Grécia. Uma estratégia perigosa
Por Luís Rosa
publicado em 3 Fev 2015
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Se a Grécia quiser sair da UE,
vai ser confrontada com a factura das muitas dezenas de milhares de milhões de
euros dos fundos estruturais europeus que recebeu
A estratégia negocial do
polícia mau/polícia bom nasceu nos filmes dos estúdios de Hollywood, mas até
podia ter sido inventada pelos gregos. Alexis Tsipras e a nova estrela do seu
governo, o ministro das Finanças, Yanis Varoufakis, têm representado nos últimos
dias essa estratégia perfeita. Se num dia Tsipras garante que a Grécia quer
cumprir os acordos com os seus credores, no dia seguinte Varoufakis diz que não
negoceia com a troika;se Tsipras assegura que a Grécia tem obrigações em
relação a todos os credores, Varoufakis faz, de seguida, um aviso unilateral à
troika de que os gregos não podem pagar as actuais condições do resgate. Tudo
somado, os gregos continuam a dizer uma coisa e o seu contrário para
chantagearem a União Europeia (UE), a fim de conseguirem três coisas: um
aumento do prazo do empréstimo da troika; a entrada no plano Draghi de compra
de dívida pública europeia; e a admissão num programa cautelar fiscalizado pela
UE para expulsar a troika de Atenas.
O principal problema
desta estratégia da dupla Tsipras/Varoufakis é que, sem cedências da Alemanha,
o acordo torna-se impossível e potencialmente perigoso para toda a Europa. A
saída da Grécia do euro e da UE não só pode contagiar Portugal, Espanha e
Itália, como pode mesmo desencadear um conflito militar – daí a importância da
carta da Rússia, que Tsipras faz questão de jogar. Mas como poderá isso
acontecer? Comecemos por explicar que a saída de qualquer Estado--membro da UE
e do euro não está prevista em nenhum tratado porque não se esperava que alguém
quisesse desistir de um projecto cor-de-rosa como o da Europa.
Imaginemos agora a
situação de Portugal. Entrou em 1986 e recebeu até 2011 mais de 80 mil milhões
de euros de fundos estruturais para investir em reformas estruturais e
construir infra-estruturas. Os gregos vêm logo a seguir a Portugal e são um dos
quatro países da UE que mais dinheiro recebeu de Bruxelas no mesmo período.
Tais fundos foram financiados, entre outros, pela Alemanha, Holanda, Bélgica,
Dinamarca, Reino Unido, etc. É certo que, em troca, Portugal, Grécia e todos os
beneficiários dos fundos estruturais abriram as portas dos seus mercados às
empresas e produtos, mais competitivos, do norte da Europa, contribuindo dessa
forma para o aumento da riqueza de cada um desses países. Mas, infelizmente,
não é assim que, por exemplo, os contribuintes alemães vêem o problema.
E aqui reside o ponto
fulcral da questão: se quiser sair da União Europeia, a Grécia vai ser
confrontada com a factura das muitas dezenas de milhares de milhões de euros de
fundos estruturais que lhe foram concedidos para construir estradas, portos,
aeroportos, universidades, escolas, hospitais, hotéis, ou para fazer formação
profissional, ou para modernizar a agricultura ou indústria - entre muitos
outros fins dos fundos europeus. Os contribuintes do norte da Europa que
ajudaram a financiar o desenvolvimento grego vão querer o seu dinheiro de
volta, face à iminência de a Grécia sair do mercado comum – além da devolução
de uma parte dos 240 mil milhões de euros que a Europa emprestou à Grécia no
âmbito dos programas de assistência financeira e de boa parte da insolvente
dívida pública grega estar nas mãos dos principais países europeus. O que dirá
Tsipras? Ninguém sabe, mas uma coisa é certa: a história ensina que há guerras
que começaram por bastante menos.
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