Esquerda reforça direito dos
inquilinos em caso de venda de imóveis e irrita proprietários
Projecto de lei limita
direito de propriedade. Tempo de arrendamento não conta para a opção de compra
e será obrigatória a constituição de propriedade horizontal.
ROSA SOARES e LUÍSA PINTO 14 de Julho de 2018, 7:00
O projecto de lei que vai reforçar os direitos de
preferência dos inquilinos no caso de venda dos imóveis já foi aprovado na
Comissão de Ambiente, com os votos favoráveis do PS, PCP e Bloco de Esquerda, o
que deverá garantir a sua aprovação final, em plenário, a 18 de Julho. O PSD
(que viu as suas propostas rejeitadas) e o CDS votaram contra as alterações,
que visam, em particular, as vendas de imóveis em conjunto, como está a
acontecer com as mais de 2000 casas da Fidelidade.
Com as alterações, um proprietário que queira vender o seu
imóvel terá sempre de dar o direito de preferência de aquisição aos inquilinos
que nele habitem, independentemente do tempo em que estejam do imóvel, e haja
propriedade horizontal ou não. Os inquilinos deverão pronunciar-se no prazo de
30 dias – quando actualmente dispõem de apenas oito dias – e o proprietário
está obrigado a discriminar o valor de cada fracção e do conjunto do imóvel que
pretende vender.
Estas alterações desagradam a proprietários, que vêem o seu
direito de propriedade reduzido, quando o direito de preferência é uma
excepção, “algo atípico”, como disse ao PÚBLICO a advogada Lourença Sousa Rita
do escritório de advogados José Pedro Aguiar Branco.
O impacto que as medidas podem ter junto de investidores em
imóveis para arrendamento habitacional também pode ser elevado. “Quando um
investidor pretende adquirir um prédio, quer fazê-lo na totalidade, e não de
forma fraccionada. E quer poder vendê-lo nas mesmas condições. Permitir que
haja uma fracção a bloquear um processo de compra e venda vai travar os
investidores”, disse Francisco Horta e Costa, director geral da consultora
imobiliária CBRE. Numa altura em que há uma grande escassez de oferta de casas
para arrendar, este consultor antevê uma ainda "maior retracção na
oferta".
A proposta de lei altera com profundidade o Código Civil em
termos de direito de propriedade e é passível de um aumento de litigância
judicial, refere ainda a advogada Lourença Sousa Rita, que se mostra preocupada
com “a quantidade de conceitos novos, de difícil compreensão, que acabam de ser
introduzidos”. Entre eles, está a questão da propriedade horizontal que, não
limitando o direito de preferência, obriga a posterior classificação dos
imóveis o que, em alguns casos, pode não ser possível. A classificação dos
prédios em propriedade horizontal (divisão em fracções) é um processo
burocrático, demorado e com custos.
Quando publicado, vai obrigar a que no caso dos imóveis em
propriedade horizontal, os proprietários tenham de comunicar ao inquilino o
preço que é atribuído à fracção que habitam, bem como dos demais valores
atribuídos aos imóveis vendidos em conjunto. Estipula ainda que no caso de
venda de imóveis em conjunto (nos termos do artigo 417 do Código Civil), passa
a ser obrigatório demonstrar “a existência de prejuízo apreciável, não podendo
ser invocada a mera contratualização da resolução do negócio com fundamento
para esse prejuízo”, apurou o PÚBLICO.
No caso de imóveis não constituídos em propriedade
horizontal, como os imóveis que pertençam a um só proprietário, os
arrendatários terão os mesmos direitos de preferência, mas, neste caso, apenas
sobre a quota-parte do prédio que habitam, e à qual terá de ser atribuído um
valor proporcional face ao valor total da transmissão.
Neste tipo de imóveis e caso não tenha sido entretanto
requerida junto da entidade competente a constituição da propriedade
horizontal, deve o inquilino, neste caso já comprador, no prazo de seis meses,
a contar da data da compra do local arrendado, propor uma “acção judicial de
divisão de coisa comum”, como está previsto no Código de Processo Civil.
Ao que o PÚBLICO apurou, no caso de não ser pedida ou não
conseguida a classificação de propriedade horizontal, o contrato de compra do
local arrendado será nulo e o inquilino deverá indemnizar o proprietário “pelos
danos que este comprovadamente tiver sofrido pelo exercício do direito de
preferência”.
Outra alteração complexa, segunda a jurista contactada pelo
PÚBLICO, prende-se com a “novidade” de os arrendatários de um imóvel impossível
de classificar em propriedade horizontal poderem exercer os seus direitos de
preferência em conjunto, adquirindo, “na proporção, a totalidade do imóvel em
compropriedade”.
Recorde-se que na venda do vasto património da Fidelidade
não foi dado direito de preferência aos inquilinos das respectivas fracções,
mas apenas pelo conjunto dos imóveis, com um custo de 425 milhões de euros.
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