenção.
Apesar dos enormes
prejuízos no Brasil, que contribuíram para um endividamento público
superior a mil milhões de euros, a TAP nunca abandonou o negócio
naquele país.
Recorde-se que a TAP
alegou prejuízos de oito milhões de euros nos quatro voos operados
pela Portugália para justificar o seu cancelamento, mas aumentou a
operação em Lisboa, onde os prejuízos sobem, tal como no Brasil.
Os argumentos da TAP
são, de resto, contrariados pelo Relatório e Contas da PGA
Portugália, que lhe apresentamos, já que a companhia também não o
tem publicado no seu site, como é boa prática de empresas detidas
por capitais públicos. Segundo os relatórios dos últimos oito
anos, a que tivemos acesso, a PGA dá normalmente lucro, que em 2013
foi superior a cinco milhões de euros e em 2012 tinha sido de mais
de 10 milhões.
É certo que em 2014
a empresa, que operava as rotas que a TAP quer descontinuar no Porto
e que, praticamente, faz a maioria da operação TAP na Invicta,
apresentou um prejuízo marginal, inferior a um milhão de euros, mas
o relatório e contas não atribui as culpas à rentabilidade dos
voos, bem pelo contrário. "No ano de 2014, verificou-se uma
ligeira redução na operação de 0,1% face ao homólogo", pode
ler-se no documento que explica as razões: "Tendo em linha de
conta as greves verificadas e o impacto dos cancelamentos por motivos
técnicos".
Mas o relatório vai
mais longe, explicando que "a redução só não foi mais
significativa devido à forte procura". Mais à frente, o
documento assinado também por Fernando Pinto (identificado como FSP,
atribui as culpas também aos "cancelamentos que ocorreram no
período do Verão", que significaram uma penalização de 4
milhões de euros. Esta penalização foi imposta pela TAP. Ou seja,
a operação dos voos Portugália, entre os quais os quatro em causa,
é rentável e possível e, globalmente, os voos operados pela
companhia que mais voava na Invicta dentro do Grupo TAP, eram
sustentáveis.
Em nenhum momento, o
extenso relatório refere prejuízos ou perdas em voos no Porto ou
sequer na operação que, não fossem as greves ou os problemas
oriundos da TAP, teria apresentado em 2014 lucros superiores aos de
2013, continuando a senda dos bons resultados que foi apresentando.
No acumulado dos últimos três anos, a Portugália, que opera cada
vez no Porto, ofereceu 14 milhões de euros de lucro ao Grupo TAP.
As greves são,
aliás, justificação, também, para os prejuízos da TAP, no seu
próprio relatório e contas e no relatório do Grupo, onde são
consolidadas as contas de todas as participadas, incluindo a
Portugália. Em nenhum momento se fala de problemas de rentabilidade
de voos, em qualquer relatório.
Contudo, já em 2015
a situação da TAP agravou-se e, segundo a Agência Lusa, no final
do primeiro semestre de 2015, apresentava resultados negativos da
ordem dos 109,6 milhões de euros na operação cada vez mais
centrada no "hub" de Lisboa.
No relatório de
contas consolidadas do grupo, os resultados negativos eram também
justificados com "razões de mercado" e " é ainda
referido o facto de a administração da transportadora ter optado,
por questões estratégicas, por colocar dois aviões de reserva, um
deles no Brasil".
Fernando Pinto,
citado pelo jornal Dinheiro Vivo a 26 de março de 2015, justificava
os maus resultados da empresa que administra com "22 dias de
greves, fretamentos de aviões, atraso no recebimento de seis
aeronaves encomendadas para o verão, problemas técnicos e
indemnizações a passageiros foram o cocktail que levou a TAP a
registar prejuízos". Em momento algum nas suas inúmeras
entrevistas, alguma vez referiu a operação no Porto ou os
resultados da Portugália como culpados do desastre financeiro em que
a empresa se encontra.
TAP TRANSPORTARÁ
MENOS MEIO MILHÃO DA EUROPA PARA O PORTO NO PRÓXIMO VERÃO
Como ontem
demonstramos no artigo aqui publicado, a questão da PGA -
Portugália, sua integração no Grupo TAP e o seu desaparecimento
enquanto marca, abrindo a porta à existência da marca TAP Express é
crucial para se compreender o abandono do Aeroporto do Porto por
parte da companhia de bandeira portuguesa. Como já se disse, a PGA,
que pertencia ao Grupo BES, passou a ser detida a 100% pela TAP em
2007, depois de ter sido adquirida pelo Estado através de uma
sociedade especialmente criada para o efeito. Era a Portugália quem
operava os voos entre o Porto e várias cidades europeias que serão
descontinuados a partir de 27 de março.
Esses voos ligavam o
Porto a Roma, Barcelona, Bruxelas e Milão (várias frequências).
Mas, além destes, serão também descontinuadas ligações ou
reduzido o número de passageiros para outros aeroportos europeus,
como Londres, Madrid ou Genebra.
Essa política de
redução da operação e passageiros é muito mais significativa do
que possa parecer nos singelos anúncios da companhia, já que a TAP
não diminui apenas o número de rotas e voos, mas a capacidade de
transportar passageiros, pela substituição dos Airbus da TAP pelos
Embraer e Fokker da Portugália em quase toda a sua operação a
partir do Aeroporto Sá Carneiro.
Esta política de
desvalorização do Porto, levou a TAP a reduzir o número total de
passageiros transportados ao longo dos últimos anos de forma
significativa. De uma quota de mercado de 40% em 2009, passou para
menos de 20% em 2015, o que, face aos mais de oito milhões de
passageiros processados no Porto, representa cerca de 1,5 milhões de
passageiros TAP.
COMPANHIAS EUROPEIAS
APROVEITAM PARA OCUPAR ESPAÇO NO PORTO
Ora, se atentarmos
aos números fornecidos pela IATA, organização internacional que
faz a reserva do espaço aéreo, na temporada que se inicia a 27 de
março, haverá uma drástica redução de passageiros transportados
pela TAP para a Europa e para outros destinos, se excetuarmos Lisboa,
que será operada, num sistema de "ponte-aérea" pela
White.
Tomando por base uma
semana típica de julho, e retirando das estatísticas os voos
operados pela White para a TAP entre o Porto e Lisboa, vemos que as
ligações do Porto ao resto da Europa sofrerão uma redução
drástica de oito mil lugares disponíveis nos aviões da companhia
portuguesa, na comparação com a mesma semana de 2015, ano em que a
TAP já tinha reduzido a operação de forma significativa. Só se
juntarmos os lugares disponíveis nos voos da ponte aérea para
Lisboa conseguiremos atingir um número semelhante de passageiros.
A extrapolação
destes números representa cerca de 500 mil passageiros a menos
transportados pela TAP para a Europa e para o Mundo a partir do
Porto. Ou seja, a TAP reduzirá cerca de 33% a sua capacidade de
transporte de passageiros diretamente para o Porto. Os outros 500 a
600 mil, terão que chegar via Lisboa e, além dos voos diretos para
a capital, apanhar, depois, a ponte aérea para o Porto, num dos ATR
a hélice operados pela White.
AEROPORTO DO PORTO
PODE ULTRAPASSAR OS NOVE MILHÕES APESAR DA TAP
Refira-se que,
segundo os números IATA, todas as companhias que voam para o Porto
têm previsto aumentos significativos de frequências e número de
passageiros para o Aeroporto Sá Carneiro e muitas delas iniciam
mesmo novas ligações.
Só a Ryanair tem
previsto um aumento de quase quatro mil passageiros por semana,
compensando metade da perda da TAP e a Lufthansa quase três mil. A
EasyJet adquiriu já o direito a transportar para o Porto cerca de
mais cinco mil passageiros por semana, relativamente a 2015, a
Turkish Airlines cresce quase dois mil passageiros por semana, a
British Airways mais 1.500 e quem mais cresce é a francesa
Transavia, com mais nove mil passageiros do que em 2015. Esta
companhia terá, na altura do Verão, 23 voos semanais para
Paris/Orly. Igualmente a crescer está a Vueling, com quase mais seis
mil passageiros por semana.
Só a SATA diminui
também a sua frequência, com menos mil passageiros por semana do
que em 2015.
A atingirem-se os
números máximos e extrapolando para o ano, pode concluir-se que o
Aeroporto do Porto tem condições, em 2016 para ultrapassar os nove
milhões de passageiros processados, depois de em 2015 ter atingido
pela primeira vez oito milhões. Ou seja, um crescimento a dois
dígitos, depois de ter registado um aumento de 17% de passageiros em
2015.
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