Já
estivemos melhor e podemos ficar pior
Helena Garrido /
OBSERVADOR / 7-7-2016
Hoje
estamos pior do que há ano. Sem o sentirmos. Em 2017, se a política
e as políticas não se corrigirem estaremos pior ainda. Com uma
diferença. Vamos deixar de ter a ilusão de prosperidade.
Há um ano as
perspectivas económicas para Portugal e para o euro eram melhores.
Apesar da crise na China. Entretanto tudo aconteceu. No Reino Unido,
em Angola, no Brasil e por cá, em Portugal. A conjuntura económica
e política recomenda prudência. Nas previsões, nas políticas e na
política e na gestão da nossa vida. Quem nos diria que no Verão de
2016 estaríamos a enfrentar uma enorme gritaria sobre a banca e a
assistir a uma economia que dá sinais de estar em mergulho, apesar
de funcionários públicos e pensionistas terem mais dinheiro no
bolso?
Vamos a factos, com
alguns indicadores e estatísticas em Portugal e na União Europeia.
Comecemos pelos mais recentes acontecimentos.
A decisão dos
eleitores do Reino Unido, de sair da União Europeia, lançou o país
e o resto da Europa num mar de incerteza que está a ditar uma
elevada instabilidade nos mercados financeiros. A libra atingiu o
valor mais baixo em 31 anos, três fundos de investimento imobiliário
britânicos suspenderam os seus pagamentos e as bolsas caem,
castigando especialmente o sector bancário. Há sintomas que nos
fazem recordar os anos de 2007 e 2008 que nos trouxeram até aqui.
As regras
contabilísticas, que nasceram especialmente como resposta à crise
financeira, criam condições para ampliar os efeitos das
desvalorizações bolsistas nos bancos. O que significa que se os
bancos da Europa já estavam com problemas, por causa de erros
passados, de uma crise económica que não desparece e de taxas de
juro negativas, enfrentam agora mais um desafio, o de ultrapassarem
este abalo do Brexit.
Itália Alemanha e
Portugal são os países que parecem enfrentar maiores problemas com
a sua banca. Os italianos estão a tentar um intrincado modelo que
envolve um banco mau, dinheiro do Estado e responsabilidades dos
bancos do sistema. A Alemanha, como tem uma situação financeira
bastante folgada, resolverá facilmente o seu problema com o Deutsche
Bank. Portugal, pelo contrário, com o dinheiro que não tem,
envolveu-se num labirinto de debates não se sabendo exactamente se
há um problema para além das necessidades de capital da CGD que,
como disse o Presidente da República, todos já sabiam que existia.
Há um ano não era
essa a perspectiva que se tinha. Mentiram? Todos também sabem que
não houve mentiras nem desvios inustificados. Os problemas que
estamos a enfrentar na banca são uma combinação de mudanças
sucessivas de regras contabilísticas e de uma economia europeia e
portuguesa que não arranca para o crescimento.
A economia
portuguesa, reflexo do que se passa no resto da Europa mas, temos de
reconhecer, também da inflexão das políticas económicas realizada
por este Governo, está de novo a dar fortes e continuados sinais de
queda.
O indicador
coincidente do Banco de Portugal, que antecipa a evolução da
economia, está a diminuir desde Novembro do ano passado e em Maio
indica que existiu uma queda na actividade económica. A informação
qualitativa aponta para a quebra ou estabilização. É o caso do
inquérito de conjuntura às empresas e aos consumidores de Junho. “O
indicador de confiança dos consumidores diminuiu em Junho, após ter
aumentado no mês anterior, interrompendo a tendência ascendente
observada desde o início de 2013”, diz o INE logo no primeiro
parágrafo. Na indústria transformadora verifica-se uma
estabilização e os principais obstáculos à expansão da
actividade é a falta de procura. (Vale a pena verificar que o
crédito é o quarto problema identificado, com um peso muito baixo,
o que contradiz a mensagem política de que é preciso capitalizar a
CGD também por causa do financiamento à economia).
O emprego está a
ser, até agora, o que evolui de forma mais positiva, de acordo com
os dados do primeiro trimestre. Mas como o emprego, tendo em contas
as regularidades do passado, leva seis a nove meses a reagir a
alterações na economia, teremos de esperar para ver o que aconteceu
no segundo trimestre.
Claro que esta nova
tendência de mergulho da economia é um reflexo de uma dinâmica
mais lenta da Zona Euro e dos abalos que estão a sofrer economias
que foram âncoras de crescimento, como Angola e Brasil. Mas, em
contrapartida, temos a Espanha já mais robusta (cresceu 3,4% no
primeiro trimestre face a igual período do ano anterior) e
beneficiamos de uma evolução historicamente elevada no turismo. Ou
seja, temos choques negativos mas também positivos.
O quadro que traçam
os indicadores qualitativos e quantitativos, assim como a incerteza
gerada pela perspectiva de saída do Reino Unido da UE, recomendam
prudência em todas as frentes. O que em si pode alimentar um reforço
da tendência de queda da actividade económica mas que, a prazo,
significa estar melhor. Se o pior dos cenários se confirmar
estaremos prevenidos.
A mesma prudência é
especialmente necessária na classe política que dirige o país ou
que está na oposição. Na conjuntura que enfrentamos temos algumas
oportunidades, como a de ser um país que atrai investimento
estrangeiro como atraiu turistas e que consegue aproveitar, o mínimo
que seja, os efeitos de deslocalização de empresas que a infeliz
decisão do Reino Unido vai gerar.
A fragilidade da
coligação que governa o país é o único factor que está a
impedir uma governação que dá prioridade à prosperidade. Temos
estado em campanha eleitoral e assim vamos continuar. O que significa
reforçar ganhos de curto prazo que vamos perder no prazo de um ano
se não existir uma surpresa muito positiva.
Este ano estamos
pior que o ano passado, sem o sentirmos. Para o ano, quando
estivermos de novo a debater o Estado da Nação, corremos o sério
risco de estar bastante pior. E aí sem qualquer ilusão mas com
efeitos sérios nos nossos bolsos, nas nossas vidas.
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