Um em cada quatro portugueses gostaria de emigrar
Análise das percepções dos portugueses sobre a crise traça retrato de um povo pessimista, resiliente e sem confiança na governação
Num estudo onde se comparam as percepções de cidadãos
portugueses, gregos, espanhóis e irlandeses sobre o impacto da crise nas suas
vidas e sobre a forma como encaram o desempenho económico dos seus países, é
necessária uma advertência prévia. O responsável do estudo, Robert Manchin,
director da Gallup Europa, explica que há cinco anos (a análise compara dados
recolhidos entre 2008 - início da crise - e 2013), os portugueses já encaravam a
sua economia como estando em pior estado do que a dos seus congéneres. "Talvez
seja uma questão cultural", admite. Quanto à evolução das condições económicas,
os portugueses voltam a destacar-se pelo pessimismo. Tal como em 2008, 80% dos
inquiridos acham que só podem piorar (sendo apenas superados pelos gregos, com
90%).
Comum a todos os países é o descrédito crescente na liderança política. Em
Portugal, tal como em Espanha, apenas um em cada cinco inquiridos tem confiança
nesta classe (na Grécia, a percentagem não vai além dos 14% e na Irlanda, 33%).
Mas se em Portugal a confiança nas instituições financeiras é maior quando
comparada com os pares (especialmente com a Irlanda, "onde os cidadãos não
perdoam aos bancos"), é grande a percepção de que há corrupção no mundo dos
negócios (89% dos inquiridos). Aqui (tal como na Grécia e em Espanha), a taxa de
desemprego vem subindo desde 2008, enquanto o índice de satisfação profissional
desce. Evolução preocupante "quando a motivação dos trabalhadores é um dos
melhores recursos económicos que um país pode ter", sublinha Manchin."Para que é que precisamos da Europa?" é uma questão que começa a surgir nestes países, nota o responsável, referindo existir "uma percepção popular" de que grande parte da crise resultou de "acções destinadas a salvar bancos alemães e franceses". Quando valores que sustentavam a Europa, "como a segurança e a criação de emprego" começam a ser questionados, "o projecto europeu corre riscos". O maior "é o aparecimento de partidos radicais", num momento em que os políticos "estão divididos entre fazer o que é bom para o futuro e o que é bom para o futuro imediato", afirma.
Apesar de destacar "a grande resiliência da sociedade portuguesa", que talvez explique por que é que 54% dos inquiridos estão satisfeitos com o seu nível de vida, apesar de 60% admitirem que este está a deteriorar-se, Manchin lamenta os níveis do desemprego jovem e aquilo a que chama "geração perdida". "Quando deixamos que taxas elevadas [de desemprego] como as actuais aconteçam, é difícil fundamentar tudo o que temos feito [a nível europeu] até agora". Não será, por isso, de estranhar que pelo menos um quarto dos portugueses inquiridos admita que gostaria de emigrar (23% pensam fazê-lo nos próximos 12 meses e 5% já se preparam para o fazer). A preferência vai para o Brasil, França e Estados Unidos.
O estudo menciona ainda a diminuição das redes de familiares ou amigos a quem recorrer, uma situação que se tem agravado particularmente na Grécia, mas que em Portugal se mantém relativamente estável (87% em 2008, contra 85% em 2013). Porém, Manchin sublinha o reverso da medalha: "Isto significa que 15% das pessoas sentem que não têm ninguém a quem recorrer". com Camilo Soldado
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