domingo, 24 de julho de 2016

Sanders foi prejudicado nas primárias pelo Comité Nacional Democrático / WikiLeaks põe democratas a controlar danos


WikiLeaks põe democratas a controlar danos
E-mails revelados pela WikiLeaks levam à demissão da presidente do partido, numa tentativa de acalmar os apoiantes de Sanders. Que continua firme no apoio a Clinton, dizendo que o objectivo é travar Trump

Alexandre Martins, na Pensilvânia / 25-7-2016 / PÚBLICO

Apenas um dia depois de os republicanos terem esvaziado uma Cleveland coberta de polícias e palco de protestos mais coloridos do que violentos, o Partido Democrata vi-se atolado numa polémica com consequências imprevisíveis para a imagem de união que Hillary Clinton tem de transmitir em Filadélfia, entre hoje e quinta-feira.

Hillary Clinton será oficialmente nomeada candidata presidencial dos democratas em Filadélfia
Enquanto a convenção do Partido Republicano decorria em Cleveland, na semana passada, Hillary Clinton e os seus gestores de redes sociais deliciavam-se no Twitter e no Facebook com o espectáculo de desunião que estava a desenrolar-se perante os olhos de milhões de telespectadores. Da mini-revolta de alguns delegados anti-Trump à histórica rebelião do senador Ted Cruz em pleno palco, tudo servia para reforçar a mensagem de que “o Partido de Lincoln está a transformar-se no Partido de Trump”, como escreveu a candidata logo no primeiro dia da convenção.
Foi uma boa semana para a campanha de Hillary Clinton, que nem precisou de sujar as mãos com a polémica do plágio no discurso de Melania Trump — um caso que pode ser pouco importante mas que acabou por dominar o ciclo noticioso nos dois primeiros dias da convenção nacional dos republicanos.
Uma convenção nacional, do Partido Democrata ou do Partido Republicano, é o momento em que os seus membros, militantes e simpatizantes se juntam à volta do nomeado e dizem aos eleitores norte-americanos que estão todos juntos e preparados para a luta das eleições gerais, em Novembro.
Mas, na sexta-feira, a organização WikiLeaks revelou cerca de 20 mil e-mails, enviados e recebidos por alguns membros da liderança do Partido Democrata, já queimada com as acusações de Bernie Sanders e dos seus apoiantes de que tinha deixado de lado o seu dever de imparcialidade e inclinado o jogo para o lado de Clinton nas primárias.
Nestas coisas da política, muitas vezes aquilo que parece é infinitamente mais importante do que a realidade, ainda para mais no final das primárias mais polarizadas das últimas décadas no Partido Democrata — Clinton teve mais vitórias em estados, mais votos e mais delegados, mas Sanders e os seus apoiantes deram muita luta a uma mulher vista pela maioria dos norte-americanos como pouco transparente (no mínimo) ou “uma mentirosa nata”, como escreveu em 1996 o colunista do The New York Times William Safire.
Na verdade, os e-mails mais polémicos revelados pela WikiLeaks mostram mais frustração por parte da liderança do Partido Democrata face às acusações de que foi alvo pela campanha de Bernie Sanders do que uma gigantesca conspiração para roubar a nomeação ao candidato. Seja como for, a liderança do Partido Democrata (e a do Partido Republicano) tem como dever dar as mesmas oportunidades a todos os candidatos e não tentar interferir na campanha a favor de um ou de outro. Mas, neste caso, foi isso que aconteceu, embora nenhuma das mais polémicas ideias sugeridas nos e-mails agora revelados ter sido posta em prática.
A mais baixa foi feita pelo director financeiro do partido, Brad Marshall, que sugeriu questionar a fé de Sanders para atacá-lo nos estados mais religiosos: “Será que ele acredita em Deus. Ele disse de passagem que tem herança judaica. Acho que li que é ateu. Isto pode marcar muitos pontos junto do meu pessoal. O meu pessoal da Igreja Baptista no Sul faria uma grande distinção entre um judeu e um ateu.” Marshall já veio pedir desculpas, escrevendo na sua página no Facebook que lamenta os seus “insensíveis e emotivos” e-mails, acrescentando que o seu conteúdo não expressa nem as suas ideias nem as ideias da presidente do partido, Debbie Wasserman Schultz.
Muito mais do que o director financeiro, é Wasserman Schultz quem está debaixo de fogo de Bernie Sanders e dos seus apoiantes, que pedem a sua demissão desde o início das primárias, por estarem convencidos de que ela, como apoiante confessa de Hillary Clinton, favoreceu a candidata durante o processo. E os e-mails revelados reforçam essa convicção.
É num contexto de controlo de danos que arranca esta segunda-feira a convenção do Partido Democrata, em Filadélfia, num clima de incerteza que não está a motivar tantos tweets divertidos por parte da campanha de Hillary Clinton como na semana passada — a última coisa que a candidata precisa neste momento é de ajudar Donald Trump com uma convenção ainda pior do que a do Partido Republicano, com uma revolta dos delegados de Sanders mais ruidosa do que a dos delegados anti-Trump.
Para tentar acalmar os apoiantes de Sanders, Debbie Wasserman Schultz foi retirada à última hora da lista de oradores, para evitar uma erupção de apupos ainda mais sonora do que a que foi dirigida a Ted Cruz na convenção dos republicanos. Mais do que isso, a pressão foi tão grande que ontem foi anunciado que Wasserman Schultz vai abandonar a liderança do partido — vai abrir e fechar a convenção, e no final desaparece de vista. Mesmo antes de Schultz ter falado, o Presidente Barack Obama emitiu um comunicado a agradecer os seus serviços, numa indicação de que os democratas querem atirar rapidamente para trás das costas este problema e voltar a centrar a atenção dos media na convenção.
Bernie Sanders, que firmou um acordo com Hillary Clinton para recomendar o voto nela e contra Trump em troca de concessões no programa do partido (como a exigência da subida do ordenado mínimo para 15 dólares/hora e universidade grátis para os filhos de famílias mais pobres), disse apenas que os e-mails provam aquilo que ele sempre disse.
Mas a sua fúria é direccionada apenas a Debbie Wasserman Schultz e não a Hillary Clinton, com quem acordou, segundo as suas palavras, “o programa político mais progressista da História do Partido Democrata”. Mesmo perante a pressão de muitos dos seus apoiantes, Sanders mantém que o mais importante é impedir que o “inapto” Donald Trump chegue à Casa Branca, e passou o fimde-semana a reafirmar que vai fazer tudo para que Hillary Clinton seja eleita Presidente dos Estados Unidos. Sanders fala esta segunda-feira aos delegados, na convenção, e espera-se que o seu discurso seja decisivo para a união no Partido Democrata.

Sanders foi prejudicado nas primárias pelo Comité Nacional Democrático

Depois de conhecidos os emails trocados pelo Comité Nacional Democrático para favorecer a candidata Hillary Clinton, a presidente do comité anunciou que se vai demitir depois da Conveção Democrata.


Hillary Clinton ganhou as primárias norte-americanas, deixando Bernie Sanders para trás. Mas, a julgar pelos emails divulgados no dia 22 de julho pelo site Wikileaks, terá tido mais apoio do que o das pessoas que frequentavam os comícios em que participava. O Comité Nacional Democrático (CND) não terá sido imparcial e parece ter favorecido Clinton durante as primárias, noticiou a Bloomberg. O resultado é que Debbie Wasserman Schultz, presidente do Comité Nacional Democrático, se vai demitir no final da semana, depois da Convenção Democrata.

Debbie Wasserman Schultz, presidente do Comité Nacional Democrático, esteve debaixo de fogo durante todo o processo das primárias, mas a pressão para que se afaste do cargo aumentou depois de conhecido o conteúdo de quase 20 mil emails que revelam manobras de bastidores no interior da estrutura dos democratas para prejudicar a campanha de Bernie Sanders, noticiou a CNN. Entre outras iniciativas, o comité tentou descredibilizar Sanders questionando a sua orientação religiosa para o fazer perder votos nos estados mais a sul. Outro conjunto de emails mostra como a presidente do comité conseguiu alterar uma notícia no Real Clear Politics de forma a desfavorecer Sanders, referiu a Fox News.

Bernie Sanders, numa reação aos emails divulgados pelo Wikileaks, considerava que Debbie Wasserman Schultz se devia demitir. “Disse-vos há muito tempo que o CND não estava a conduzir uma operação justa, que estavam a apoiar a secretária de Estado Clinton”, disse Sanders ao ABC, citado pela Bloomberg. “O que eu sugeri há seis meses ser verdade mostrou-se, de facto, verdade. Não estou chocado. Mas estou desapontado.” Estava previsto que, depois do sucedido, a presidente do comité não discursasse na Convenção Democrática que começa nesta segunda-feira. Mas Debbie Wasserman Schultz anunciou que vai fazer os discursos de abertura e encerramento e que se demite depois disso, noticiou The Wall Street Journal.

“Tenho orgulho de ter sido a primeira mulher nomeada para ser presidente do Comité Nacional Democrático”, disse Wasserman Schultz, em comunicado, citada pelo The Guardian. “Não podia estar mais satisfeita por os Democratas nomearem, pela primeira vez, uma mulher para candidata a Presidente, Hillary Clinton, uma amiga em quem sempre acreditei e que sei que dará uma grande Presidente.”

Donna Brazile, vice-presidente do Comité Nacional Democrático, disse que já tinha pedido desculpa à comissão de campanha do Sanders. A vice-presidente prometeu que o assunto será resolvido e que caso mais emails venham a público é possível que mais pessoas sejam afastadas, referiu a Bloomberg.

Ainda assim, Bernie Sanders mantém o apoio a Hillary Clinton enquanto opositora de Donald Trump. “Para mim, o mais importante agora é derrotar o pior candidato que vi em toda a minha vida, Donald Trump”, disse Sanders. “A maior parte dos meus apoiantes compreende que Trump tem de ser derrotado.”

O responsável pela campanha de Hillary Clinton, Robby Mook, tentou justificar-se à CNN dizendo que foram hackers russos que acederam aos servidores do CND com o objetivo de ajudar Donald Trump.


Atualizado às 22h00 com a decisão de Debbie Wasserman Schultz se demitir do cargo.

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