Especial por:
Nuno André Martins
Reviravolta em Bruxelas permite acordo. Mas a que custo?
7:00
Uma Europa partida ao meio, futuros alargamentos em risco,
famílias políticas europeias divididas e a morte do spitzenkandidaten. Houve
acordo, mas a que custo?
Numa autêntica reviravolta em Bruxelas, o Conselho Europeu
chegou a acordo sobre quem serão os futuros líderes das instituições europeias,
deixando de fora aqueles que foram os candidatos à Comissão Europeia pelas
principais famílias políticas europeias. A alemã nascida na Bélgica Ursula van
der Leyen é a candidata a nova presidente da Comissão Europeia; Christine
Lagarde a nova presidente do Banco Central Europeu; o belga Charles Michel está
escolhido para presidente do Conselho Europeu. Mas as negociações expuseram uma
Europa cada vez mais fragmentada, com divisões entre Europa ocidental e o bloco
de leste, entre as diferentes famílias políticas e entre o principal motor das
decisões na Europa, o eixo franco-alemão. A maior vitória é a do
primeiro-ministro espanhol, Pedro Sanchéz.
Chegar a um acordo em Bruxelas nunca é fácil, muito menos
rápido. Desta vez não foi diferente e os líderes conseguiram quebrar mais um
recorde, o da mais longa cimeira do Conselho Europeu de sempre, mais longa até
do que a que ocorreu em julho de 2015 e quase culminou com a saída da Grécia do
euro.
O acordo agora alcançado permite uma saída (mais ou menos)
airosa para os dois principais países da União Europeia e tentam agradar às
principais famílias políticas. Ursula van der Leyen será a sucessora de
Jean-Claude Juncker. A médica alemã é atualmente ministra da Defesa da Alemanha,
a primeira mulher neste cargo, defensora de um exército comum europeu e uma das
vozes que insurgiu contra a equiparação dos refugidos a terroristas.
Ursula van der Leyen nasceu na Bélgica, fala fluentemente
francês, algo que agrada a Emmanuel Macron, e foi um nome que surgiu como forma
de compromisso, que daria à Alemanha e ao Partido Popular Europeu a presidência
da Comissão Europeia, afastando Manfred Weber, que tinha uma grande oposição
desde França, aos socialistas e liberais, passando ainda por alguns membros dos
países de centro e leste da Europa, entre eles o primeiro-ministro da Hungria,
Viktor Órban.
A morte anunciada do processo do spitzenkandidaten
O sistema criado em que as principais famílias políticas
europeias escolhem um cabeça-de-lista para ser candidato à Comissão Europeia —
os chamados spitzenkandidaten — só resultou uma vez, em 2014, quando
Jean-Claude Juncker foi eleito, e pode ter sofrido o seu golpe mortal esta
terça-feira.
O primeiro derrotado, logo no final da noite eleitoral, foi
o alemão Manfred Weber, cabeça-de-lista pelo Partido Popular Europeu (PPE), a
família política europeia que voltou a ser a que mais eurodeputados irá ter no
Parlamento Europeu, embora perdendo força. A oposição firme do presidente
francês, Emmanuel Macron, à nomeação de Manfred Weber, foi da falta de
experiência governativa do alemão à necessidade de dar aos liberais mais
destaque nos cargos de topo da Europa, até ao facto do alemão não falar francês
fluentemente.
A morte de Weber estava mais que anunciada, mas foi
reforçada com a oposição dos socialistas, dos liberais e até de alguns países a
leste, acabando por não ser uma real opção.
O segundo derrotado é o cabeça-de-lista dos socialistas, o
holandês Frans Timmermans. O diplomata poliglota (fala sete línguas
fluentemente, incluindo russo, e ainda ‘arranha’ espanhol) tentou juntamente
com António Costa e Pedro Sanchéz criar uma espécie de geringonça à escala
europeia e até esteve perto de conseguir, com os principais líderes da União
Europeia a acertarem um acordo à margem da reunião do G20 em Osaka, no Japão,
que o colocaria como presidente da Comissão Europeia, e Manfred Weber na
presidência do Parlamento Europeu.
Frans Timmermans esteve quase, quase, de acordo com alguns
líderes, mas não conseguiu a Comissão Europeia por oposição dos países mais a
leste, de alguns membros do PPE e da Itália.
Se a Manfred Weber lhe faltava experiência executiva, a
FransTimmermans foi a sua experiência que o prejudicou. O até agora primeiro
vice-presidente da Comissão Europeia, número dois de Jean-Claude Juncker,
acabou por ser bloqueado por pelo menos dez países (apesar de não ter havido
uma votação), com a maior oposição a surgir do grupo de Visegrado — Polónia,
Hungria, República Checa e Eslováquia. Em causa as disputas criadas devido à
aplicação da lei europeia e dos princípios da União Europeia, em especial na
Polónia e na Hungria (mas também na Roménia). Timmermans chegou a acusar o
primeiro-ministro da Hungria, Viktor Órban, de operar um serviço de táxis diplomático
para criminosos, devido ao asilo político dado ao presidente da Macedónia.
Também a Itália, um dos maiores países da União Europeia e
cujo Governo está atualmente desalinhado das principais famílias políticas
europeias, demonstrou a sua forte oposição à solução Timmermans. O
primeiro-ministro Giuseppe Conte disse que o problema era o pacote, mas o
ministro do Interior (um dos líderes da coligação), Matteo Salvini, disse que
não aceitaria um socialista na presidência da Comissão Europeia.
Já a liberal dinamarquesa Margrethe Vestager, que antes e
após as eleições era apontada como a solução de compromisso e que até era vista
com bons olhos por Angela Merkel, mal chegou a ser hipótese. De acordo com o
primeiro-ministro da República Checa, a solução Vestager foi logo afastada
pelos líderes por não ter votos suficientes no Parlamento Europeu que
permitissem a sua nomeação (o presidente da Comissão tem de ser aprovado por
maioria absoluta em Estrasburgo).
Timmermans e Vestager ainda terão direito às vice-presidências
mais importantes da União Europeia. Manfred Weber nem isso.
Uma Europa partida ao meio
Há muito que os países do centro e leste da Europa têm vindo
a exigir maior representatividade na estrutura superior da União Europeia, mas
desta vez estiveram mais alinhados que os restantes e, beneficiando da divisão
dentro do PPE e do apoio de Itália, conseguiram bloquear quase todas as
escolhas.
O mais visível foi o grupo de Visegrado, que integra
Polónia, Hungria, República Checa e Eslováquia. Apesar de cada um destes
pertencer a uma família política europeia diferente, o grupo esteve alinhado e
bloqueou de forma implacável a nomeação de Frans Timmermans. Para estes
primeiros-ministros, o socialista não era o líder ideal porque a Comissão
precisava de alguém que não tenha uma visão negativa dos países mais a leste.
O grupo de Visegrado: Peter Pellegrini, primeiro-ministro da
Eslováquia, Andrej Babis, primeiro-ministro da República Checa, Mateusz
Morawiecki, primeiro-ministro da Polónia, e Viktor Órban, primeiro-ministro da
Hungria.
Mas o grupo de Visegrado não foi o único a impedir a
nomeação de Timmermans. O primeiro-ministro da Lituânia pediu caras novas e
defendeu que o sistema do spitzenkandidaten estava morto. O primeiro-ministro
da Bulgária até sugeriu o seu homólogo croata para a liderança da Comissão
Europeia, que por sua vez também estava contra a nomeação de Timmermans.
A força de bloqueio que veio do leste não só impediu a
nomeação de Frans Timmermans como deixou alguns líderes mais a oeste irritados.
Emmanuel Macron foi um dos mais frustrados, e disse mesmo que este caso
demonstrava que o processo de adesão à União Europeia de países mais a leste
deve ser repensado. O primeiro-ministro holandês disse o mesmo. Pedro Sanchéz e
António Costa queixaram-se do bloqueio por parte destes países à solução que
tinham cozinhado. O primeiro-ministro português juntou a Itália a este grupo,
que disse mesmo ser a líder da força de bloqueio.
Angela Merkel. O fim de uma era?
Desde as eleições legislativas alemãs do final de 2017 que a
chanceler alemã tem vindo a perder força, internamente e na Europa. O fraco
resultado eleitoral da CDU/CSU levou Angela Merkel a prometer que não se irá
recandidatar em 2021, altura em que termina o atual mandato. Quando tomou a
decisão de abrir as fronteiras sem limite aos refugiados da Síria e do Iraque,
aquela que foi apelidada de ‘Rainha da Europa’, ganhou muitos fãs dentro da
União, mas também uma grande oposição interna.
A chanceler tem feito dançar ao seu ritmo o grupo dos
líderes de governo do PPE no Conselho Europeu e ainda mais alguns liberais,
tendo desenvolvido as maiores decisões europeias em conjunto com os vários
presidentes de França desde que chegou ao poder, em 2005, acabando por garantir
que os restantes líderes estão alinhados e seguem as suas orientações.
A chanceler alemã, Angela Merkel, consegue que seja escolhida
para a presidência da Comissão Europeia um membro do PPE e alemão, a sua
ministra da Defesa Ursula von der Leyen.
Mas desta vez a história foi diferente. Começou por defender
que deveria se um dos membros do PPE, como partido vencedor das europeias e com
mais líderes no Conselho Europeu, a suceder a Jean-Claude Juncker na Comissão
Europeia. Mas o volte-face acontecido em Osaka, em que alinhou com Emmanuel
Macron, Mark Rutte e Pedro Sanchéz, para dar a presidência ao socialista Frans
Timmermans, não caiu bem entre os chefes de Estado e de Governo do PPE.
Irlanda, Bulgária, Lituânia, Croácia e Chipre não alinharam com Angela Merkel e
foram suficientes para bloquear as intenções de Angela Merkel.
Se é verdade que o compromisso final está longe dos (muitos)
planos iniciais, também é que as cedências de Angela Merkel caem quase todas a
seu favor. A chanceler alemã consegue que seja escolhida para a presidência da
Comissão Europeia um membro do PPE e alemão, a sua ministra da Defesa Ursula
von der Leyen, em tempos apontada como sua sucessora. Para a presidência do
Banco Central Europeu, Angela Merkel também escolhe uma velha conhecida sua — e
uma hipótese que lhe agrada –, a francesa Christine Largarde, atualmente
diretora-geral do FMI.
Pode ser a última grande decisão de Angela Merkel na União
Europeia e o seu poder pode parecer diminuído, especialmente entre os seus
pares do PPE, mas a solução está longe de ser negativa para a ‘Rainha da
Europa’.
Espanha “está de volta”, capitaliza Brexit e isolamento de
Itália… mas esquece-se de António Costa
Durante muitos anos, a quarta maior economia da Zona Euro
reclamou para si mais destaque, cargos de topo na União Europeia e relevância
política. Durante muitos anos foi ignorada pelos líderes europeus, como aconteceu
quando, por duas vezes, o PP espanhol tentou colocar Luis de Guindos na
presidência da Eurogrupo. Mas o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sanchéz, não
deixou passar a oportunidade de colocar Espanha no mapa das decisões europeias
como não acontecia até aqui.
Espanha está de volta e creio que está de volta em força.
Pedro Sanchéz, primeiro-ministro de Espanha
Foi o líder efetivo das negociações pelos socialistas
europeus — acompanhado de António Costa –, foi um dos líderes que fechou o
acordo de Osaka e tem sido constantemente a terceira perna do eixo
franco-alemão. Na maior parte das negociações que envolveram Angela Merkel e
Emmanuel Macron, juntamente com o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk,
Pedro Sanchéz aparece na fotografia.
A saída do Reino Unido da União Europeia e o isolamento
escolhido pelo novo Governo italiano deu a Pedro Sanchéz o protagonismo que
Espanha vinha a exigir há muitos anos e ainda lhe valeu a nomeação de Josep
Borrell, o seu ministro dos Negócios Estrangeiros, para a cargo de Alto
Representante da União Europeia para a Política Externa, que era a sua
preferência desde o início, com um cargo reforçado duplamente: não só acumula
os Assuntos Humanitários, como a pasta relativa à politica de recursos e ajuda
ao desenvolvimento de África.
“Espanha está de volta e creio que está de volta em força”,
disse o primeiro-ministro espanhol na conferência de imprensa após a reunião do
Conselho Europeu, onde ainda se congratulou por ser o principal negociador
pelos socialistas europeus neste processo… esquecendo-se do primeiro-ministro
português António Costa, o outro negociador da equipa.
Já Itália, depois de um período em que deteve a presidência
do Banco Central Europeu (termina em outubro), do Parlamento Europeu e Alta
Representante para a Política Externa da União Europeia, vai ficar sem um único
cargo de topo na Europa. Em Itália, o Governo tem exigido uma pasta forte, como
a dos Assuntos Económicos, mas dificilmente terá sorte, mais ainda considerando
que foi apontada por vários líderes como uma das principais forças de bloqueio.
Será também a primeira vez que Itália não terá um representante na comissão
executiva do BCE, desde que a criação do euro. Resta saber se ainda tem
hipótese de reter o Parlamento Europeu…
O enfraquecimento do Partido Popular Europeu e o passo em
falso dos liberais
As eleições europeias resultaram num Parlamento Europeu mais
fragmentado, com o centro-direita (PPE) e o centro-esquerda (S&D) a
perderem força, enquanto os liberais (ALDE) e os Verdes ganharam mais
eurodeputados. O PPE continua a ser ainda assim a família política com mais
eurodeputados. Os liberais ganharam força também por via da junção do novo
partido de Emmanuel Macron.
O Parlamento Europeu só iniciou a próxima legislatura esta
terça-feira, mas esta nova configuração já está a trazer os seus desafios. O
PPE tenta agarrar-se ao resultado eleitoral para garantir que ainda é quem
manda mais na Europa — tem ocupado quase todos os cargos de topo na União
Europeia — e feito finca-pé por Manfred Weber, um candidato que desde o
primeiro momento se percebeu que tinha quase zero hipótese de chegar à liderança
do Executivo europeu.
Mas não é só no Parlamento Europeu que o PPE tem tido esta
posição. No Conselho Europeu, os líderes europeus não quiseram ceder ao acordo
de Merkel com Macron, Rutte e Sanchéz, e têm dificultado o acordo ao ponto de o
primeiro-ministro do Luxemburgo, Xavier Bettel, ter dito na manhã desta
terça-feira que esperava que os líderes do PPE tivessem “reiniciado o sistema”.
Do lado dos liberais, o terceiro partido com mais votos —
mas que será quem perde mais eurodeputados com a saída do Reino Unido da União
Europeia — e o segundo mais representado no Conselho Europeu, a expectativa é
que pudesse ter chegado finalmente a altura de controlar um dos principais
cargos da União Europeia. Com Macron na frente desta tentativa de afastar o PPE
do poder, criando uma ‘eurogeringonça’ com os socialistas, chegaram a aspirar a
isso mesmo, mas sem sucesso. Ainda assim, terminam este processo com uma
(pequena) vitória: Charles Michel, primeiro-ministro interino da Bélgica, será
o próximo líder do Conselho Europeu.
Nuno André Martins
Jornalista
Parlamento Europeu ameaça travar nomeação de Ursula von der
Leyen
Líderes europeus atiram para o lixo sistema dos cabeças de
lista e arriscam confronto com os eurodeputados ao nomear a ministra alemã para
a presidência da Comissão.
Rita Siza
Rita Siza Bruxelas 2 de Julho de 2019, 21:33
Jean-Claude Juncker já dizia adeus esta terça-feira, escolhida
que está a sua sucessora. Isto se o PE não chumbar o acordo GEOFFROY VAN DER
HASSELT/EPA
A ministra da Defesa da Alemanha, Ursula Von der Leyen, é a
aposta dos líderes europeus para suceder a Jean-Claude Juncker na chefia do
executivo comunitário. Numa reviravolta surpreendente engendrada pela chanceler
alemã, Angela Merkel, para desbloquear o processo negocial para a distribuição
dos cargos de topo das instituições comunitárias, os 28 chefes de Estado e de
governo da União Europeia aceitaram fazer tábua rasa das posições defendidas
até aqui e numa penada deitaram fora todos os cabeças de lista que se
apresentaram nas eleições europeias.
Foi uma jogada arriscada e que não oferece totais garantias
de vir a ser bem-sucedida. Do Parlamento Europeu (PE), que terá agora de votar
a nomeação de Von der Leyen, vieram imediatamente críticas à solução. “Espero
que o Conselho não tenha subavaliado a importância do PE e a sua capacidade de
decisão”, afirmou o primeiro-ministro, António Costa, que votou a favor do
compromisso.
“Não sou profeta e
não me compete a mim avaliar as reais hipóteses de sucesso [deste acordo] no
Parlamento. Penso que os primeiros-ministros farão tudo para convencer os
colegas no PE a aprovar a solução”, declarou o presidente do Conselho Europeu,
Donald Tusk, cuja condução das negociações foi muito criticada pelos líderes.
Muitos eurodeputados, com os socialistas do alemão SPD à
cabeça, insurgiram-se contra o acordo, por este desrespeitar o sistema de
escolha de um dos Spitzenkandidaten. Esta oposição levou, aliás, a que a
Alemanha tivesse sido o único país a se abster na votação do Conselho: Angela
Merkel não podia endossar uma proposta que não tem o apoio do outro partido da
coligação.
“Foi muito claro no Conselho que o sistema dos
Spitzenkandidaten não era uma obrigação legal que tivesse de ser cumprida.
Mesmo assim, penso que o resultado final é uma demonstração que os lideres
quiseram respeitar tanto os cabeças de lista como o próprio mecanismo”,
justificou Tusk.
O impasse que se prolongou por três dias de cimeira
extraordinária em Bruxelas foi vencido com base na proposta desenhada pela
líder alemã para vencer a minoria de bloqueio constituída pelos países do grupo
de Visegrado e alguns líderes conservadores do PPE (Croácia, Irlanda, Letónia e
Roménia), que se juntaram numa frente comum de bloqueio ao chamado “acordo de
Osaca” que esteve em cima da mesa e acabou por ser retirado da discussão pelo
presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, ao fim de 18 horas de negociação
inconclusiva.
A chanceler prescindiu da nomeação de um dos
Spitzenkandidaten para a presidência da Comissão e assim conseguiu manter o
executivo comunitário nas mãos do PPE. Depois de muito se ter dito sobre uma
eventual transferência de poder do centro-direita para o centro-esquerda,
Merkel ultrapassou a concorrência socialista e assegurou que a sua família
política continuará a dominar o xadrez comunitário.
O compromisso funcionou porque a moeda de troca nas
negociações exigida pelo Presidente francês, Emmanuel Macron, lhe foi
garantida: a francesa Christine Lagarde, actual directora do Fundo Monetário
Internacional, será a próxima presidente do Banco Central Europeu e responsável
pela política monetária da União. Os líderes tinham dito que a indicação do
sucessor de Mario Draghi não faria parte deste pacote global de nomeações, uma
vez que a selecção do presidente do banco central assenta em critérios mais
técnicos do que políticos. Mas, para garantir o apoio da França, e também para
que os líderes pudessem cumprir a sua promessa de promoção da igualdade de
género, o nome de Lagarde foi incluído na solução de compromisso: pela primeira
vez na história, haverá duas mulheres à frente de instituições comunitárias.
Os liberais, que ao lado dos socialistas viram no resultado
das eleições europeias uma oportunidade de ouro para quebrar o domínio do PPE e
se projectarem para os lugares cimeiros das instituições europeias, podem
festejar a indicação de Charles Michel para a presidência do Conselho Europeu.
O primeiro-ministro belga, que se encontra em funções desde Dezembro quando o
partido nacionalista flamengo NVA fez colapsar a coligação de Governo,
comprometeu-se a “respeitar a diversidade nacional” e a fazer valer os
princípios de solidariedade, liberdade e respeito mútuo” em que assenta a União
Europeia,
Já os socialistas tiveram de se resignar com a manutenção
dos mesmos cargos que lhes foram atribuídos em 2014: a presidência do PE e o
Alto Representante da União Europeia para a Segurança e Política Externa. O
ministro dos Negócios Estrangeiros de Espanha, Josep Borrell, foi o homem
escolhido para o cargo. Quanto ao nome para o PE, terá agora de ser indicado
pelo grupo dos Socialistas & Democratas, no pressuposto de que obterá os
votos necessários das outras bancadas para alcançar a maioria necessária para
ser eleito.
Depois de quase terem conseguido concretizar a sua ambição
de regressar à liderança do executivo comunitário, com a nomeação do holandês
Frans Timmermans, o desfecho não pode ser apresentado como uma vitória para os
socialistas. António Costa, que foi um dos negociadores da sua família
política, reconheceu que este “não foi o melhor resultado”. Mas destacou a
atitude construtiva e responsável dos socialistas, que confrontados com o
bloqueio dos “países do PPE que são perigosamente permeáveis às pressões e ao
canto de sereia do senhor Salvini e da sua base territorial nos países de
Visegrado”, privilegiaram o compromisso que evita a paralisia institucional e
“permite à Europa seguir em frente”. “Imitar minorias de bloqueio é a pior
forma de as combater”, afirmou.
O compromisso inclui um prémio de consolação para
Timmermans, que cumprirá um segundo mandato como primeiro vice-presidente da
Comissão Europeia, e também para a cabeça de lista dos liberais, a dinamarquesa
Margrethe Vestager, que deixará a pasta da Concorrência e será promovida a
vice-presidente. Os dois pertencem a partidos que não estão no governo nos
respectivos países, mas os líderes nacionais confirmaram que os vão indicar
para o executivo comunitário.
Já o cabeça de lista do PPE, Manfred Weber, terá a
possibilidade de ser eleito presidente do PE na segunda metade da legislatura.
O eurodeputado alemão, que foi reeleito líder da bancada dos
democratas-cristãos no Parlamento Europeu, anunciou o fim da sua jornada como
Spitzenkandidat.
Os países do grupo de Visegrado e os membros do PPE que
ensaiaram uma revolta contra Merkel para travar a nomeação de Timmermans para a
Comissão saíram vencedores no braço de ferro que mantiveram com a chanceler
alemã e o Presidente francêsde França, Emmanuel Macron. Conseguiram arrasar com
o chamado “acordo de Osaca”, que punha fim ao domínio do centro-direita no
executivo comunitário, e ainda recolheram louros por fazer aprovar o plano B
que elevou Von der Leyen à presidência da Comissão.
Aliás, através do seu porta-voz, o primeiro-ministro da
Hungria, Viktor Orbán, reclamou a autoria dessa solução. “Na sua unidade, o
grupo de Visegrado demonstrou mais uma vez a sua crescente força e influência
sobre a direcção da UE. Depois de derrotarem Weber, os quatro países eliminaram
Timmermans e puseram em cima da mesa um pacote para a eleição de Ursula Von der
Leyen que pode ser aceite por todos”, escreveu Zoltan Kovacs no Twitter.
“Manifestamente não é verdade”, desmentiu António Costa.
tp.ocilbup@azis.atir
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