O modelo empresarial
de um verdadeiro e autêntico espaço local a evoluir em direcçào
ao “Pastel de bacalhau com queijo e Fábrica dos pastéis de nata”?
Um futuro com pizzas e hambúrgueres?
Circuitos de
turismo e autocarros ? Trazer o Turismo de massas até ao últimos
recantos preseverados ? Até aos últimos bairros verdadeiramente
residenciais ?
OVOODOCORVO
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Mexicana.
Um espaço histórico sobrevive a pizzas e hambúrgueres?
Joana Marques Alves
30/07/2016 11:37
E se lhe disséssemos
que a Pastelaria Mexicana pode vir a dedicar-se à comercialização
#de fast-food ou oferecer um sistema #de self-service? Mas atenção:
as imagens nunca irão abandonar a sua casa
Quem conhece Lisboa
conhece a Mexicana. Quem conhece a Mexicana conhece Lisboa. Esta
pastelaria faz parte não só da vida daqueles que trabalhavam ou
viviam na capital, mas também da cidade em si – ninguém imagina a
Avenida Guerra Junqueiro sem este estabelecimento.
Aberta em 1946 e
renovada no início dos anos 60 (altura em que foi remodelada segundo
o projeto do arquiteto Jorge Ferreira Chaves, que incluía o famoso
painel cerâmico de Querubim Lapa), a Mexicana era frequentada por
membros da classe média-alta que ali residiam e por pessoas que
laboravam nas imediações. Era também um espaço onde vários
artistas ligados ao surrealismo e neorrealismo se reuniam.
Com o passar dos
anos, este estabelecimento passou por fases boas e más, acabando
mesmo por chegar a um estado de decadência. “Esta casa tinha um
passivo de um milhão e 350 mil [euros]. (…) Quando aqui cheguei,
os empregados tinham os ordenados em atraso. Neste momento está tudo
regularizado”, diz ao i Rogério Pereira, atual proprietário da
Mexicana.
O empresário
comprou este negócio quando, segundo o próprio, a pastelaria “não
tinha praticamente clientela e não faturava”. Decidiu fechar para
obras e renovar o espaço – obras essas que chegaram a ser
suspensas pela Câmara de Lisboa por falta de licenciamento
municipal. “Éramos para estar fechados 120 dias e acabámos por
estar oito meses.
Fizeram-se aqui
coisas nos anos 90 que não deviam ter sido feitas, como modificações
de estruturas. Isso acabou por gerar um problema”, recorda Rogério
Pereira, que obteve a autorização da Direção-Geral do Património
Cultural para avançar com obras antes de a câmara tomar conta do
assunto. “Não se encontravam os projetos, [os documentos que o
município possuía] não obedeciam ao que existia [à estrutura da
pastelaria na altura]. Mas acabámos por chegar a um acordo
facilmente.” E assim começou a transformação da Mexicana.
Uma reabertura
repleta de deceções. A pastelaria voltou a abrir as suas portas no
final do ano passado. A inauguração foi noticiada em vários órgãos
de comunicação e centenas de pessoas esperavam, ansiosas, por ver o
resultado das mudanças neste espaço histórico de Lisboa. Pelo que
se pode ler nos artigos publicados na altura, as coisas não correram
tão bem como se esperava. “A esplanada voltou a encher-se de
expectativa... e alguma desilusão”, escrevia o “Diário de
Notícias”.
“Se eu tivesse
feito a reabertura em julho ou agosto, que era o pretendido, tinha
uma equipa mais sólida para o fazer”, justifica Rogério Pereira.
No entanto, o dono do estabelecimento acredita que houve alguns
exageros nas críticas publicadas: “Ao reabrir a Mexicana, as
pessoas querem sempre mais (…) Muitas das pessoas que escreveram
sobre a reabertura nem sabiam como é que ela estava antes. E hoje é
muito fácil comentar algo sem pensar na informação que se
divulga”, afirma o empresário.
“Daqui a 15 anos
não há boa restauração em Lisboa.” Dias depois da reabertura, a
Mexicana entrou no ano em que completa o 70.o aniversário. Existem
cafés mais antigos na capital, mas esta pastelaria tornou-se um
símbolo de Lisboa – um local de culto para vários artistas, onde
se reuniam a discutir ideias para as suas obras e para o país.
No entanto, a
Mexicana parece estar um pouco esquecida, numa área onde poucas
pessoas param hoje. E a culpa é, em parte, da Câmara de Lisboa,
afirma Rogério Pereira. “Não tenho nada contra Fernando Medina
[presidente do município], mas a história diz-me que os presidentes
da câmara muito pouco fizeram pela cidade de Lisboa. Fizeram pouco
pelos habitantes e pelos comerciantes. Antigamente respeitavam quem
fazia a economia, hoje não. Fazem-se guerras abertas só para se
cativar votos”, disse ao i.
O empresário
acredita que a sobrevivência destes espaços passa (não só, mas
também) pela intervenção da câmara e a dinamização dos locais
mais “escondidos”: “[A câmara] devia ajudar a criar, por
exemplo, circuitos de turismo em que os autocarros parassem nestas
casas com história. Porque, se nada for feito, um dia destes
fecham.”
Para Rogério
Pereira, há outra coisa que poderá fazer com que muitos
estabelecimentos como a Mexicana fechem portas. Algo que falta em
vários espaços lisboetas e que muitos dos cafés históricos tentam
manter: a escola. “Dentro de 10 ou 15 anos, pouca da boa
restauração que ainda existe na cidade de Lisboa vai resistir. Por
causa disso [a falta de dinamização por parte da câmara] e também
porque as casas deixaram de fazer escola. As escolas hoteleiras dão
pouca formação. Fazem o ensino básico e, quando chegam aqui, [os
alunos] vêm com ilusões. Agora todos querem ser cozinheiros, mas
quando nos chegam não têm ideia do que é o calor de uma cozinha.”
Um futuro com pizzas
e hambúrgueres? Se alguns cafés, pastelarias e confeitarias vivem
da sua história? Sim, mas muito poucos. É por isso que Rogério
Pereira diz que a Mexicana não pode “estar agarrada só a papéis
escritos há muitos anos, tem de mudar as coisas. A Mexicana não
pode pensar no futuro só com base no seu passado. É preciso juntar
mais qualquer coisa”.
Esse “qualquer
coisa” ainda está a ser pensado, mas já foram concebidas (e
partilhadas com as entidades responsáveis) algumas ideias que podem
deixar os clientes mais antigos perturbados.
“Se eu pusesse
aqui um self-service, as pessoas iam ficar chocadas, mas era algo
adequado para [os clientes que vêm] de segunda a sexta-feira. Se
pusesse aqui uns quiosques a vender hambúrgueres ou pizzas… Se
calhar temos de perceber como avançar. São algumas das ideias para
o futuro que partilhei com pessoas ligadas à câmara. Vamos ver…”,
diz, com um sorriso no rosto.
Mas que fiquem
descansados os que temem pelo desaparecimento do “Sol Mexicano”
de Querubim Lapa ou do famoso “passarinhário”: todos os
elementos que fazem da Mexicana o lugar que é hoje, um imóvel de
interesse público, serão preservados. “A Mexicana, por si
própria, tem de conservar muito daquilo que é, mas tem de se tornar
um espaço mais comercial. As contas têm de ser pagas… Mas as
imagens de marca serão sempre mantidas”, assegura Rogério
Pereira.
Com pizzas, com
obras, sempre com o sol que lhe deu a luz e os pássaros que a
acordavam pela manhã – que a Mexicana continue de pé e se
mantenha um local de culto por mais 70 anos.
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