O ex-ministro
Bagão Félix é um dos subscritores do "apelo para resgatar a PT"
Mário Cruz / Lusa
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Pires de Lima rejeita conselho da
“brigada de resgate”. Subscritores dizem que é só um “alerta”
4/11/2014 /
OBSERVADOR
Ministro da Economia leu o apelo de Bagão, Louçã e Freitas do Amaral.
Respeita, mas rejeita a palavra resgate. Ao Observador, os subscritores dizem
que é apenas um alerta para a ação. Sem soluções.
António Pires de
Lima leu o documento assinado por 14 personalidades para pedir ao Governo e
“aos órgãos de soberania” o “resgate da PT”. Leu e compreendeu as
“preocupações” manifestadas por “pessoas que respeita”, mas rejeitou a ideia de
“resgate” – uma palavra que, diz, está imediatamente associada à “herança”
deixada por José Sócrates. E apelidou mesmo aquele conjunto de personalidades,
onde se incluem nomes como Bagão Félix, Freitas do Amaral, Francisco Louçã e Silva
Peneda, de “brigada de resgate” por terem escrito nos últimos tempos uma série
de manifestos.
“Eu li. São
pessoas que respeito e compreendo as preocupações. São pessoas que têm uma
história recente em Portugal, que têm formulado uma série de manifestos – penso
que nos últimos tempos -, e que terminam sempre com uma palavra que é preciso
evitar: resgate”, disse Pires de Lima à agência Lusa no final de uma visita à
fábrica do grupo Visteon, em Palmela.
A ideia é que o
Governo, que de resto já se manifestou várias vezes nesse sentido, não quer pôr
a mão no negócio da PT e “resgatar” a empresa. “Portugal teve um resgate,
aquele que nos deixou como herança o engenheiro José Sócrates e não quero ter
mais nenhum”, disse o ministro, garantindo que é essa a linha de orientação que
o Governo vai seguir no âmbito do caso Portugal Telecom. Prova disso é que o
próprio vice-primeiro-ministro, Paulo Portas, já teve reunido com os franceses
da Altice para discutir a compra da operadora.
Desta vez, não é
um manifesto
O documento
assinado por personalidades, da esquerda à direita, para pedir uma “atuação
intensamente ativa” do Governo no sentido de travar a venda da PT “não é um
manifesto”, garantiu ao Observador Bagão Félix, um dos signatários. O
abaixo-assinado, que foi divulgado esta terça-feira pelo jornal Público,
trata-se precisamente de um “apelo para resgatar a PT”, como diz o texto, não
avançando propositadamente com propostas de solução. Nacionalização? “Isso é
que não”, diz Silva Peneda.
Ao Observador, o
ex-ministro das Finanças, Bagão Félix, não quis adiantar mais nada para além do
que está no documento, sublinhando apenas que não se trata de um manifesto. É
que, como Pires de Lima lembrou, vários dos signatários deste “apelo” assinaram
também o conhecido Manifesto dos 74, que juntou economistas e personalidades de
vários quadrantes políticos para pedir ao Governo a reestruturação da dívida
pública. O documento levou à criação de uma petição que, em abril, chegou à
Assembleia da República e serviu de base a um projeto de resolução do Bloco de
Esquerda sobre o assunto.
Não sendo um
manifesto, Silva Peneda, outro dos signatários, prefere dizer que “é um
alerta”. Questionado pelo Observador sobre o texto, o atual presidente do
Conselho Económico e Social afirma que a ideia da iniciativa é exercer uma
“forma de pressão” sobre os poderes políticos para não se limitarem a ficar a
assistir à “iminente venda da PT”.
Ricardo Cabral
reforçou a ideia de que a razão de ser do documento é “mostrar preocupação com
todo o processo”. “Achamos que o Estado não se pode alhear de uma coisa que é
de interesse nacional”.
Silva Peneda
garante que assinou o documento porque o negócio da PT o “preocupa” e é
“importante para o país”, mas também, e principalmente, porque cabe ao poder
político, “acautelar alguns tipos de interesses públicos”. E lembra, neste
ponto, o caso do centro tecnológico, que deve ser “acautelado”. Questionado
sobre qual a solução que o grupo dos 14 propõe para o negócio da PT, o
ex-ministro dos governos de Cavaco Silva recusa a ideia da nacionalização da
operadora de telecomunicações e é perentório, dizendo que o documento “não
apresenta nenhuma solução” – não é esse o propósito da missiva.
Também o
economista Ricardo Cabral reforçou a ideia de que a razão de ser do documento é
“mostrar preocupação com todo o processo”. “Achamos que o Estado não se pode
alhear de uma coisa que é de interesse nacional”, disse ao Observador o
economista, que assinou o apelo ao lado de nomes como Diogo Freitas do Amaral,
Bagão Félix, Francisco Louçã, Silva Peneda, Carvalho da Silva, Pacheco Pereira
ou João Cravinho.
No documento, os
14 subscritores exigem “das autoridades políticas e públicas”, onde se inclui
Governo, Parlamento e até Presidente da República, “uma atuação intensamente
ativa”. Ricardo Cabral insiste nessa ideia, reiterando que, por haver “muitas
dúvidas sobre o negócio”, “as autoridades deviam estar a analisar todas as
operações com cuidado”.
O Observador
tentou contactar os restantes signatários, como Francisco Louçã, José Pacheco
Pereira, Carvalho da Silva e Freitas do Amaral, mas sem sucesso.
PT. Estado não é a solução
Por Luís Rosa
publicado em 5 Nov
2014 in
(Jornal) i online
A origem do
problema reside na gestão Bava/Granadeiro, mas também na Europa
Qualquer
manifesto que una Francisco Louçã a Freitas do Amaral ou a Bagão Félix é
certamente uma notícia de primeira página em qualquer jornal - e digno de
estudo dos cientistas políticos. Pode significar que a união entre a
extrema-esquerda, o centro equidistante e a direita conservadora é a prova que
faltava de que as ideologias morreram, como também pode demonstrar que as
elites portuguesas olharão sempre para o Estado como uma última solução para
todos os problemas do mercado.
Pela nossa
história, tendo mais para a segunda opção. Aliás, são poucos os problemas do
mercado que não têm de ser obrigatoriamente resolvidos pelo Estado. O mercado é
imperfeito e todos os contribuintes têm de financiar a solução para essas
imperfeições - eis todo um programa económico das elites que explica
parcialmente o nosso défice orçamental e também a famosa dívida pública.
Parte da origem
do actual problema da Portugal Telecom reside na gestão de Zeinal Bava e de
Henrique Granadeiro, que venderam aos accionistas a ilusão de que a PT seria um
parceiro activo no controlo da nova empresa que nasceria da fusão Oi/PT, até
pelo know-how que transferiu. A PT afinal não era um peso-pesado, mas sim um
peixinho que foi engolido por um tubarão.
A outra parte do
problema é o dogma que as nossas elites (e aqui Francisco Louçã está fora) nos
venderam como a solução para todos os problemas de Portugal: a União Europeia
(UE). O negócio da integração europeia sempre foi bastante simples: em troca
dos fundos europeus, Portugal tinha de abrir o mercado aos capitais, empresas e
produtos, em nome do mercado único e da livre circulação de pessoas,
mercadorias e capitais. Foram esses princípios que levaram Portugal a terminar
com as golden shares na PT, na EDP, na Galp e noutras empresas estruturantes da
nossa economia, depois de várias acções judiciais perdidas no Tribunal de
Justiça da UE. No caso da PT isso aconteceu no dia 26 de Julho de 2011 após o
acordo com a troika, a qual integrava o Banco Central Europeu e a Comissão
Europeia.
Nenhum mal viria
ao mundo se todos os estados-membros seguissem as mesmas regras - o que
naturalmente não acontece. Na mesma altura em que terminou a golden share na PT
ainda existiam idênticas acções especiais públicas na Volkswagen (Alemanha), na
BAE Systems e na Rolls Royce (Reino Unido), na Repsol, na Telefónica, na
Argentaria, na Tabacalera e na Endesa (Espanha), entre outras. Com mais força,
Alemanha, Reino Unido e Espanha conseguiram resistir e encontraram outras
soluções para um problema que Portugal não conseguiu contornar devido ao
resgate da troika. A Itália ou a França, o país da Altice (a operadora que quer
comprar a PT), por seu lado, têm um sector público empresarial com forte
presença em áreas estratégicas: construção automóvel, energia, defesa, etc. Ainda
este ano o Estado francês, por exemplo, entrou no capital da construtora
automóvel PSA (Peugeot e Citroën) juntamente com os chineses Dongfeng Motor
Group. Obviamente, tal acção não significa nenhuma distorção do mercado.
Chegados aqui
temos de perguntar aos subscritores do manifesto como resgatar a PT. Nacionalizando?
Comprando a participação da Oi? Ou pura e simplesmente impedindo a venda? Nenhuma
destas perguntas tem resposta positiva. O Estado não tem dinheiro para pagar
uma indemnização justa pela nacionalização ou financiar a aquisição nem nenhuma
razão de boa-fé para impedir a venda. As empresas e os bancos portugueses, por
outro lado, estão descapitalizados e não têm condições para concorrer com a
Altice e outros concorrentes. É uma realidade infeliz, sim, mas não há
intervenção pública que possa escondê-la. Sob pena de nos sair ainda mais caro
no futuro.
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