OPINIÃO
Parlamento:
Assembleia da Res… Privada
O rol de
deputados em situação de conflito de interesses (de que apresento aqui apenas
alguns exemplos) é interminável e faz-se sentir em todas as áreas da
governação.
Paulo de Morais
3 de Março de
2020, 5:56
Promiscuidade
entre política e negócios: esta continua a ser a característica mais marcante
do Parlamento português. A maioria dos deputados tem ligações profissionais e
empresariais que influenciam e contaminam a actividade parlamentar. Os
conflitos de interesses são recorrentes e frequentes nas comissões
parlamentares.
Por exemplo, na
Comissão de Economia, Inovação, Obras Públicas e Habitação, o seu presidente,
António Topa, tem interesses em empresas que actuam na área do imobiliário, a
Epifei e a Tocortal. À mesma comissão pertence o deputado Emídio Guerreiro,
dirigente da bem sucedida construtora Garcia, Garcia, SA. Qual é o problema? É
que na sua condição de deputados, Topa, Guerreiro e outros têm acesso a
informação privilegiada que podem canalizar para as empresas que servem; e
podem ainda influenciar a legislação, em função dos interesses do sector da
construção ou da promoção imobiliária a que estão ligados.
Por outro lado,
na Comissão de Saúde, que superintende a actividade do Governo que maior fatia
do Orçamento do Estado despende, encontramos o dirigente social-democrata Maló
de Abreu, que administra a Maló Clinic Group, a Pharmashop e outras empresas do
sector da saúde. Ao mesmo tempo que fiscaliza a actividade do Governo, tem
acesso a verbas do Orçamento do Estado. Na mesma situação se encontra a
socialista Ana Ribeiro da Silva, que preside à Associação Nacional AVC e aos
corpos dirigentes do Centro Social Zulmira Pereira Simões, entidades
potencialmente beneficiárias dos dinheiros do Estado.
Se mudarmos de
área, a saga do conflito de interesses continua. Mais alguns exemplos: o
social-democrata Paulo Rios de Oliveira, com interesses na Campo Grande – Comunicação
e Marketing, integra a Comissão de Comunicação e Cultura; pertencente à
Comissão de Ambiente, o deputado social-democrata Hugo Oliveira defende e faz
lobby a favor dos interesses da Associação de Termas de Portugal e das empresas
suas associadas, enquanto o seu colega de partido, Nuno Carvalho, se dedica,
através da sociedade Neoasfalto, à indústria de betumes ecológicos; na Comissão
de Agricultura, o socialista Joaquim Barreto preside à Mútua de Basto – ao
mesmo tempo que, enquanto deputado, fiscaliza a ministra da Agricultura,
defende interesses privados que beneficiam de apoios da sua fiscalizada.
Os conflitos de
interesses que dominam a Assembleia da República sentem-se com maior
intensidade nos maiores partidos, mas percorrem todo o hemiciclo parlamentar.
Atingem até os partidos de um só deputado, como o Chega. André Ventura, que
pertence à Comissão de Orçamento e Finanças, trabalha para a influente
consultora Finpartner. Assim, o deputado Ventura pode recolher no Parlamento
informação privilegiada sobre questões fiscais, de máximo interesse para os
clientes da Finpartner, que presta assessoria em questões… fiscais. Quem melhor
para assessorar os privados do que quem está no âmago das decisões públicas?
O rol de
deputados em situação de conflito de interesses (de que apresento aqui apenas
alguns exemplos) é interminável e faz-se sentir em todas as áreas da
governação. E tudo isto se passa com o beneplácito duma inútil Comissão
Parlamentar para a Transparência, cujo presidente, Jorge Lacão, profere
inúmeras e continuadas proclamações públicas a favor da transparência. A acção
desta comissão não passa pois de pura cosmética.
A situação é já
desmoralizante, face ao que se conhece por agora. Mas, inexplicavelmente, ainda
há deputados cujos interesses não foram sequer revelados – volvidos mais de 120
dias sobre o início da legislatura, ou seja, mais do dobro do prazo admitido
para a sua divulgação. É o caso do centrista João Gonçalves Pereira ou dos
socialistas Joaquim Barreto, Hugo Pires e Carlos Pereira, entre outros.
Com todas estas
ligações a negócios privados, muitos dos parlamentares alienaram a lealdade
para com o povo que os elegeu e transformaram-se em fiéis serventuários dos
grupos económicos a que estão associados e que lhes garantem generosas tenças.
Estes deputados (e os partidos que os acolhem) desonram o seu mandato e
arruínam a democracia.
Presidente da Frente Cívica
Sem comentários:
Enviar um comentário