sexta-feira, 4 de agosto de 2017

O arrendamento e a Secretaria de Estado da Habitação


O arrendamento e a Secretaria de Estado da Habitação
A fiscalidade terá de ser um elemento coercivo para provocar o abaixamento das rendas.

ROMÃO LAVADINHO
4 de Agosto de 2017, 6:22

A Associação dos Inquilinos Lisbonenses congratula-se com a constituição da Secretaria de Estado da Habitação, que vem preencher uma lacuna política e orgânica do Governo que, aliás, já vinha de governos anteriores.

Sendo a habitação um direito constitucional, e face à amplitude de aspetos que comporta, desde os solos até à utilização do edificado, passando pelo urbanismo, acessibilidades, equipamentos e serviços, justifica-se ter em permanência um membro do Governo responsável por esta matéria.

Decorrente da reiterada displicência e inação da intervenção pública, da ausência de uma política de habitação, de uma lei base, de uma legislação de arrendamento eficiente, de construção de habitação pública destinada a diferentes segmentos das famílias e de regularização do mercado, resultaram graves problemas, entre outros, o atraso na reabilitação e regeneração urbanas, a excessiva ocupação urbanística de periferias, um mercado de arrendamento habitacional incipiente, insuficiente, desacreditado, sem qualidade e de rendas altas, recentemente agravado pelo desvio de habitações para alojamento turístico.

A oposição da AIL à atual legislação do arrendamento tinha como certo que o resultado da sua aplicação seria exatamente o que veio a verificar no terreno: despejos, rendas altas, retração e desconfiança no mercado de arrendamento.

As ligeiras e insuficientes alterações recentemente aprovadas pela AR limitaram-se a melhor proteger os inquilinos mais idosos e com carência económica, a reduzir a permissividade de despejos por obras e a garantir a continuidade de lojas históricas, as principais vítimas desta diatribe legislativa. São alterações nada transcendentes, ou que coloquem em questão o arrendamento ou justifiquem qualquer alarido. Dos 750.000 arrendamentos existentes, estas alterações aplicam-se a cerca de 10%, com a natural tendência de decrescer.

No imediato impõe-se, com premência, que se tomem medidas de natureza administrativa e fiscal com vista a credibilizar e dinamizar o mercado de arrendamento e que leve ao incentivo da oferta a preço comportável, medidas a serem já introduzidas no Orçamento do Estado para 2018 e em legislação própria que se pretende estável e prolongada. Resumidamente, apresento algumas das medidas preconizadas pela AIL.

No plano administrativo e legislativo será razoável cometer aos municípios a obrigatoriedade do registo prévio de todos os locados destinados ao arrendamento, bem como o registo dos contratos de arrendamento, comunicando estes, automaticamente, à Autoridade Tributária para efeitos fiscais.

Haverá que definir o conceito de renda acessível/convencionada/limitada ou outra designação apropriada, assente num valor máximo determinado por um coeficiente, por exemplo de 1/25, sobre o Valor Patrimonial Tributário (VPT) do locado.

Dinamizar e credibilizar o mercado, estabelecendo o seguro de renda obrigatório para todos os arrendamentos habitacionais, da responsabilidade do senhorio por ser um seguro de crédito, com prémio reduzido atendendo ao seu baixo risco e que não contribua para pressionar as rendas, e um seguro multirriscos, obrigatório e da responsabilidade do arrendatário, com prémio reduzido atendendo também ao seu baixo risco, para cobertura de eventuais danos na habitação provocados por si, eliminando-se de uma vez fianças e outras garantias hoje previstas e cada vez mais difíceis de contratualizar.

No plano fiscal, criar em sede de IRS uma taxa autónoma reduzida, não superior a 10%, para o rendimento das rendas habitacionais praticadas de acordo com o conceito de renda acessível, podendo isentar-se o IMI. Em alternativa, pode-se estabelecer escalões para os rendimentos das rendas, subordinados ao VPT dos locados. No caso de as rendas serem superiores a este conceito, deverá ser aplicada em sede de IRS uma taxa não inferior a 37%, sem direito a qualquer benefício fiscal, independentemente da entidade senhoria.


A fiscalidade terá de ser um elemento coercivo no sentido de provocar o abaixamento das rendas. Não é aceitável premiar fiscalmente as rendas, independentemente do seu valor, alegando-se com a duração dos contratos. Esperam-se autoridade política, medidas e decisões urgentes por parte da Sra. secretária de Estado para haver habitação e arrendamento.

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