IMAGENS DE OVOODOCORVO
Portugal vassalo conformado do Protectorado Europeu?
(…) “ É aquilo que podemos chamar o “argumento de Vichy”, os
alemães ocupam a França, logo é patriótico aceitar essa ocupação porque não há
volta a dar.”
(…) “O problema que vai mais longe do que considerar existir
um tabu para se discutir a Europa, é o de se achar com toda a naturalidade, que
a Europa se tornou numa coisa não nomeável, que não precisa de ser discutida no
âmago da política portuguesa.”
(…) É a interiorização do protectorado, um certificado de
castração. E isso é particularmente destrutivo em democracia.
(...) "Infelizmente, vai
haver, e não será muito longe no tempo, uma entrada abrupta destes temas, -
“constrangimentos” europeus, dos mercados, das agências de rating, dívida e
deficit, poderes transnacionais sem controlo democrático, - na discussão
pública. Digo infelizmente, porque eles chegarão de repente e de forma dramática,
resultado do mundo de tempestades que se estão a alinhar um pouco por todo o
lado, entre a América de Trump e a Europa da “união” em decomposição (visto que
com a Europa de Salvini e de Orban ele não tem problemas), na Europa entre a
Alemanha, a França, a Hungria e a Itália, com o Brexit, com as “fronteiras” com duas autocracias
agressivas, a de Putin e a de Erdogan."
José Pacheco Pereira https://www.publico.pt/2018/07/07/politica/opiniao/por-que-e-que-a-vida-politica-portuguesa-esta-um-pantano-1837120
OVOODOCORVO
Por que é que a vida política portuguesa está um pântano?
O problema está na efectiva estagnação da vida política
portuguesa, que se encontra num pântano, em que as águas não se mexem, e,
quando se mexem, é por formas de vida pouco recomendáveis.
José Pacheco Pereira
7 de Julho de 2018, 7:13
No programa de debate que tenho com os meus companheiros na
SIC, a Quadratura do Círculo, existe um problema que me leva a protestar
(injustamente às vezes), e que se pode definir assim: está-se sempre a discutir
as mesmas coisas. Exemplos: a saúde ou falta dela da “geringonça”, “não há
dinheiro”, dívida e deficit, há ou não austeridade, etc.
Reconheço que não é por falta de outros temas ou de
imaginação em trazer outros menos discutidos, mas sim pela necessidade de
discutir os temas da actualidade semanal. Esta necessidade é muitas vezes
perversa, porque nos faz depender da muito pobre agenda política ou mediática,
embora a ordem correcta seja em primeiro lugar mediática e depois política, ou
político-mediática, porque é um conjunto inseparável. Mas a verdade é que o
problema está a montante da Quadratura, está na efectiva estagnação da vida
política portuguesa, que se encontra num pântano, em que as águas não se mexem,
e, quando se mexem, é por formas de vida pouco recomendáveis. É por isso que
não saímos do sítio e estamos sempre a falar do mesmo.
A estagnação das águas do pântano vem da conjugação da nossa
dívida, do nosso deficit, com os “constrangimentos” europeus, as “regras”
europeias”, emanando das obrigações do Tratado Orçamental e das políticas da
troika que estão bastante mais vivas do que se pensa. Perguntem a Centeno. O
pântano é vigiado pelos seus cães de fila, de dentro e, particularmente, de
fora. Esta fonte inquinada, que verdadeiramente nunca se discute a sério,
espalha-se pelo PS, pelo BE e pelo PCP, os partidos da “geringonça” que às claras ou incomodados, aceitam uma
governação subordinada ao Tratado, e vai para o PSD e para o PS que igualmente
aceitam, com mais gáudio, as mesmas “obrigações”. Com um parlamento desprovido
dos poderes essenciais do orçamento, de cima para baixo, para os partidos e
para os eleitores emana uma podridão que infecta toda a vida democrática. No
essencial torna-a menos democrática. O resultado é que toda a vida política se
desenvolve ao lado e fora do centro dos problemas, na periferia do que é mais
importante, adiando quaisquer medidas que nos permitissem, em Portugal e para
os portugueses, ter uma política mais conforme com as nossas necessidades e com
as nossas possibilidades. Assim, estamos condenados a décadas de estagnação,
nem muito mal, nem muito bem, na cauda da Europa.
Para se perceber o marasmo em que estamos, basta ver como
foram saudadas as intervenções, no recente congresso do PS, da sua “ala
esquerda” sem uma palavra sobre os “constrangimentos” europeus. Nem os que as
fizeram, nem os que as comentaram, notaram este simples facto: sem se falar das
relações entre Portugal e a União Europeia, o discurso ainda que seja neste
caso muito de esquerda, é de um impressionante vazio. O problema que vai mais
longe do que considerar existir um tabu para se discutir a Europa, é o de se
achar com toda a naturalidade, que a Europa se tornou numa coisa não nomeável,
que não precisa de ser discutida no âmago da política portuguesa. Eu percebo
que tal é a tradução no discurso político de uma impotência, da absoluta noção
de que é uma matéria sobre a qual não temos qualquer poder, nem soberania, e
por isso aceita-se como um hábito, um mau hábito. É a interiorização do
protectorado, um certificado de castração. E isso é particularmente destrutivo
em democracia.
O argumento mais importante da servidão é sempre a aceitação
da força, daquilo que a direita chamava a “realidade” numa demonstração única
de arrogância… filosófica. A variante para justificar ter as cabeças dentro do
pântano, é da não existência de alternativas. O “não há nada a fazer” é uma
espécie de bomba atómica do pensar e do fazer, destrói qualquer impulso para
defrontar os problemas de atraso e desenvolvimento do país, que não seja o de
obedecer ao que se nos impõe. Quando sequer se suscita esta questão, é ver de
imediato uma argumentação de 8 e 80, frases ad terrorem, um efectivo bloqueio
da discussão. É aquilo que podemos chamar o “argumento de Vichy”, os alemães
ocupam a França, logo é patriótico aceitar essa ocupação porque não há volta a
dar.
Infelizmente, vai haver, e não será muito longe no tempo,
uma entrada abrupta destes temas, - “constrangimentos” europeus, dos mercados,
das agências de rating, dívida e deficit, poderes transnacionais sem controlo
democrático, - na discussão pública. Digo infelizmente, porque eles chegarão de
repente e de forma dramática, resultado do mundo de tempestades que se estão a
alinhar um pouco por todo o lado, entre a América de Trump e a Europa da
“união” em decomposição (visto que com a Europa de Salvini e de Orban ele não
tem problemas), na Europa entre a Alemanha, a França, a Hungria e a Itália, com
o Brexit, com as “fronteiras” com duas
autocracias agressivas, a de Putin e a de Erdogan. A isso se acrescenta a
actual política portuguesa, do PSD-CDS ao PS, que é inerentemente instável.
Portugal não conta para nenhuma destas tempestades, mas será
atingido e duramente por elas. Então se verá como seria, pelo menos prudente,
deslocar a discussão e a política para fora do pântano.
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