sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Birgitte Nyborg. Um exemplo para Costa, por Luís Rosa


Birgitte Nyborg. Um exemplo para Costa
Por Luís Rosa
publicado em 6 Fev 2015 in (jornal) i online

Os amigos do Syriza estão a fazer a estrada de Damasco e a ceder diariamente nas suas promessas eleitorais face à pressão da Europa. Uma demonstração do que o PS pode esperar

Já ouviu falar de uma série de TV chamada “Borgen”? Passa na RTP 2 todos os dias e, apesar de se basear na realidade dinamarquesa, as suas mensagens adaptam-se a qualquer democracia representativa ocidental. A protagonista chama-se Birgitte Nyborg, é líder de um partido do centro-esquerda chamado Os Moderados e é o protótipo da política idealista que, chegada ao poder através de uma coligação com mais dois partidos, se adapta ao pragmatismo da negociação política. Os argumentistas do “Borgen” criaram vários partidos que correspondem ao espectro político dinamarquês, sendo um deles o Partido Trabalhista – o equivalente do PS português.

No “Borgen”, tal como o PS na realidade portuguesa, os trabalhistas continuam demasiado dependentes dos sindicatos, nomeadamente dos da função pública, e fazem oscilar as suas posições políticas entre o puro conservadorismo de rejeitar qualquer reforma estrutural do Estado, laboral ou do sistema de pensões, a tendência para ser modernos nas causas fracturantes e a defesa da vaca sagrada do investimento público. Birgitte Nyborg, por seu lado, percebe a necessidade de reformar o Estado social face aos recursos financeiros de que dispõe e não é por isso que é menos de esquerda ou recebe o rótulo de ultraliberal. Bem vistas as coisas, é uma boa série para António Costa.

Vem esta alusão a uma obra de ficção de qualidade para melhor percebermos o ainda curto percurso de António Costa como líder do PS. Depois de ter derrotado claramente António José Seguro, Costa foi eleito em Novembro líder do PS com 96% dos votos com a aura de um D. Sebastião que iria conquistar de caras uma maioria absoluta em Outubro de 2015. Dois meses e meio depois de ter sido eleito, estamos muito longe desse cenário. A maioria PSD/CDS voltou a subir e colou-se ao PS.

Não se esperavam grandes propostas durante o curto mandato, e compreende-se que António Costa queira reservar a maioria das propostas para mais perto das eleições, mas não se esperava que o seu discurso fosse tão vazio de ideias concretas. O líder do PS está farto de dizer que a política de austeridade não é a solução sem explicar com dados concretos como vai conseguir financiar uma política expansionista de investimento público. Fala numa mudança política em Bruxelas que permitirá um maior investimento da Europa mas não só os sinais que vemos da Alemanha apontam no sentido contrário como a sua influência para mudar a política europeia será perto de zero. Diz que sempre recusou que a “renegociação da dívida fosse a única e necessária solução”, mas congratulou-se com uma vitória da extrema-esquerda grega que defendia um perdão de dívida, recuando poucos dias depois.


António Costa não está a começar bem a sua caminhada. Continua a ser o principal favorito à vitória nas próximas legislativas mas vai ter de dizer aos portugueses ao que vem e como pretende acabar com a austeridade. Os seus amigos do Syriza estão a fazer a estrada de Damasco e a ceder diariamente nas suas promessas eleitorais face à pressão justa das instituições europeias e da Alemanha – uma pequena prova do que espera António Costa, sendo certo que é mais provável a conversão do líder do PS à austeridade que a de Alexis Tsipras. Tal como foi possível a conversão de Birgitte Nyborg do idealismo ao pragmatismo.

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