BCE aumenta a pressão à Grécia ao
cortar apoios aos bancos
SÉRGIO ANÍBAL
04/02/2015 - PÚBLICO
Banco central deixa de aceitar dívida pública grega como colateral.
O Banco Central
Europeu (BCE) aumentou esta quarta-feira à noite a pressão sobre o novo governo
grego ao anunciar que a partir de 11 de Fevereiro deixará de aceitar os títulos
de dívida pública da Grécia como colateral para os empréstimos que concede aos
bancos.
Esta decisão pode
significar que os bancos gregos, que são detentores de quantidades significativas
de dívida pública do seu país, podem ficar sem suficientes activos elegíveis
para apresentarem como garantia no recurso às operações de financiamento junto
do BCE.
Um cenário em que
os bancos gregos perdem a capacidade para se financiar por inteiro ainda não se
coloca neste momento porque o BCE, no comunicado em que anunciou a decisão, faz
questão de frisar que as necessidades de financiamento dos bancos europeus que
não tenham colaterais suficientes “pode ser satisfeita pelo respectivo banco
central nacional, através de Assistência de Liquidez de Emergência (ELA na
sigla em inglês) de acordo com as regras actuais do Eurosistema.
Isto é, o bancos
gregos que com a decisão desta quarta-feira fiquem sem activos suficientes para
apresentar como garantia ao BCE ainda podem recorrer ao Banco da Grécia para
empréstimos de emergência. Estes empréstimos têm taxas de juro mais caras e
estão sempre dependentes da autorização (dada de 15 em 15 dias) do conselho de
governadores do BCE, que tem de considerar que os bancos não estão insolventes
e que o Banco da Grécia não está a incorrer em riscos demasiado elevados ao
emprestar dinheiro aos bancos. Neste momento, já há dois bancos gregos que,
face à fuga de depósitos que se verificou nas últimas semanas, recorreram à Assistência
de Liquidez de Emergência num valor superior a 2000 milhões de euros.
No comunicado, o
BCE explica a sua decisão com o facto de “não ser actualmente possível assumir
que se venha a verificar uma conclusão bem sucedida da avaliação do programa [da
troika na Grécia]”.
De acordo com as
regras actualmente em vigor, a dívida de um país que apenas tenha ratings
situados no nível “lixo” (como é o caso da Grécia) apenas pode ser elegível
como colateral no BCE caso esse país esteja a cumprir as condições impostas por
um programa da troika.
O novo Governo
grego já deixou claro que não pretende concluir o actual programa da troika,
nem solicitar a sua extensão. O que o Executivo liderado pelo Syriza tem vindo
a pedir ao BCE é a criação de condições de financiamento no curto prazo que
dêem tempo ao novo Governo para negociar até Junho um novo acordo com os seus
parceiros europeus.
Terá sido isto
que o ministro das Finanças grego, Yanis Varoufakis, terá solicitado a Mario
Draghi na reunião que realizou esta quarta-feira na sede do BCE, em Frankfurt.
De acordo com o relato do encontro feito pelo próprio Varoufakis, o presidente
do BCE ter-lhe-á dado conta “das regras e dos constrangimentos” do banco
central na altura de financiar o sistema financeiro de um dos países do euro.
Alemanha quer que Governo da
Grécia recue nas promessas
SÉRGIO ANÍBAL e
JOÃO MANUEL ROCHA 04/02/2015 - PÚBLICO
Posição confirma dificuldade em encontrar pontos de entendimento entre Atenas
e os responsáveis da maior economia europeia. Varoufakis vai esta quinta-feira
a Berlim.
A Alemanha quer
que o novo Governo grego recue nas promessas de redução de austeridade que
confirmou nos dias seguintes à tomada de posse, revela um documento produzido
por Berlim para a reunião preparatória do Eurogrupo, que se realiza esta
quinta-feira.
De acordo com a
agência Reuters, que teve acesso ao documento, o Governo alemão defende que a
posição do Eurogrupo seja de intransigência em relação ao incumprimento pela
Grécia das medidas acordadas com a troika.
“O Eurogrupo
precisa de um compromisso claro e antecipado da Grécia que garanta a total
implementação das medidas chave das reformas necessárias para manter o programa
[da troika na Grécia] dentro do previsto”. “O objectivo é a continuação da
agenda de reforma acordada (sem recuo nas medidas), cobrindo áreas como a
gestão das receitas, impostos, gestão das finanças públicas, privatizações,
administração pública, saúde, pensões, segurança social, educação e combate à
corrupção”, diz o documento.
A Alemanha
defende que deve ser exigido à Grécia que cumpra o objectivo de redução do
número de funcionários públicos em 150 mil, aplique a reforma da segurança
social acordada, mantenha o salário mínimo ao nível actual e aposte em
negociações salariais descentralizadas.
Logo no dia a
seguir à posse, o Governo liderado por Alexis Tsipras anunciou que estava a
preparar a passagem à prática de promessas eleitorais como a reposição do valor
do salário mínimo, a reintegração de funcionários públicos cujo despedimento
tinha sido considerado inconstitucional e a suspensão de privatizações em
curso.
No documento
preparatório visto pela Reuters consta ainda a intenção da Alemanha de ver o
Governo grego declarar que irá honrar os compromissos financeiros com o FMI, o
BCE e os parceiros do euro, além de assegurar a independência do banco central
e das autoridades fiscais e estatísticas do país.
A posição
assumida pelo Governo alemão neste documento confirma a dificuldade em
encontrar pontos de entendimento entre o novo Executivo de Atenas e os
responsáveis políticos da maior economia europeia. Isto precisamente quando o
ministro das Finanças grego, Yanis Varoufakis visita a Alemanha e se reúne,
esta quinta-feira, com o seu homólogo Wolfgang Schäuble.
Na sua tentativa
de convencer a opinião pública alemã da bondade das propostas do Governo
Syriza, Varoufakis deu entrevistas a vários meios de comunicação social. Ao Die
Zeit, tentou dar resposta ao receio de que se esteja a assistir a um recuo nas
reformas exigidas pela troika, dizendo que “os alemães têm de compreender que
darmos mais 300 euros ao ano a um pensionista que vive com 300 euros por mês
não significa que estamos a fugir do caminho da reforma”. “Quando falamos de
reformas, temos é de falar dos cartéis e dos gregos ricos que quase não pagam
impostos”, disse.
Varoufakis
explicou a recusa em concluir o actual programa da troika com uma comparação
entre a Grécia e um trabalhador desempregado. “Dar-lhe-iam outro empréstimo
para que ele pudesse fazer os pagamentos para o empréstimo da casa? Isso não
funcionaria. Eu sou o ministro das Finanças de um país falido”, afirmou.
Negociação com o
BCE
Ao mesmo tempo,
em Bruxelas, o primeiro-ministro continuou a apostar num discurso de diálogo.
Alexis Tsipras teve um acolhimento amigável de Jean-Claude Juncker, que na
campanha eleitoral tinha manifestado preferência por dialogar com “caras
conhecidas”. Frente à imprensa, o presidente da Comissão beijou na face o
interlocutor e levou-o pela mão para o seu gabinete. Não houve declarações após
o encontro.
Tsipras reuniu-se
também com o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, e com o presidente do
Parlamento Europeu, Martin Schulz, o primeiro dirigente comunitário a visitá-lo
em Atenas, na semana passada. Numa curta declaração, ao lado de Schulz,
declarou-se “muito optimista”. “A história da União Europeia é feita de
desacordos, mas, no final, há um compromisso. Devemos trabalhar em conjunto
para chegar a um acordo”, disse.
Em Paris, onde
foi recebido pelo Presidente François Hollande, Tsipras pediu à França para
desempenhar um papel de protagonista num acordo europeu “para um regresso ao
crescimento, para o reforço do emprego e da coesão social”.
Informações
divulgadas em Atenas pelo Governo grego indicam que Tsipras manifestou a
Juncker a necessidade de “tempo para negociar, sem ultimatos” e o desejo de
obter um “acordo transitório”, que dê à Grécia folga para elaborar um plano
“radical” de reformas e financiamento para quatro anos, associado a um alívio
das obrigações orçamentais.
As reformas
incluiriam o combate à corrupção e à fraude fiscal e o reforço da eficácia da
administração pública. Do lado orçamental, o objectivo é um “reequilíbrio financeiro”
que não obrigue o país a um excedente orçamental primário “monstruoso” de 4,5%
do PIB.
Esta quarta de
manhã, o ministro das Finanças grego encontrou-se em Frankfurt com o presidente
do BCE. O banco central pediu ao governo grego para “negociar rapidamente e de
maneira construtiva”, a fim de assegurar a “estabilidade financeira” da Grécia,
disseram fontes da instituição à AFP.
De acordo com o
relato do encontro feito pelo próprio Varoufakis aos jornalistas, Mario Draghi
“foi particularmente prestável ao explicar o mecanismo através do qual o BCE
apoia os Estados da zona euro, incluindo a Grécia”, dando conta nomeadamente,
“dos constrangimentos, das regras, dos regulamentos e dos processos pelos quais
a relação entre a Grécia, a zona euro e, claro, o banco central se deve reger”.
Pela sua parte,
Varoufakis disse que teve “a oportunidade de apresentar [a Draghi] a completa e
inabalável determinação do Governo grego” de que não o caso grego não pode ser
tratado da mesma maneira que estes assuntos são habitualmente tratados”. Não é
“business as usual”, disse.
Para as próximas
semanas, o novo Governo grego tem dois temas a tratar com o BCE: a
possibilidade de encontrar um modelo de financiamento do Estado grego até Junho
que permita dar tempo ao Executivo para negociar um novo programa de apoio
financeiro com os seus parceiros europeus e a garantia de que os bancos gregos
vão poder continuar a aceder ao financiamento do BCE mesmo sem estar em vigor
um programa da troika na Grécia.
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