Maduro e o “poder absoluto” que aí
vem
A Venezuela está prisioneira de uma facção política que
subverteu as regras para impor a sua vontade sem limites.
NUNO PACHECO
4 de Agosto de 2017, 6:30
O tempo do lirismo acabou. Nicolás Maduro, que num momento
muito grave na Venezuela cantou Imagine, já se deixou de cantigas. Porque o
tempo, para ele e para os seguidores da sua política extremista, é agora de
ajustar contas. Com uma Assembleia Constituinte eleita mas não reconhecida
internacionalmente, vão aumentar de tom os discursos patrióticos para esconder
as ilegalidades cometidas e, sobretudo, para manter coesas as fileiras dos que
acreditam no chavismo como via para salvar o país.
“Sou o Presidente independente de uma nação livre, a
República Bolivariana da Venezuela”, clamou Maduro, num dos seus sonantes
discursos públicos mais recentes. Se não se conhecesse o que lá se passa, a
afirmação podia merecer aplauso: um presidente independente de uma nação livre!
Só que isso é mais uma falácia para iludir os que se deixam iludir, porque a
“nação livre” está prisioneira, não da vontade do seu povo (expressa nas urnas
em finais de 2015, resultando num parlamento representativo das várias
tendências políticas e agora posto em causa), mas apenas de uma facção política
que, incapaz de governar em democracia, subverteu as regras e inventou as
actuais eleições para mudar a estrutura do regime e impor a sua vontade sem
limites.
O próprio Nicolás Maduro não esconde a sua vontade de forçar
tal imposição. Citado pela AFP, afirmou: “Eu lhes digo: chova, ou faça sol, a
Constituinte vai sair. Nas próximas horas, começará a exercer seu poder
absoluto, plenipotenciário.” E as “próximas horas” começam esta sexta-feira,
quando tomará posse a constituinte. Para garantir tal “poder absoluto”, as
forças de segurança do regime começaram ontem a controlar o edifício do
Parlamento, onde o presidente Maduro espera que se dê a troca de uma assembleia
de deputados por outra. Uma “comissão de ligação” garantirá, disse ele, a
transferência “em paz” da sede legislativa entre os deputados em exercício e os
agora eleitos. Isto, que na verdade é um golpe a partir do interior do aparelho
estatal (o que está a tornar-se moda, veja-se o caso do Brasil), significa
substituir um parlamento pluripartidário (onde a oposição, por escolha popular,
tinha maioria) por uma assembleia de devotos de Maduro, saída de umas eleições
sob fortes suspeitas de fraude e nas quais a oposição se recusou a participar.
Maduro, que acusa os deputados da oposição de “terrorismo”, diz aos
recém-eleitos: “Há que fazer justiça, mas isso é tarefa vossa.” Não é preciso
muito para antever o que aí vem.
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