Chafariz de São Sebastião da Pedreira, uma parte esquecida e
degradada das Águas Livres bem no centro de Lisboa
Samuel Alemão
Texto
21 Março, 2019
Inaugurado em 1791, integrando o sistema de abastecimento
alimentado pelo Aqueduto das Águas Livres, o projecto do arquitecto Francisco
António Ferreira Cangalhas é hoje um exemplo de desleixo de preservação
patrimonial. Vandalizado, graffitado, sujo, sem água corrente e poiso de
cidadãos sem-abrigo, dificilmente se diria que estamos perante um elemento
arquitectónico que é Monumento Nacional, parte integrante do conjunto do
aqueduto. Esta semana, tanto o PEV como o CDS-PP apontaram o dedo à Câmara de
Lisboa, responsabilizando-a pelo estado actual desta construção histórica.
Ambas as forças pedem a sua requalificação. “Assim, como está, é inadmissível”,
diz a vereadora Assunção Cristas (CDS-PP), propondo a criação de um Plano
Integrado de Recuperação e Valorização dos Chafarizes de Lisboa.
Um tanque seco como consequência da longa ausência de um fio
de água a sair do fontanário; paredes graffitadas e rabiscadas em profusão;
lixo e detritos diversos nas escadas e no espaço em redor, bem como poças de
urina amiúde; uma sala pertencente à infra-estrutura onde vive um casal de
cidadãos sem-abrigo, tendo improvisadas pranchas de madeira a servir como
portas. A descrição dificilmente assentaria a um Monumento Nacional, ainda para
mais situado bem no centro de uma das cidades europeias que mais tem atraído as
atenções do turismo pela sua beleza arquitectónica. Mas é esta a realidade do
Chafariz de São Sebastião da Pedreira, inaugurado em 1791 como parte do sistema
de fontanários do Aqueduto das Águas Livres, equipamento ao cuidado da Câmara
Municipal de Lisboa (CML). Poucos darão, aliás, pela sua existência, na Rua de
São Sebastião da Pedreira, quase escondido sob o viaduto da Rua Filipe Folque,
junto à Avenida António Augusto de Aguiar. Mas CDS-PP e o Partido Ecologista
“Os Verdes” (PEV) pedem agora explicações à CML.
“Este é mais um exemplo de uma Lisboa desconhecida de muita
gente e ao abandono. Temos aqui uma situação incompreensível de um chafariz que
faz parte do sistema do Aqueduto das Águas Livres e é, por isso, Monumento
Nacional, mas está neste estado de degradação que se pode observar”, disse
Assunção Cristas, vereadora e líder do CDS-PP, numa visita ao local, realizada
ao final da manhã desta quarta-feira (20 de Março), para denunciar o que os
centristas consideram ser o desleixo da câmara municipal da capital a cuidar do
património histórico sob a sua tutela, mas também para promover o Plano
Integrado de Recuperação e Valorização dos Chafarizes de Lisboa. A criação de
tal instrumento será proposta pelos vereadores do partido em reunião de câmara,
“muito em breve”, e com ela se pretende garantir a preservação de um conjunto
15 chafarizes monumentais, assegurando-lhes também a devida visibilidade,
através da sua integração num roteiro cultural e turístico.
A principal linha de força do plano agora apresentado é a de
ajudar a manter e dar o necessário relevo à arquitectura da água na capital
portuguesa. Para que isso aconteça, reconhece Assunção Cristas, terá de haver
uma estreita cooperação entre a Câmara de Lisboa e a EPAL. “Temos de cuidar
destes chafarizes, garantindo que estão em bom estado, mas também que são
iluminados, que há sempre água ornamental corrente, conferindo uma sensação de
frescura bem como o seu aprazível barulho, sem esquecer também a sinalética que
diga às pessoas que existem estes chafarizes e contém a sua história”, explica
Cristas, criticando o actual estado “desleixado” de alguns chafarizes
monumentais da cidade. “A Câmara de Lisboa não cuida, infelizmente. Assim, como
está, é inadmissível”, disse a vereadora sobre o Chafariz de São Sebastião da
Pedreira, sem esquecer de nomear os casos de outros equipamentos congéneres que
considera esquecidos, como os chafarizes da Rua do Século e do Largo do Carmo.
Referindo-se à profusão de graffiti naquele elemento
integrante de um Monumento Nacional, Cristas recorda que duas das dez propostas
do plano Lisboa Limpa, apresentado pelo partido no ano passado, poderiam ajudar
a resolver o problema. Uma delas passa pela sensibilização das entidades
judiciais para que, no âmbito dos processos-crime por dano de vandalização por
pichagem e graffitis ilegais, “sejam aplicadas medidas punitivas que envolvam a
prestação de horas de serviço comunitário”. Os centristas entendem que tais
sanções acessórias, juntamente com as multas em vigor, ajudariam a dissuadir os
prevaricadores. A outra medida refere-se a uma maior aposta em sistemas de
video-vigilância, uma solução reivindicada com insistência pelo partido como
forma de promover a segurança. “Quando os espaços estão mal tratados, e não se
intervém, alastra uma sensação de desmazelo e abandono. Quando estão limpos e cuidados,
é o contrário”, disse a autarca, revelando que veria com bons olhos a
instalação de uma esplanada junto ao Chafariz de São Sebastião da Pedreira,
como forma de manter a zona fora dos roteiros do vandalismo.
A preocupação com este elemento arquitectónico originalmente
pertencente ao sistema de abastecimento do Aqueduto das Águas Livres foi também
demonstrada esta semana pelos deputados municipais do Partido Ecologista “Os
Verdes” (PEV). Num requerimento dirigido à CML e entregue na assembleia
municipal, nesta segunda-feira (18 de Março), os eleitos do PEV denunciam o que
consideram ser o “abandono” e adiantado estado de degradação do equipamento
histórico. Lembrando a importância cultural dos chafarizes e fontanários da
cidade, os eleitos ecologistas perguntam à Câmara de Lisboa se existe algum
projecto para a “recuperação integral do Chafariz de São Sebastião da Pedreira
e a sua zona envolvente” e, em caso afirmativo, em que data e por que entidade.
No referido requerimento do PEV, lembra-se que a Assembleia Municipal de Lisboa
aprovou, em Abril de 2011, uma recomendação apresentada pelo partido que num
dos pontos deliberativos mencionava que a “autarquia devia promover a
reabilitação dos chafarizes e fontanários da cidade de Lisboa, contribuindo
assim para a preservação, protecção e valorização do património cultural
associado ao abastecimento de água potável na cidade”.
O Corvo confrontou,
ao início da tarde desta quarta-feira (20 de Março), a Câmara de Lisboa com as
críticas feitas, tanto pelo CDS-PP como pelo PEV, relativamente ao estado de
conservação do Chafariz de São Sebastião da Pedreira, questionando-a sobre os
seus planos para garantir a reabilitação e a preservação desta infra-estrutura.
Até ao momento da publicação deste artigo, porém, não recebeu resposta.
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