Ana Gomes e mais cinco deputados europeus foram vítimas de pirataria informática
Treze pessoas tiveram as contas de email devassadas por um
hacker que afirmou querer provar a fragilidade dos sistemas de segurança
informática do PE.
A revelação foi feita no fim da semana passada pelo
site de informação francês Mediapart, que afirma que o pirata,
que não é identificado, teve acesso a "dezenas de milhares de emails,
documentos confidenciais, cadernos de endereços, agendas, correspondência
profissional, mas também privada..."
O site optou por publicar o nome de todos os visados, que incluem
seis eurodeputados – três franceses, um alemão, um italiano e a socialista
portuguesa Ana Gomes. Quatro assistentes parlamentares, incluindo um de Ana
Gomes, um colaborador de um grupo parlamentar e dois funcionários dos serviços
informáticos e de segurança foram as outras pessoas visadas pelo
hacker.Neste caso concreto, "não nos apercebemos" de que alguém teria entrado na caixa de email, afirma Alexandra Carreira, assistente de Ana Gomes. Isto, ao contrário de um anterior episódio, que levou a eurodeputada portuguesa a apresentar queixa à Polícia Judiciária e aos serviços informáticos do PE no final de 2010 por suspeita de devassa do seu email: segundo o que contou na altura, na véspera de ter apresentado uma queixa contra a compra de submarinos alemães por Portugal, várias mensagens relativas a este assunto desapareceram da sua caixa de email. O PÚBLICO ainda não conseguiu obter uma reacção de Ana Gomes, que está em trabalho parlamentar na Etiópia.
Segundo o Mediapart, a intenção do hacker – qualificada por este como de "natureza política" – foi provar a fragilidade do sistema informático do PE. "Escandalizado pela falta de reacção da classe política às revelações de Edward Snowden, [o pirata] quis provocar um electrochoque e fazer da questão da soberania numérica um tema central das próximas eleições europeias", afirma o site, referindo-se ao antigo colaborador da National Security Agency (NSA) que revelou a espionagem em larga escala realizada pelos serviços secretos americanos na Europa, incluindo de inúmeros responsáveis políticos.
Ainda de acordo com o Mediapart, o pirata também quis demonstrar o risco de recurso das instituições públicas ao sistema operativo e às aplicações da Microsoft, cuja fidedignidade é frequentemente posta em causa.
O pirata terá contado ao Mediapart que a devassa das 13 caixas de email foi uma "brincadeira de crianças" para a qual apenas precisou de um computador "de gama baixa" com um acesso sem fios à Internet (wi-fi) mais "alguns conhecimentos que toda a gente pode encontrar na Internet".
A entrada nas caixas de email foi possível a partir de uma aplicação da Microsoft instalada nos smartphones dos deputados que lhes dá acesso aos servidores do PE e que tem registados os seus dados de entrada – nome de utilizador e palavra-passe. A partir desta aplicação, os smartphones conectam-se regularmente às contas de email dos deputados para verificar se há novas mensagens. O pirata apenas precisou de programar o seu computador para o colocar, via wi-fi, entre os smartphones e os servidores do PE, o que lhe permitiu decifrar os dados de acesso e entrar nas contas das pessoas escolhidas.
Segundo o serviço de imprensa do PE, a pirataria incidiu apenas sobre a rede externa de wi-fi do PE, que, como qualquer sistema aberto, coloca os utilizadores em situação de grande vulnerabilidade face a eventuais ataques de hackers. A rede interna de wi-fi, limitada a deputados e funcionários, não foi devassada. "Temos a certeza absoluta disso", garantiu Jaume Duch, director do serviço de imprensa do PE. Duch confirmou igualmente que a rede externa de wi-fi foi encerrada imediatamente a seguir à publicação das revelações do Mediapart, e que assim permanecerá pelo menos até à conclusão da investigação aberta pelo PE.
Duas assistentes de um dos deputados devassados, do grupo parlamentar dos Verdes, escreveram ao hacker, via Mediapart, para agradecer, com ironia, a pirataria, que, afirmam, permite relançar "o debate da segurança numérica e da protecção de dados, da transparência em política e do papel dos lobbies, do estado da vigilância e das liberdades individuais".
Segundo as duas assistentes, nada de muito confidencial circula no PE, a não ser as estratégias de negociação dos grupos parlamentares, a constituição de alianças, ou a análise das posições dos lobbies, organizações não-governamentais, cidadãos ou indústrias que inundam as caixas de correio.
"O verdadeiro escândalo, escrevem, não é que as posições dos eurodeputados circulem por email, ou que um pirata as possa interceptar. O verdadeiro escândalo seria que 'interesses privados' desviassem os deputados e os seus assistentes do seu trabalho de recolha de posições e de concepção de uma linha política em função dos seus 'valores' e 'ideias' e da sua defesa 'até ao fim'. Para isso não é preciso email; o risco de submissão do político aos interesses privados não apareceu com a Internet", afirmam.
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