OPINIÃO
Um desenho para
Maria Flor Pedroso
Não sei o que é
pior e mais significativo – se fazer tantas asneiras em sequência, se não compreender
a gravidade das asneiras que fez, ao ponto de ir confessar tudo para uma
reunião do conselho de redacção da RTP e assinar a acta no final. É de uma
candura quase comovente.
JOÃO MIGUEL
TAVARES
14 de Dezembro de
2019, 6:26
Devo dizer que
não sei o que é mais espantoso. Se a directora de informação da RTP, Maria Flor
Pedroso, assinar uma acta onde confessa que andou a fazer perguntas e a dar
conselhos sobre um caso em investigação, acerca do qual tinha um claríssimo
conflito de interesses; se depois de ter assinado essa acta não conseguir
sequer perceber que a sua situação é insustentável e que o único caminho
possível é a demissão.
Maria Flor
Pedroso aceitou o cargo de directora da RTP apesar de ser uma familiar próxima
do primeiro-ministro, chegando a moderar um debate eleitoral entre António
Costa e Rui Rio – e não percebeu que mal é que isso tinha. Maria Flor Pedroso
suspendeu pela primeira vez o programa Sexta às 9 em período de eleições,
atirando para o pós-legislativas uma reportagem embaraçosa para o governo – e
não percebeu que mal é que isso tinha. Maria Flor Pedroso andou a fazer
perguntas no instituto superior em que trabalha acerca de uma investigação da
RTP sobre esse mesmo instituto, dando início a uma sequência de acontecimentos
que exterminou a investigação – e não percebeu que mal é que isso tinha.
Alguém deveria
apresentar o conceito de conflito de interesses à directora da RTP. “Maria Flor
Pedroso, estes são os conflitos de interesses; conflitos de interesses, esta é
a Maria Flor Pedroso; agora, por favor, conversem um bocadinho, para se ficarem
a conhecer melhor.” Não sei, de facto, o que é pior, e mais significativo – se
fazer tantas asneiras em sequência, se não compreender a gravidade das asneiras
que fez, ao ponto de ir confessar tudo para uma reunião do conselho de redacção
da RTP e assinar a acta no final. É de uma candura quase comovente, mas receio
que essa candura só agrave o caso, porque revela uma mistura de impunidade e
inimputabilidade que não dignifica nem a jornalista, nem a RTP.
Tudo o que se
segue está escrito na acta do conselho de redacção que Flor Pedroso subscreveu.
O programa Sexta às 9 tinha em mãos uma investigação sobre o Instituto Superior
de Comunicação Empresarial (ISCEM) e a sua gestão. Maria Flor Pedroso, docente
do ISCEM desde 2006, decidiu por sua própria iniciativa averiguar na secretaria
do instituto “se estava a ser exigido aos alunos que pagassem os emolumentos em
dinheiro vivo”. Flor Pedroso informou Cândida Pinto, directora-adjunta da RTP,
que o ISCEM não tinha multibanco. Cândida Pinto (sem jamais referir Flor
Pedroso) informou a jornalista responsável pela reportagem que alguém lhe tinha
dito que não havia multibanco no ISCEM e que “poderia ser essa a explicação”
para os pagamentos em dinheiro vivo.
Flor Pedroso
admitiu tudo isto na reunião, pediu desculpas, e disse que apenas “tentou
ajudar”, uma vez que “tinha acesso a fontes não alcançáveis pelos jornalistas”
do programa. Sempre sem dizer uma palavra à equipa do Sexta às 9, a directora
da RTP falou ainda com a principal investigada do caso, Regina Moreira, ainda
que garanta não lhe ter dado qualquer informação. O certo é que Moreira referiu
o nome de Flor Pedroso à jornalista que a investigava, saiu a correr para
saldar as dívidas e matou a investigação.
Nunca, no
decorrer deste processo, a directora da RTP parece ter achado que o facto de
ser professora no ISCEM a obrigava a manter total distância do caso. Esta
inconsciência é inaceitável. Há 14 meses, Paulo Dentinho saiu da direcção da
RTP por causa de um comentário foleiro que fez sobre Cristiano Ronaldo no
Facebook. Pergunto: será isto menos grave?
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