Tanto jogou com isso que hoje é difícil levar a sério o seu
discurso
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Há muitas expressões que podem sintetizar a situação
embaraçosa em que Paulo Portas se encontra no governo. Por exemplo, que não é
possível ter "sol na eira e chuva no nabal", que "quem tudo quer
tudo perde", que "não se entrega o ouro ao bandido" ou que
"não se deve jogar com paus de dois bicos".
Vem isto a propósito do papel que Paulo Portas reclamou para
si e Passos Coelho lhe concedeu com
as honrarias e a plumagem do lugar de vice-primeiro-
-ministro. Somando a outras circunstâncias o cansaço de tanto jet lag, Portas
agravou no Verão de forma quase irreversível a crise aberta pela fuga de Vítor
Gaspar, que por si só já ficaria para a história. Mas isso é passado.
O que interessa hoje é que o Paulo Portas que supostamente
coordena a área económica, que tem inevitável relação com as instâncias da
troika e mais umas quantas instituições e figuras internacionais para explicar
que estamos no bom caminho, é rigorosamente o mesmo que armou no Verão o que os
brasileiros chamam "um barraco". As consequências do dito são as que
ainda hoje estamos a pagar e que obviamente lhe são recordadas de forma mais ou
menos subtil em todas as reuniões internas e externas, sendo ainda
sistematicamente vertidas para todos os relatórios oficiais ou de agências de
rating que se publicam diariamente.
De facto, é bom não esquecer que foi a crise estival que
levou a que Portugal entrasse em derrapagem total. Portas fez o mal e a
caramunha. Ou seja, criou um problema e agravou o que já estava muito mal. Ia
atirando o governo abaixo quando proclamou que havia linhas intransponíveis e
falou de irrevogabilidades, obrigando Cavaco a uma intervenção de emergência
cujos contornos ainda hoje não são claros. A crise aberta por Gaspar e
cavalgada por Portas fragilizou o país e fez com que a troika se tenha tornado
mais intransigente em relação a nós, como se vê pelo Orçamento de 2014, no qual
não tolerou cedências, mesmo que ele se tenha tornado uma ficção.
Esse comportamento ainda poderia ser esquecido se do
Ministério dos Negócios Estrangeiros Portas tivesse passado para a
Administração Interna ou para um lugar simbólico, tipo ministro da República
para os Açores ou para a Madeira (função neocolonial em boa hora extinta), mas
que o apagariam parcialmente. Depois de tudo isso, vê-lo ralhar com a oposição
ou dirigir convites ao investimento externo, como se tivesse sido um modelo de
coerência e uma referência de estabilidade, deixa um cidadão com memória
boquiaberto e qualquer estrangeiro com acesso ao Google com a sensação de que
deve haver duas figuras públicas em Portugal com o mesmo nome e que em dado
momento ocuparam lugares relevantíssimos, tendo-se substituído um ao outro. Que
seja a mesmíssima pessoa é coisa que certamente não lembra a ninguém para lá de
Badajoz.
É verdade que no interior da coligação governamental Portas
subiu na hierarquia, mas simultaneamente perdeu muito peso face a Passos Coelho
e mesmo dentro do CDS, onde teria sido substituído, possivelmente por Pires de
Lima, se não tivesse recuado.
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