A Crise de
Representatividade e de Credibilidade Política nos Partidos
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OPINIÃO
O destino do partido
ANTÓNIO GUERREIRO
07/11/2014 / PÚBLICO
O novo partido
que em Espanha ameaça a hegemonia bipartidária da história da democracia
espanhola é uma manifestação organizada em oposição a uma tecnologia
governamental e a uma organização do Estado que derivam de uma transformação do
regime democrático em regime oligárquico alargado. A propósito deste fenómeno
político fala-se, geralmente, de crise da representação ou crise da legitimidade
democrática. Se as eleições já não fabricam legitimidade é porque o partido — a
forma partido —, depois de uma história grandiosa, deixou de ser a forma
organizada do conflito social e já não se confunde com o próprio destino da
política moderna, como aconteceu ao longo de um século. Os chefes partidários
são hoje showmen políticos no espaço publicitário, como já tinha anunciado
Baudrillard há cerca de 30 anos. Daí, aquela sensação tão desconfortável que
nos provocam os partidos “oficiais” e muitos dos candidatos à oficialização: a
de que prosseguem o seu labor intelectual e a sua intervenção pública sobre um
mundo que já desapareceu, como se estivessem munidos de mapas obsoletos, onde
os traçados das fronteiras estão completamente desactualizados. A desorientação
é tal, tão grande é a dificuldade em perceber as razões pelas quais o partido
político deixou de ser o protagonista de uma longa história (essas razões
coincidem obviamente com dois outros grandes desaparecimentos: o da categoria
política do povo e o do Estado enquanto concentração do poder e monopólio da
violência), que os partidos até já se tornaram agentes activos da neutralização
da política, quando não chegam mesmo a incorporar a ideologia da antipolítica.
Para fazer uma sociologia do partido político, Max Weber é indispensável. Mas
não o é menos um sociólogo alemão menos conhecido, Robert Michels (1876-1936),
que fez o primeiro estudo científico — publicado em 1911 — sobre um objecto
então ainda pouco conhecido, o moderno partido político. Nesses estudo, Michels
formulava com extrema nitidez a tese que o tornaria célebre e o colocaria entre
os pais fundadores da chamada “teoria elista” da política. Segundo ele, o
processo democrático está destinado, inevitavelmente, a sofrer uma inflexão, um
desvio perverso, no sentido da oligarquia. Aquilo a que Michels chama “a lei
férrea da oligarquia”, significando assim que se trata de um destino
obrigatório e irreversível, consiste na tendência inevitável da democracia
partidária para produzir estruturas hierárquicas nas quais uma minoria captura
os interesses e os direitos da maioria e decide por ela. Michels constrói a sua
lei sob a forma de um silogismo. O primeiro termo do silogismo diz-nos, grosso
modo, que não existe democracia sem organização, sob a forma de partido, já que
a massa desorganizada não é capaz de assumir o papel de sujeito e de tomar
decisões. Mas quem diz organização partidária diz oligarquia, isto é, um
pequeno grupo fechado de dirigentes com bastante poder discricionário.
Conclusão de Michels e terceiro momento do seu silogismo: a democracia é
impossível. Ou, como ele também diz, “houve revoluções, mas não regimes
democráticos”. Em suma: toda a tentativa de ampliar a participação democrática
está destinada a resultar numa inflexão oligárquica, formando-se assim um grupo
de “monopolistas” do poder e da decisão, tão exclusivo e viscoso como o dos
tempos da aristocracia. Esta sociologia do partido político ganhou hoje uma
enorme pertinência e já nem sequer se confunde com a “revolução conservadora”
que num certo momento da História do século XX se apropriou dela.
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