quarta-feira, 21 de março de 2018

Chegada a Primavera, Jardim de Santos reabre renovado após quase um ano fechado



Chegada a Primavera, Jardim de Santos reabre renovado após quase um ano fechado

Sofia Cristino
Texto
21 Março, 2018

“Este sim, é o jardim da minha mocidade. Passávamos aqui e sentia-me triste, mas, como está agora, faz-me lembrar o jardim da minha infância”, diz Deolinda Peres, 74 anos, enquanto olha para o Jardim Nuno Álvares, mais conhecido como Jardim de Santos, que reabriu esta quarta-feira (21 de Março), a assinalar o início da Primavera. O espaço verde esteve fechado durante quase nove meses para obras de reabilitação, depois de ter sido encerrado devido ao estado de degradação a que tinha chegado, muito por culpa do vandalismo e da falta de manutenção. Agora, vai estar aberto diariamente das 8h às 20h, de segunda a domingo.

O espaço verde havia sido encerrado no início de Julho de 2017, por decisão da Junta de Freguesia da Estrela, que tutela aquele espaço desde Março de 2014. Mas o processo de requalificação do jardim não foi fácil. Em Maio do ano passado, a junta pediu à Câmara Municipal de Lisboa (CML) um contrato de delegação de competências para realizar a empreitada de revitalização do jardim. Solicitação que não teve logo uma resposta positiva, explica o presidente da junta de freguesia da Estrela, Luís Newton (PSD), em declarações a O Corvo.

 Nesta intervenção, a junta gastou 20 mil euros na requalificação dos relvados e arvoredo, na instalação de bancos e mesas, na plantação de relva e podas preventivas, um novo parque infantil e a instalação de equipamemnos de exercício e manutenção. Agora, a autarquia promete acompanhar os primeiros dias da nova fase de existência do parque. Os próximos desafios são terminar a reparação do pavimento, que ainda carece de obras, e mudar o sistema de rega.

 “Era preciso perceber que este jardim tinha uma característica que o diferenciava da maior parte dos jardins de Lisboa e a câmara, inicialmente, não o aceitou. Mas, felizmente, um ano e meio depois, eles perceberam que não havia outra solução, porque o dinheiro que investíamos aqui para manter o jardim desaparecia num instante”, explica Luís Newton. “Era impossível estar constantemente a haver investimento público porque este desaparecia muito rapidamente. Aos fins-de-semana, destruíam tudo. Apesar de conseguirmos manter as pessoas fora, com a vedação, chegamos a vir cá, nas manhãs de sábado e domingo, e víamos garrafas partidas, que deviam ser atiradas e até fezes humanas”, recorda.

Feita a intervenção, diz o presidente da junta, “um dos grandes desafios, agora, é assegurar que isto está impecável no dia seguinte e que as pessoas que aqui residem podem vir desfrutar sem terem de se deparar com lixo no meio do jardim”, garante. Durante anos, os moradores queixavam-se do clima de insegurança, para o qual muito contribuíam os actos de vandalismo. Apesar de ter sido ali colocada uma vedação metálica, no final de 2016, para proteger as espécies vegetais e o mobiliário urbano, as acções de destruição do espaço público continuaram a acontecer. O que levou ao encerramento daquele parque e ao início da operação de reabilitação agora terminada.

 Há, contudo, quem receie que o trabalho feito possa ser posto em causa. “Com muita pena minha, acho que devia continuar fechado, por causa das pessoas que passam aqui. Aposto que na sexta-feira ou no sábado já está todo vandalizado outra vez. Vejo bem o que se passa de minha casa e, às vezes, já nem saio, por causa disso”, diz José Andrade, 19 anos, que mora na rua ao lado. Já foi assaltado durante o dia naquele espaço verde. “Vinha para aqui brincar em miúdo e tenho saudades de como era o jardim naquela altura. Lembro-me de ver os jardineiros a colocarem os canteiros e, no dia seguinte, estava tudo estragado. Tinha pena deles”, conta.

 “Houve uma fase que até tinha receio de trazer a cadela, porque tinha medo que se cortasse nos vidros das garrafas partidas. Cheguei a ter medo de passar aqui de dia, havia muito tráfego de droga, arrancavam árvores e levavam-nas, partiram a fonte, uma estupidez. Santos já não é como era, devia haver mais policiamento, principalmente à noite, senão as pessoas saltam pelas grades e estragam na mesma. Até já falamos, os moradores, em termos chaves do jardim. Podíamos vir regar as plantas e cuidar dele”, acrescenta José Andrade, enquanto assobia pela cadela.

 A sua mãe, Piedade Andrade, de 54 anos, adopta um tom ligeiramente menos pessimista. “A remodelação está óptima, deixaram as árvores como estavam, não mudaram muita coisa, e está mais confortável. Mas tem de haver uma continuidade. Vivemos aqui um período muito complicado, era muito mal frequentado”, recorda.

 Deolinda nasceu na Avenida 24 de Julho e assistiu a todas as transformações daquele espaço público. “Lembro-me de vir para aqui brincar à noite, quando era criança, e ninguém se metia connosco. Só íamos para casa quando os pais nos chamavam, eram outros tempos sem dúvida”, recorda.

 Mariia Vasylchenko, natural da Ucrânia mas a viver em Portugal há sete anos, diz que Lisboa precisa de mais espaços verdes. “Precisamos destas ilhas para nos lembrarmos que há natureza no meio da cidade”, diz enquanto se senta na relva. António Campos, na casa dos 60 anos, vive em Benfica mas diz que passeia muito por Lisboa e veio de propósito ver a abertura do jardim. “Tem de se criar o hábito e a cultura de estar limpo. Este foi um processo de alguma dor e acho que não era necessário tanto tempo, mas estou muito contente com o resultado”, garante.
Ao longo deste processo, feito de avanços e recuos, o mais difícil foi, diz o presidente de Junta de Freguesia da Estrela, assegurar a manutenção do jardim a longo prazo. Fruto de anos de má utilização dos espaços comuns, “a terra já não tinha os nutrientes necessários para a relva crescer saudavelmente, outra das razões porque a reabertura do jardim foi mais morosa”.

 “Não existia relva com qualidade e preferimos esperar mais um bocadinho para que crescesse, porque o jardim precisava de tempo sem as pessoas. Agora já podem desfrutar, trazerem uma toalha para a relva e fazerem piqueniques. Optamos por um mecanismo de sementeira e não de tapetes porque entendemos que, a longo prazo, podia ser mais benéfico. Se tivéssemos aberto logo, ao final de uma semana, já não se conseguia sustentar a relva”, explica.

 Agora, a Junta de Freguesia da Estrela diz continuar à espera do aval da câmara para assegurar o sistema de rega, uma vez que o actual consome em demasia. “Os sistemas que estamos a utilizar não são tão eficazes, ainda temos perdas de águas e com o sistema de rega novo vamos ter muito menos perdas”, observa Luís Newton. O presidente de junta quer ainda que seja a Câmara de Lisboa a requalificar o piso e a fonte, bem como a colocar mais equipamentos no parque infantil.

                                                                     

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