Câmara de Lisboa
admite dificuldade em retirar cabos das fachadas dos prédios
Samuel Alemão
Texto
13 Março, 2018
“Trata-se de uma
pecha da cidade de Lisboa, mas estamos a tratar de minorar a situação”. O
presidente da Câmara Municipal de Lisboa (CML), Fernando Medina (PS),
reconheceu-o na última reunião descentralizada do executivo, realizada na
semana passada, na Escola Secundária Dona Filipa de Lencastre. Continuam a
existir demasiados cabos de operadoras energéticas e de comunicações nas
fachadas dos imóveis da capital portuguesa, muitos deles aglomerados em novelos
caóticos que pendem sobre a via pública. Um problema de décadas, para o qual a
autarquia tem reiteradamente prometido uma solução, ao longo nos últimos anos,
mas cujos resultados práticos têm sido quase inexistentes. Isto apesar de
existirem três regulamentos distintos a regular a matéria.
Há quatro anos,
na sequência de uma recomendação da Provedoria de Justiça, a câmara chegou
mesmo a avançar o dia 31 de Maio de 2017 como a data-limite para que todos os
edifícios da cidade tivessem a sua cara lavada, retirando as cablagens que
proliferam de forma desordenada pelas fachadas da cidade. O tempo passou e, na
prática, nada parece ter acontecido. Basta sair à rua e contemplar as paredes,
muitas delas forradas por amálgamas de fios. Há, por isso, quem volte a exigir
medidas, como é o caso do grupo cívico Vizinhos das Avenidas Novas, que, na
semana passada, voltou à pedir à CML a tomada de medidas concretas, bem como do
Partido Ecologista “Os Verdes” (PEV), que, dias depois, apresentou um
requerimento no mesmo sentido à Assembleia Municipal de Lisboa (AML). Mas a
câmara municipal diz que está a ser difícil tratar do problema.
Isso mesmo
reconheceu Manuel Salgado, vereador do Urbanismo, na mesma ocasião em que
Fernando Medina falava da “pecha” que há muito desfeia Lisboa. Fazendo
referência à unanimidade com que foi aprovado o Regulamento Municipal de
Urbanização e Edificação de Lisboa, lembrou que o mesmo “prevê que sejam
retirados todos os cabos de telecomunicações e electricidade das fachadas do
prédios”. Mas, logo de seguida, admitiu as dificuldades existentes na
fiscalização das situações de incumprimento. “Infelizmente, são muitas as
operadoras. E, além destas empresas, são ainda muitas as que subcontratam a
empreiteiros a colocação de cabos, os quais o fazem aos fins-de-semana e fora
de horas. Portanto, é particularmente difícil controlar esta situação”, disse o
vereador.
Apesar disso,
Manuel Salgado assegurou, na sequência de uma questão levantada por um
munícipe, que a CML não está de braços caídos em relação ao problema. “Nas
intervenções no espaço público, nomeadamente nas praças e na reconstrução de
ruas, temos instalado tubagens no subsolo, para que as operadoras transfiram os
cabos das fachadas para o subsolo”, explicou o autarca, embora reconhecendo que
tal metodologia tem vindo a ser aplicada a um ritmo bem mais lento do que
aquele que gostaria. Salgado apontou três casos de locais onde a mesma já foi
posta em prática: Rua da Centieira, em Marvila; Quinta de Santa Clara; e Bairro
do Condado, também em Marvila.
Aproveitando o
facto de estar, naquela ocasião, no Bairro do Arco do Cego, assegurou ainda que
estaria ali prevista a remoção de dois postes de madeira com cabos de
comunicações suspensos, procedendo-se ao seu enterramento.
As promessas de
resolução do problema por parte de Manuel Salgado vêm, pelo menos, de 2014. Foi
quando anunciou em reunião pública de câmara a criação do Regulamento de
Ocupação de Via Pública com Estaleiros de Obras, do qual constariam regras
específicas sobre as cablagens dos operadores energéticos e de comunicações. Na
altura, Salgado disse que “o município tem de impor esta regra com força” e
defendeu a aplicação de “sanções pesadas para quem não cumprir”. O referido
regulamento acabaria por ser aprovado em 5 de Dezembro de 2014. Alguns meses
antes, em Abril, o mesmo vereador havia reconhecido a dimensão do problema, em
declarações à agência Lusa. “Há muitas queixas, de moradores, da colocação de
cabos nas fachadas dos seus prédios. Dá uma imagem de degradação à
cidade”, admitia.
No ano seguinte,
a Câmara de Lisboa faria aprovar o Regulamento de Infraestruturas no Espaço
Público, reforçando o enquadramento legal em relação ao qual as empresas se
deveriam reger. Era nesse regulamento, publicado em Dezembro de 2015, que
constava a obrigatoriedade de retirada das cablagens das fachadas dos prédios
até 31 de Maio de 2017 e o seu enterramento em infra-estruturas no subsolo. As
regras não se limitavam ao material em utilização pelas diferentes operadores,
incluindo ainda os chamados “cabos mortos”. De facto, o regulamento diz que,
“independentemente da sua localização ou alojamento, as entidades titulares ou
gestoras de redes ou infra-estruturas estão obrigadas à remoção de cabos,
equipamentos ou quaisquer elementos das suas redes que não estejam a ser
efectivamente utilizados”.
O tempo foi
passando e, um ano após a publicação deste Regulamento de Infraestruturas no
Espaço Público, já em Dezembro de 2016, O Corvo dava conta da então já evidente
incapacidade da câmara em fazer cumprir a imposição de retirada dos cabos, até
à data-limite de 31 de Maio de 2017. Agora, mais de um ano volvido, surgem
novos pedidos para que se faça cumprir a legislação. E alguns fazem-no
recordando à CML um terceiro regulamento, o Regulamento Municipal de
Urbanização e Edificação de Lisboa, no qual se declara “interdita a instalação
à vista de ductos, cablagens, caixas, equipamentos e maquinarias no exterior
das fachadas e nas coberturas dos edifícios.”
É o que faz o
grupo cívico Vizinhos das Avenidas Novas, que, numa carta aberta enviada a
Manuel Salgado, a 7 de Março, considera “lamentável e inexplicável que esta
situação se mantenha” e que todas as recomendações e os prazos estabelecidos
pela autarquia “não tenham sido cumpridos”. O colectivo de cidadãos pede ao
vereador que “informe a população acerca da efectiva implementação das medidas
por si anunciadas em 2014 e supostamente concretizáveis até Maio de 2017” e “se
comprometa publicamente com metas e prazos realistas para a remoção (ou
enterramento) de facto dos cabos que desfeiam os edifícios da nossa cidade”.
Mas não se ficam por aí. Solicitam ainda que sejam também retiradas “as caixas
exteriores instaladas nos passeios, obstáculos à boa mobilidade dos peões”. E,
por fim, pedem que “estas medidas sejam acompanhadas por uma fiscalização
eficaz e permanente”.
Dois dias depois,
a 9 de Março, também o Partido Ecologista “Os Verdes” (PEV) vinha recordar que
“ultrapassado o prazo estipulado pelo Regulamento de Infraestruturas em Espaço
Público, muito ficou ainda por fazer, como facilmente se constata um pouco por
toda a cidade, onde se pode verificar que os cabos continuam pendurados nos
edifícios”. Por isso, entregaram um requerimento na Assembleia Municipal de
Lisboa (AML) questionando a câmara sobre as medidas tomadas nesta matéria. O
PEV pergunta à câmara em quantos casos “realizou coercivamente a operação de
retirada das cablagens inertes” e que “medidas estão previstas para o efectivo
cumprimento do Regulamento de Infraestruturas em Espaço Público”.
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