quarta-feira, 31 de julho de 2019

Estado contratou o pai, a mãe e o irmão da ministra da Cultura / Ministra foi discursar à Santa Casa um dia depois da sua empresa assinar contrato



Estado contratou o pai, a mãe e o irmão da ministra da Cultura

13:10 por Marco Alves
Câmara de Lisboa (PS) e Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (tutelada pelo Governo) contrataram empresas detidas a 100% pela família direta de Graça Fonseca (Cultura). Gastaram €177.845 em ajustes diretos.

O registo de interesses de Graça Fonseca está à partida correto. Nele, a ministra da Cultura refere que tem participação no capital social de duas empresas: A Joule Internacional Serviços de Engenharia e a Joule Projetos, Estudos e Coordenação. Em ambas, a sua quota é de 8 por cento. No primeiro caso isso materializa-se em €80 num capital social de €1.000. No segundo caso, €4.000 em €50.000.

Segundo a Lei das Incompatibilidades dos Titulares de Cargos Políticos e Altos Cargos Públicos, de 2011, as duas empresas podem concorrer a concursos públicos porque o "titular de órgão de soberania ou titular de cargo político, ou por alto cargo público", neste caso a ministra Graça Fonseca, não tem mais de 10 por cento das mesmas.

Esta determinação da lei surge no nº1 do artigo 8º. O problema – para este caso de Graça Fonseca - é o que vem escrito no nº2. Diz o articulado que essa proibição estende-se a "empresas de cujo capital, em igual percentagem, seja titular o seu cônjuge, não separado de pessoas e bens, os seus ascendentes e descendentes em qualquer grau e os colaterais até ao 2.º grau, bem como aquele que com ele viva nas condições do artigo 2020.º do Código Civil [união de facto]".

Neste caso, apurou a SÁBADO junto do Portal da Justiça, as duas empresas são totalmente detidas pelo pai, pela mãe e pelo irmão da ministra – além da própria. Assim, a Joule Internacional Serviços de Engenharia tem como acionistas Luís Miguel da Fonseca Caetano Gonçalves (o irmão da ministra, com 70%), João Fernando Caetano Gonçalves (o pai da ministra, 22%) e Graça Maria da Fonseca Caetano Gonçalves (a ministra, 8%).

Quanto à Joule Projetos, Estudos e Coordenação, é detida pelos já referidos pai e irmão da ministra (38% e 16% respetivamente), mais a ministra (8%) e a sua mãe (Isabel Maria Gonçalves Fonseca Alves Caetano Gonçalves, com 38%).

As duas empresas estão ligadas à engenharia eletrotécnica. O pai e o irmão da ministra são engenheiros. A ministra é socióloga. O grau de parentesco dos acionistas destas empresas foi confirmado à SÁBADO pelo patriarca da família, João, quando ligámos para uma das firmas.

Não haveria questõs se as duas empresas não tivessem concorrido a "concursos de fornecimento de bens ou serviços, no exercício de atividade de comércio ou indústria, em contratos com o Estado e demais pessoas coletivas públicas", como diz a lei.

Mas as duas Joules têm cinco contratos contraído com o estado pelo menos desde 2016 (em 2015 Graça Fonseca tomou posse como Secretária de Estado Adjunta e da Modernização Administrativa, ou seja, tornou-se titular de órgão de soberania). Esta é a questão que está a pôr em causa o secretário de Estado da Proteção Civil (ver caixa).

Nestes três anos, os cinco contratos totalizaram €144.590 (ou, com IVA, €177.845). Todos os contratos foram por ajuste direto e a apenas duas entidades: a Câmara Municipal de Lisboa (CML; presidida pelo socialista Fernando Medina, antigo nº2 de António Costa) e a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML; pessoa coletiva de direito privado e utilidade pública administrativa, sendo tutelada pelo Governo).

A Joule Projetos, Estudos e Coordenação tem dois ajustes diretos com a SCML, em 2016 e 2017, para "serviços de elaboração dos projetos de especialidade para a reabilitação do Palácio de São Roque", onde será feito um museu. Preços: €72.700 e €29.500 sem IVA. Houve ainda um terceiro contrato, em 2018, com a CML, em 2018, de €2.800, sem IVA, para um pequeno trabalho no denominado Complexo dos Olivais II.

Segundo o Informa D&B, esta empresa aumentou as vendas duas vezes e meia desde 2016. Nesse ano foi de €136.419. Em 2018, €350.210. Criada em 1982, tem oito empregados.

Quanto à Joule Internacional, é de 2011, tem um empregado e uma faturação a crescer de €11.885 em 2016 para €29.194 em 2018. Nesse ano de 2018, grande parte da receita veio de um contrato apenas, no caso com a CML no valor de €19.990, sem IVA. Trata-se de um ajuste direto para um sérvio de consultoria em engenharia no âmbito do programa "Renda Acessível".

O segundo contrato é já de março de 2019, no valor de €19.600, mais IVA. Desta vez é a SCML e o contrato refere apenas "prestação de serviços para a elaboração dos projetos de especialidades da Concept Store Jogos Santa Casa, sita na Rua Alexandre Herculano, 16, em Lisboa".

Antes de se ministra e secretária de Estado, Graça Fonseca foi deputada do PS durante três dias, em 2015, vereadora na CML (de 2009 e 2015, no mandato de António Costa) e chefe de gabinete do ministro de Costa no governo de Sócrates que durou de 2005-2008.

É de 2007 a criação do Parque Escolar, um projeto de modernização das escolas públicas. Em 2010, a Joule Projetos, Estudos e Coordenação ganhou quatro concursos da Parque Escolar, num total de €595 mil


Ministra foi discursar à Santa Casa um dia depois da sua empresa assinar contrato


31.07.2019 15:31 por Marco Alves

A 21 de fevereiro, Graça Fonseca foi a estrela de uma iniciativa da SCML. Na véspera, a empresa detida pelo pai, irmão e ela própria assinou ajuste direto de €24 mil para 65 dias com a mesma entidade

Dos cinco contratos por ajuste direto (desde 2016) celebrados pelas empresas detidas pelo clã Graça Fonseca (o pai, a mãe, o irmão e a própria ministra), três foram com a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa.

A relação da ministra da Cultura (que antes deste cargo foi Secretária de Estado Adjunta e da Modernização Administrativa) com a Santa Casa é profícua, tendo Graça Fonseca participado em vários eventos da instituição. Há notícias (e fotos, de que reproduzimos algumas) de encontros e eventos realizados a 13 de dezembro de 2017, 10 de abril de 2018, 1 de outubro de 2018, 10 de dezembro de 2018, 15 de fevereiro de 2019 e 21 de fevereiro de 2019.

Foi assim que SCML descreveu o evento: "A Casa do Impacto recebeu esta quinta-feira, 21 de fevereiro, a ministra da Cultura, Graça Fonseca, para mais uma quinta-feira com impacto. Para a ministra da Cultura, esta iniciativa é de louvar porque significa que há 'uma forma diferente de nos posicionarmos no âmbito das políticas sociais, que já não são hoje em dia meramente assistencialistas' e que a Santa Casa está a dar 'um salto qualitativo, na tendência que se verifica noutros países da Europa e não só, de passar para uma lógica mais proativa de projetos de âmbito social'."

Ao laod de Graça Fonseca esteve sempre Edmundo Martinho, provedor da instituição (que é pessoa coletiva de direito privado e utilidade pública administrativa, sendo tutelada pelo Governo).

No dia anterior a este evento, a Joule Internacional (detida a 70% pelo irmão da ministra, Luís Caetano Gonçalves, a 22% pelo seu pai, João, e a 8% pela própria), assinou um contrato com SCML para "elaboração dos projetos de especialidades da ""ConcepStore Jogos Santa Casa"" sita na Rua Alexandre Herculano, 16, em Lisboa."

Preço: €24.108 já com IVA. Prazo: 65 dias.

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