quinta-feira, 9 de maio de 2019

Biblioteca Palácio Galveias, reabilitada há dois anos por mais de 2 milhões de euros, já tem infiltrações e tectos a cair





Biblioteca Palácio Galveias, reabilitada há dois anos por mais de 2 milhões de euros, já tem infiltrações e tectos a cair
Sofia Cristino
Texto
9 Maio, 2019

Quem entra na principal biblioteca municipal de Lisboa, no Campo Pequeno, duvida que esta foi recentemente requalificada e recebeu a maior fatia do orçamento destinado à renovação da rede de bibliotecas sob gestão camarária. Na escadaria de acesso ao primeiro piso, há infiltrações numa das paredes. Na sala de leitura do piso 1, as pinturas a fresco, no tecto restaurado, também estão a desaparecer. E na passagem do Salão Nobre para o balcão de empréstimo, parte do tecto caiu. O piso superior foi precisamente o que reabriu ao público totalmente renovado, em 2017, aumentando o espaço da biblioteca, mas é onde se concentram os sinais de deterioração mais visíveis. No rés-do-chão também se verificam problemas. A casa-de-banho esteve avariada durante dois meses e nas traseiras do elevador do piso 0 existem estuques a cair. O equipamento chega a receber 1600 pessoas por dia e tem o maior acervo das bibliotecas municipais.

A reabilitação da Biblioteca Municipal do Palácio Galveias implicou um investimento total de 2,5 milhões – 1,9 milhões para a requalificação do edifício do século XVII e 600 mil euros para os novos equipamentos e aumento do espaço. O espaço cultural, uma das bibliotecas mais antigas da cidade e elemento central da rede municipal, foi dos que recebeu uma maior fatia do orçamento destinado à requalificação da rede – 1,9 milhões de euros -, em 2015. Um ano e onze meses depois de reabrir portas, em Junho de 2017, renovada e com novos equipamentos, já apresenta, porém, vários sinais de deterioração.

Na escadaria de acesso ao primeiro piso, são bem visíveis as infiltrações numa das paredes e, nas traseiras do elevador do piso 0, também há estuques a cair. Na sala de leitura do piso 1, os frescos no tecto recentemente restaurado também estão a desaparecer. Na passagem do Salão Nobre para um dos balcões de empréstimo, no primeiro piso, junto ao elevador, caiu parte do tecto. Esta zona, habitualmente muito movimentada, esteve vedada, durante três meses, obrigando os utentes, que pretendiam consultar livros só disponíveis aqui, a subirem ao primeiro piso, tendo de descer novamente para solicitarem o empréstimo. A biblioteca reabriu com dois balcões de empréstimo, precisamente para se acabar com as filas para requisitar ou devolver os títulos, mas a interdição desta área trouxe o problema de volta.

Durante os últimos três meses, quem quisesse de ir à casa-de-banho, no piso 1, tinha que descer pelas escadas e voltar a subir, pois não existe uma passagem directa. O corredor, agora, já está desobstruído porque, segundo os técnicos que se deslocaram ao local, já não apresenta perigo para os utilizadores e funcionários da biblioteca. Mas há quem tenha dúvidas e evite passar por lá. Nos três lavatórios localizados no piso 1, só funciona correctamente uma torneira. Uma está avariada e outra jorra água durante mais tempo do que o estipulado pelo sensor, causando um “grande desperdício”, explica um dos utentes da biblioteca, que preferiu manter o anonimato.

Um piso abaixo, na entrada, nas instalações sanitárias, femininas e masculinas, há uma clara degradação das paredes. Na casa-de-banho das mulheres, o tampo de uma das sanitas está no chão, um cabide está estragado e há papéis de limpeza das mãos pousados em cima de outro cabide. Esta casa-de-banho também esteve encerrada, durante dois meses – por causa de problemas nos autoclismos e uma fuga de água -, obrigando as utentes a deslocarem-se ao piso 1, com apenas uma sanita. As duas instalações sanitárias foram reabertas, no final do mês passado, mas, por vezes, ainda avariam.

 No passado dia 28 de Março, o grupo municipal do Partido Ecologista Os Verdes (PEV) enviou um requerimento à Assembleia Municipal de Lisboa (AML) a dar conta das “diversas denúncias” recebidas por munícipes sobre “um conjunto de problemas” e “um novo estado de progressiva degradação” neste equipamento cultural. O PEV pede à AML para averiguar se a Câmara Municipal de Lisboa (CML) reconhece a necessidade de proceder a novas obras, quais as áreas que requerem ser objecto de intervenção, quem as vai executar e qual a duração prevista. O PEV quer saber ainda se o caderno de encargos da obra de requalificação e ampliação do Palácio das Galveias previa algum período de garantia e, se sim, “se a CML vai exercer essa garantia perante o empreiteiro”.

Um mês depois, o grupo municipal do partido Pessoas, Animais e Natureza (PAN) enviou também um requerimento à AML, no qual alerta para as mesmas situações e pede que assembleia solicite à câmara de Lisboa “um esclarecimento escrito” sobre esta situação. “Trata-se de um património histórico, cultural e arquitectónico, que importa preservar e salvaguardar, assim como as condições que são essenciais para o bem-estar das pessoas que lá trabalham e circulam”, reforça o PAN, no documento entregue no passado dia 29 de Abril.

 Desde 2017, quando reabriu, o número de visitantes da Biblioteca Galveias aumentou para o dobro.  Hoje, chega a receber 1600 pessoas por dia, apesar de só ter lugar para 322, uma sobrelotação que já levou os próprios utentes a pedirem uma ampliação do equipamento cultural. Localizada perto de quatro universidades e cinco institutos superiores, recebe vários estudantes e é também a maior biblioteca municipal em termos de acervo. Isto apesar de, na sequência da requalificação feita nas instalações, se ter aproveitado para realizar também uma actualização da colecção, eliminando títulos considerados datados. A Biblioteca Galveias conta agora com 121.500 documentos dos 140 mil de que dispunha antes das obras.

Encerrado para obras de requalificação em Março de 2015 e reaberto, em Junho de 2017, com mais 700 metros quadros, o palácio das Galveias viu assim quase duplicada a sua área total, de 1.300 para 2.150 metros quadrados. A ampliação resultou na abertura ao público do piso superior, onde agora existe uma sala de leitura, uma dedicada às crianças, outra à banda desenhada e salas com computadores e acesso livre à internet. Neste piso, nasceu ainda um espaço “lounge”, munido de poltronas, a funcionar como uma sala polivalente.

 O aumento do espaço disponível culminou com o acréscimo de mais 220 lugares sentados, incluindo os do novo jardim, terraço e sofás do lounge. Nasceram ainda oito salas de estudo com horários alargados, três salas multiusos e uma para acções de formação. Todas as mesas das salas de estudo, onde o mobiliário foi renovado, passaram a estar preparadas para se ligar à corrente computadores, tablets e smartphones. Outra das novidades foi uma máquina de auto-empréstimo de livros, através da qual os utilizadores que têm cartão de leitor da rede municipal podem requisitar ou devolver livros. Os documentos passaram também a estar identificados por radiofrequência, permitindo a inventariação das obras através de um código de barras. Abriu-se ainda ao público uma varanda, com mesas e cadeiras, com vista para um novo quiosque e jardim.

 O Palácio Galveias funciona como biblioteca municipal desde 1931, após ter sido expropriado pela Câmara de Lisboa em 1928. Construído nos finais do século XVII para ser a casa de campo da família Távora, foi-lhe retirada pelo Estado em 1759, na sequência do conhecido “processo dos Távoras” – relacionado com a tentativa de assassinato de Dom José I. Em 1801, o edifício foi adquirido por Dom João de Almada Melo e Castro, 5º conde das Galveias. O palácio é novamente vendido, no final do século XIX, ao capitalista Braz Simões, até ser expropriado pelo município.

 Nos últimos dois mandatos da Câmara de Lisboa já foram aplicados 8,3 milhões de euros na recuperação, renovação e construção de novas bibliotecas. Na altura da reabertura da Biblioteca das Galveias, em Junho de 2017, a vereadora da Cultura da CML, Catarina Vaz Pinto, dizia que esta era “uma biblioteca patrimonial, que se adapta e reinventa para os novos tempos”.

 O Corvo perguntou à Câmara de Lisboa se tinha conhecimento do estado de deterioração da biblioteca e quando planeia intervir para resolver os problemas, mas não recebeu respostas até à publicação deste artigo.

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