OPINIÃO
Ziguezagues nas
subvenções vitalícias
Ricardo Sant'Ana
Moreira, Investigador em Trabalho e Segurança Social 29 Julho 2019, 00:08
Não divulgar a
lista destas pensões douradas, que representam um gasto anual de sete milhões
de euros para os cofres públicos, seria proteger o privilégio.
António Vitorino,
Ferreira do Amaral, Armando Vara, Rui Gomes da Silva, Zita Seabra, Maria de
Belém e Dias Loureiro são alguns dos nomes que fazem parte da lista de
políticos que recebem subvenções vitalícias, um privilégio sem sentido que
vigorou entre 1985 e 2005.
As subvenções
vitalícias dos políticos terminaram em 2005. Em 2004 o Bloco de Esquerda
apresentou o primeiro projeto de lei sobre a matéria, que nunca foi votado
porque o governo de Pedro Santana Lopes caiu antes da votação. Em 2005 o Bloco
voltou a apresentar essa proposta, a que se juntou outra do PCP; ambas foram
chumbadas por PS e PSD. Nuno Melo justificou a abstenção do CDS da altura
dizendo: “a composição parlamentar futura será feita por quem queira ser
deputado ou político, mas só a preço de saldo ou estando disposto a ser
enxovalhado!”.
Em 2005 o governo
PS apresentou uma proposta de lei ao parlamento que foi apoiada por todos os
partidos, exceto o CDS que se voltou a abster. Apesar da aprovação, a proposta
foi alvo de críticas, porque os antigos deputados puderam continuar a acumular
a subvenção vitalícia com outros rendimentos. Zigue…
A meio do governo
da austeridade de Passos Coelho e Paulo Portas foi anunciado um corte em
algumas das mais de 400 subvenções de políticos para mostrar que eram tão
afetados pelos cortes como os trabalhadores. Nessa altura houve partidos a
propor o corte total das subvenções, mas a ideia não vingou. Zague…
Em 2015 um grupo
de deputados do PS e do PSD encabeçados por José Lello e Couto dos Santos
tentou repor o pagamento integral das subvenções vitalícias ainda a pagamento.
Se a austeridade já tinha passado, então o seu privilégio devia ser reposto.
Felizmente, Bloco de Esquerda e PCP manifestaram a sua oposição e houve um voto
separado da matéria tendo chumbado. Zigue…
Em plena campanha
eleitoral para as presidenciais, o Tribunal Constitucional pronunciou-se sobre
um pedido de 30 ex-deputados para a reposição dos cortes. Foi com espanto que o
país recebeu a notícia de que os cortes parciais nos privilégios dos políticos
eram inconstitucionais, mas que os cortes nos salários e pensões eram legais.
Maria de Belém, candidata de parte do PS e uma dos proponentes da queixa, disse
na altura “não abdicar de nenhum direito”, e foi a gota de água que fez
implodir a sua campanha. Zague…
Já em 2018
soube-se que o Governo tinha decidido ocultar a lista de subvenções vitalícias,
sob o pretexto de que a sua divulgação seria ilegal à luz do Regulamento de
Proteção de Dados. O problema é que o ministério de Vieira da Silva não tinha
consultado a Comissão Nacional de Proteção de Dados. A bola ficou então do lado
da Assembleia da República para alterar a lei de forma a que a publicação da
lista fosse obrigatória. Apesar de Bloco de Esquerda e PCP terem defendido a
sua divulgação, a Assembleia da República não alterou a lei. O privilégio ia
ficar escondido. Zigue…
Agora, o Governo
foi obrigado a recuar e decidiu alterar a lei que disse que não podia para
poder publicar a lista das pensões douradas dos políticos. Zague…
Os nomes dos
políticos que ainda recebem subvenções vitalícias são dados de interesse
público, isso mesmo foi esclarecido pela Comissão de Acesso aos Documentos
Administrativos, que deu um parecer positivo à sua divulgação. A transparência
e a democracia exigem que se conheça quem recebe essas pensões douradas, que
representam um gasto anual de sete milhões de euros para os cofres públicos.
Não divulgar a lista seria proteger o privilégio. Esperemos que este seja o
último capítulo desta novela.
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