Exposição “Futuros de Lisboa” quer pôr comunidade a
reflectir sobre mudanças na cidade.
Samuel Alemão
Texto
12 Julho, 2018
“Este será, certamente, um dos futuros de Lisboa: andar mais
a pé, até para contribuir para a descarbonização da cidade”, graceja o geógrafo
João Seixas, ainda esbaforido e em jeito de justificação para o ligeiro atraso,
dando assim conta da forma como se deslocou até ao Torreão Poente do Terreiro
do Paço, onde, a partir desta sexta-feira (13 de Julho) e até 18 de Novembro,
se poderá visitar a exposição “Futuros de Lisboa”. Apesar do discurso
frequentemente pessimista veiculado nas caixas de comentários online e nas
redes sociais sobre o rumo da capital portuguesa – com temas como a especulação
imobiliária, a gentrificação e a má qualidade dos transportes públicos a
dominarem as preocupações -, é bem mais aberta e incerta a visão de um dos três
comissários da mostra organizada pelo Museu de Lisboa, juntamente com o
arquitecto Manuel Graça Dias e a engenheira do ambiente e filósofa Sofia Vaz
Guedes. “Vivemos num tempo de profunda mudança, mas não quisemos apresentar
cenários concretos de futuro, embora brinquemos com alguns. O que pretendemos é
lançar questões”, diz, durante a apresentação feita aos jornalistas.
A atitude interrogativa e de especulação intelectual sobre
eventuais cenários, mais ou menos longínquos no tempo, para a vida em
comunidade na capital portuguesa, que guiou a construção da exposição, é a
mesma que se pede aos visitantes. “São várias propostas de reflexão, de
questionamento, quer a nós, organizadores, quer ao público. O que queremos é
que as pessoas façam perguntas, embora, no final da exposição, alguns até já
possam ter respostas”, diz João Seixas, assumindo a óbvia dificuldade de um
exercício de adivinhação do porvir. Daí também a necessidade de recorrer a um
conjunto de vozes das mais diversas áreas do conhecimento, para ajudar a
escrutinar o que poderá vir a caminho. Foi, por isso, pedido a diversos autores
que elaborassem 13 ensaios, reflectindo essa pluralidade de futuros – os quais
serão integrados no catálogo, a lançar em Setembro. “A cidade faz-se em
conjunto, com múltiplas perspectivas. Pretende-se que os visitantes cheguem ao
fim da exposição não com propostas, mas com algumas ideias de futuro”, diz o
comissário de uma mostra que se dividirá também entre “perspectivas sérias e
perspectivas lúdicas”, ao longo do percurso circular por uma dezena de salas.
Mas não será o jogo de previsão demasiado contrastante com
uma actualidade marcada por “mudanças vertiginosas”, como admite João Seixas, e
em relação às quais bastantes pessoas guardam um travo amargo? Afinal, a voz
corrente é que, fruto das grandes alterações em curso em Lisboa, muita gente
comum sente que esta deixou de ser a sua cidade. E em benefício de quem tem
dinheiro para cobrir os actuais preços especulativos. Poderá facilmente cair-se
num tom pessimista. “Não foi isso que sentimos”, diz Joana Sousa Monteiro, a
directora do Museu de Lisboa, na sala o Futuro pelas Pessoas, preenchida com
propostas feitas por cidadãos comuns em resposta ao repto lançado pela
organização. Durante um mês e meio, através do site da mostra e da participação
de escolas da cidade, foram recebidas 160 propostas, de entre as quais se
seleccionou meia centena, nas mais variadas formas: frases, contos,
fotografias, imagens trabalhadas, desenhos e peças jornalísticas. Se o tal pessimismo pressentido no discurso
de muitos poderia fazer supor uma espécie de “caixa de queixumes”, não foi isso
que detectaram tanto a directora do museu como o comissário da exposição, que
preferem destacar a “qualidade e a diversidade das participações”.
Recorrendo a imagens, vídeos, fotografias, documentos
diversos, objectos tecnológicos e obras de arte espalhados pelas salas
temáticas do piso superior e também na sala dos “Pilares de Lisboa”, no piso
inferior – sendo esta a primeira vez que se usam os dois pisos do Torreão
Poente para uma exposição, destaca Joana Sousa Monteiro -, a Futuros de Lisboa
alicerça-se em redor de três questões essenciais: “Como se pensa e como se tem
pensado o Futuro? Como se pensa e se tem pensado a Cidade? O que se poderá
afigurar como mais fundamental na construção de futuros para a cidade de
Lisboa?”. Perguntas que, dada a abrangência, são de resposta nada fácil – tanto que, para além da sala dos
Hipotéticos Futuros de Lisboa, e aludindo aos riscos associados à futurologia,
há mesmo uma sala das Dificuldades em Prever o Futuro. Em todo o caso, e apesar
de todas as dúvidas, pode-se discernir já um Futuro Inevitável, onde cabem
princípios e práticas hoje consensuais, tais como a reutilização, o consumo
ético, a desplastificação, a reparação, a desmaterialização ou a compostagem. É
nessa sala que podemos ver um bicicleta partilhada eléctrica do sistema Gira.
Um futuro que, afinal, já é presente.
Futuros de Lisboa
Museu de Lisboa – Torreão Poente da Praça do Comércio
De 13 de Julho a 18 de Novembro 2018, de terça a domingo,
das 10h às 18h (última entrada 17h30)
Preço: 3€
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