sábado, 14 de julho de 2018

Indiferentes ao consentimento, graffiters continuam a exprimir-se nas paredes de Lisboa






 O que seria altamente recomendável era uma definição clara e esclarecedora por parte do Vereador Sá Fernandes dos limites entre puro Vandalismo Camuflado sustentado por vaga argumentação pseudo-sofisticada e “Arte Urbana” …
É perfeitamente claro que a C.M.L. ... está a "enviar" mensagens paradoxais e pedagógicamente ambiguas ... E que tal menos "sofisticamento" e mais obra concreta na Reablitação e Recuperação de Lisboa ?
António Sérgio Rosa de Carvalho.

"Diferenciar o graffiti de vandalismo é o principal objectivo destas iniciativas." ... Lê- se em baixo …
Como classificam então os orgulhosos Autarcas ( António Costa, José Sá Fernandes, Manuel Salgado ) ... a intervenção na Fontes Pereira de Melo ...iniciativa da autoria dos mesmos ?!?
Eu SEI ... como a classifico ...
No caso especifico na Fontes Pereira de Melo, e daquele que constituiu um magnifico exemplo de um conjunto dos finais do sec XIX, juntamente com o Palacio Sotto Mayor e o Valmor sede do Metro ... depois do seu esventramento ... a intervenção “grafitti”, só serviu para alimentar e reforçar os argumentos relativizadores do Valor Patrimonial e ajudar à desresponsabilização dos responsáveis por essa decisão, e daqueles que pretendem concluir que “aquilo” ... "já não vale nada”.
Verdadeiro crime de Lesa-Património, esta intervenção “emite” em termos de Pedagogia o pior “sinal”possivel ... desprestigia o pouco que resta, nesta zona, do Património do Sec.XIX e ilustra a confusão de valores e a incompetência, disfarçada de sofisticamento cultural, que impera nas cabeças dos Vereadores da C.M.L. responsáveis por este atentado.
António Sérgio Rosa de Carvalho.

Don't let urban art cover up neglect of Lisbon's crumbling heritage Officially sanctioned graffiti artists are not the answer to revitalising a beautiful city
The graffiti initiative highlights poignantly the total absence of an urban strategy for regenerating the city centre. Estimates suggest there are more than 4,600 buildings empty in the central area, 50% either abandoned awaiting demolition or approval. Dixon mentions the Crono Project as an alternative to "abandoning Lisbon's crumbling heritage to the developers". Everyone likes to demonise developers, but in this case the responsibility for such a state should be laid at the door of the planning authorities.
John Chamberlain The Guardian, Friday 4 February 2011 Article history

“José Sá Fernandes vai declarar guerra aos graffiti em 2013.” Editado por António Sérgio Rosa de Carvalho in http://cidadanialx.blogspot.com/2012/10/jose-sa-fernandes-vai-declarar-guerra.html




Indiferentes ao consentimento, graffiters continuam a exprimir-se nas paredes de Lisboa
Eva Massy
Texto
13 Julho, 2018
https://ocorvo.pt/indiferentes-ao-consentimento-graffiters…/

À imagem de outras grandes cidades, Lisboa também vive o fenómeno do graffiti. O espaço público está repleto das assinaturas de quem os pinta. Prix, Hiver e Guru (nomes artísticos) falaram com O Corvo para explicar o que os leva a moverem-se pela cidade, deixando a sua marca nas paredes e mobiliário urbano. O vandalismo é criticado por muitos, mas assumido por quem o faz como uma atividade que aumenta o ego e quebra a rotina. “Poluição visual? Nem um pouco! Graffiti é a rua a falar”, exclama Gabriel Dutra que, apesar de pintar de forma legal e não precisar de se esconder atrás de uma alcunha, estima e respeita os que o fazem fora das regras. Mas também há quem tenha preocupações com o pré-existente. “Os azulejos não devem ser cobertos com graffiti, porque quando uma coisa já é bela não precisas de embelezá-la mais”, diz um dos artistas.

Às 4h da manhã, na Avenida Almirante Reis, Prix (nome artístico) remexe no saco das tintas à procura de uma cor que fique bem com as que já usou. Olha rapidamente à sua volta, antes de carregar no spray. Só fala uma vez a peça terminada, quando desce a avenida em direção ao Martim Moniz, acompanhada pelos amigos com quem esteve a pintar. Com um ar satisfeito e as mãos sujas de tinta, Prix diz terem escolhido este local porque, “apesar do grande risco em ser apanhado, a peça será vista por muita gente”.

Começou a pintar as paredes da cidade porque seguiu o movimento de outros amigos. Pensou num tag (alcunha usada no graffiti) e integrou uma crew (grupo de graffiters). Pinta, de preferência, acompanhada. É uma forma de ter maior controlo sobre as consequências da ilegalidade que comete, mas também permite ter a opinião dos amigos que a acompanham. Movem-se em grupo, uns pintam enquanto outros olham e vigiam e depois trocam, distribuindo cargos. “Acaba por ser todo um estilo de vida” explica, “porque é muito fácil apegares-te à adrenalina que é e passa a ocupar a tua mente”.

Notou-se no dia em que foi comprar as tintas com alguns amigos que também fazem graffiti. A caminho da loja, alguém pergunta onde vão pintar esta noite. Cada um fala dos spots que tem localizado, discutem a forma de aceder ao sítio e toda a conversa gira em torno do mesmo assunto. Trocam opiniões, elaboram planos e organizam a noite em função da prática do graffiti.

Do alto do Miradouro do Monte Agudo, Hiver e Guru (nomes artísticos) trocam impressões sobre um “NK” pintado a branco num dos telhados mergulhado no horizonte. Foi Hiver quem fez a peça e acedeu sozinho ao local. Já pintou paredes de forma legal e essa vertente permitiu explorar novas capacidades porque, como diz, “pintar sempre sob pressão não permite atingir níveis diferentes”. Torna-se importante treinar em ambientes calmos que permitem explorar ao máximo as suas próprias potencialidades.

Quando as cidades promovem a prática do graffiti legal
A Câmara Municipal de Lisboa (CML) disponibiliza vários locais que promovem o graffiti e a street art, através do projeto Galeria de Arte Urbana (GAU). No site da GAU, para além da informação sobre os sítios que disponibilizam, lê-se que a sua estratégia é “vocacionada para a promoção da arte urbana e, simultaneamente, para a salvaguarda do património e prevenção do aparecimento de intervenções vandálicas”. As empresas que fiscalizam e as empresas que limpam poderão vir a estar em contacto direto com as juntas de freguesia e as associações de moradores, informa um artigo publicado por O Corvo a 28 de Março deste ano. Isso permitirá que os moradores e juntas de freguesia passem a “fazer parte do dispositivo de vigilância dos tags e graffitis ilegais, ajudando as empresas contratadas pela Câmara Municipal de Lisboa (CML) a fazerem o trabalho de limpeza e de fiscalização da mesma.”

Gabriel Dutra, artista urbano e tatuador, é da opinião de que as cidades que disponibilizam mais espaços para arte urbana contribuem para uma diminuição do vandalismo. Sentado contra a parede de um café em Campo de Ourique que acaba de pintar a pedido dos donos, diz que o “graffiti ilegal vem da vontade das pessoas se quererem expressar, e o primeiro contacto é com a rua, é pintar e escrever nas paredes. Para mediar isso torna-se necessário incentivar o graffiti de forma legal, e mostrar que a expressão artística violenta pode ser canalizada. É bom também para o artista porque a sua mensagem deixa de ser vista de forma tão dura e negativa”.

Pinta somente em sítios legais cedidos pela Câmara Municipal de Lisboa ou em eventos privados, mas adora o graffiti que considera “puro”, o ilegal. “Poluição visual? Nem um pouco! Graffiti é a rua a falar”, exclama, com duas canetas na mão que usou para pintar a parede do café. Pintava no Rio de Janeiro, à noite e na rua, e explica que quando a prática é legal, perde-se a “pica”, a adrenalina e o stress que fazem o contexto do ilegal. “A cena da rua é real…Tem que ser rápido, tem que ser bem feito, tem que fluir. Isso de fazer uma coisa socialmente errada é uma sensação incrível”.

Hiver, por seu lado, não acredita que o graffiti legal reduza o vandalismo: “Criar espaços para pintar dentro das regras faz com que mais pessoas pintem legalmente, mas não faz com que menos pessoas pintem ilegalmente. Um caso ilustradror é o das Escadinhas do Lavra, onde o graffiti era permitido. Deixou de o ser e continua a ser pintado todas as semanas, as pessoas que pintam lá é que são diferentes”.

Surge então a questão de saber porque preferem pintar de forma ilegal. A isto, Hiver responde que gosta de “usar e reclamar o espaço público” e que prefere “ver uma cidade pintada e sentir que as pessoas estão presentes, em vez de estar rodeado de muros cinzentos”. Prix não se guia apenas pelo pelo lado estético e visual, diz que o graffiti ilegal é todo um movimento e que, mesmo que pare de o fazer, a prática há de permanecer. Guru vê o graffiti como uma zona de conforto, e aponta para um “detalhe esquecido”: “Fazer graffiti cultiva o ego. É bom passear pela cidade e ver a minha marca e a dos meus amigos por todo o lado. Sabe bem estar numa quantidade de sítios ainda maior do que estavas na semana passada”.

Sentimento de apropriação da cidade
O graffiti writer alimenta-se do espaço urbano. Aproveita a arquitetura da cidade para se exprimir de uma forma que não quer saber do consentimento. É o que explica Gonçalo Camarate, licenciado em Antropologia pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP), na sua tese “Olhar os muros: Uma abordagem etnográfica do Graffiti e Arte Urbana na cidade de Lisboa”. Pintar em locais não permitidos constitui uma atitude desafiante perante a sociedade, ao mesmo tempo que implica um desafio para quem o faz. Prix, que segue uma formação em cenografia na ARCO, explica porque prefere pintar na rua: “A rua é uma galeria aberta. É um cenário já montado em que tu só acrescentas. Tem um impacto maior e mais real!”.

Esse desafio é compensado pela satisfação em ver o seu nome espalhado pela cidade. É como se ao pintar e pousar a sua marca, o writer se tornasse ele próprio ator e se sentisse contribuir para a construção do espaço público. Foi o tema central da tese de Gonçalo Camarate, que acrescenta que “a metamorfose de espetador para ator faz-se com a apropriação dos muros da cidade”. Para tal, não hesitam em trepar fachadas de prédios, com a ajuda de escadotes ou com a força de braços dos amigos ao fazerem “pé-de-ladrão”. Entram em prédios abandonados, saltando muros e vedações.

Hiver e Guru já pintaram mesmo no topo de uma grua. Sempre alinhando o risco da ação com o prazer da adrenalina e de ver o nome escrito em sítios improváveis. Acrescenta Hiver que é “estimulante guardar uma memória nesses sítios onde a maioria dos cidadãos nunca irão”. Assim, o olhar do writer sobre o seu meio transforma-se. Passa o observar o que o rodeia e “começa a perceber a viabilidade de chegar a certos locais, o que não acontece no graffiti legal” como explica Gabriel Dutra.

É o paradoxo entre ter de ser discreto e querer obter a maior visibilidade possível que captiva Prix. Fala do graffiti como um “movimento oculto”, um “mistério visível” em que “ninguém sabe quem pinta, talvez até te cruzes com pessoas do meio, já viste as peças deles sem saber que são deles e só o descobres mais tarde por alguma coincidência”. A vontade de querer deixar o seu nome e o sentimento de satisfação que dá superam o medo de arriscar uma prática ilegal. Mas, como diz Prix, “graffiti não se resume a uma lata de spray e uma parede por pintar. É também todo o contexto que envolve”.

Ao procurar locais onde pintar, afastando-se da sua zona de conforto, descobrindo novos lugares, o graffiti writer deambula pela cidade como um explorador urbano. Ou como um“flâneur”, nas palavras de Hiver. Explica que a “flânerie consiste em andar pela cidade como forma de inspiração artística”. A palavra “flâner”, que em francês significa somente passear e observar sem grande atividade cerebral, foi retomada desta vez implicando uma ação. Acrescenta que “o graffiti writer é um flâneur, precisa de conhecer a cidade, e explora-a de maneira diferente”.

Quando comparam as várias cidades onde já pintaram, tanto Hiver como Gabriel Dutra reconhecem que a experiência é diferente. Assim, a própria cidade, o seu ambiente e a sua arquitetura influem na maneira de fazer graffiti e no próprio estilo. Gabriel Dutra explica: “A maneira de pintares em Lisboa, Paris, Berlim, Rio de Janeiro, é sempre diferente. Quando começas a entender a cidade, e como as pessoas percebem a cidade, tudo muda. É cultural. Inclusive as cores, as formas.”

Hiver, que pintou em Berlim, onde diz que “o graffiti é feito de traços grossos, escuros, e o que interessa é ser grande” explica que “em Lisboa, o graffiti é mais colorido, o traço mais redondo”. Com a experiência que teve em Berlim, reparou que lá “a ideia ao pintar uma parede é passar por cima de tudo, não interessa se estão janelas, persianas, portas”. Sente que em Lisboa o graffiti não é tão desrespeituoso. E que as características da cidade têm impacto no graffiti que se faz. Não só no estilo como na maneira de o fazer e na perceção que se tem da prática. Hiver dá como exemplo os azulejos, que considera serem peças artísticas e, portanto, “não devem ser cobertos com graffiti, porque quando uma coisa já é bela não precisas de embelezá-la mais”.

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