OPINIÃO
Qual é o problema
com a maçonaria no PSD?
Fazer parte da
maçonaria, para quem se formou politicamente dentro do PSD nos tempos mais
recentes, nada tem que ver com os maçons sociais-democratas do passado.
JOSÉ PACHECO
PEREIRA
21 de Dezembro de
2019, 6:53
Em teoria,
nenhum. O PSD, como quase todos os partidos portugueses, teve e tem gente da
maçonaria. O problema é que não é a mesma coisa ter tido Nuno Rodrigues dos
Santos, ou Emídio Guerreiro, ou Leonardo Ribeiro de Almeida como maçons dentro
do PSD, ou ter Miguel Relvas. É que eles não “usam” a maçonaria da mesma
maneira, eles têm lá as lojas, os nomes simbólicos, as iniciações, os aventais,
mas são duas coisas muito distintas. E os maçons que hoje têm posições
dirigentes nas estruturas locais, principalmente em Lisboa e Porto, assim como
os que são candidatos, nada têm que ver com os maçons da génese do PPD, que
estavam lá não por serem maçons mas, sim, porque vinham da oposição republicana
moderada e essa tradição era desejada pelos fundadores do PPD como elemento
legitimador do jovem partido. Acresce que nem todas as “obediências” são iguais
e algumas estiveram nos últimos anos envolvidas em casos de corrupção e tráfico
de influências.
A maçonaria que
vinha da geração republicana estava no PPD porque uma parte da oposição
moderada não comunista entrou para o partido logo na sua fase fundacional.
Aliás, Nuno Rodrigues dos Santos tentou trazer para o PPD os seus amigos do
Directório Democrático-Social, muitos dos quais maçons, numa tentativa que
falhou. O grande veto nesses anos, logo em 1974-5, para os recrutamentos para o
PPD não era a maçonaria, mas a pertença à União Nacional e à sua sucessora
Acção Nacional Popular (ANP). Sá Carneiro e os seus companheiros fundadores
fizeram todos os esforços para vetar a entrada de filiados com essa origem.
Mesmo os embrionários “serviços de informação” do PPD, que existiram em 1975,
uma das coisas que faziam era verificar as fichas de adesão para evitar a
entrada de membros da ANP. Embora tenha havido excepções, principalmente no
Porto, e nalgumas estruturas locais, em que entraram antigos membros da ANP,
esse veto existia e está bastante documentado nos documentos iniciais do PPD
como sendo uma das preocupações centrais de Sá Carneiro.
Dito isto, a
cultura política das “bases” do PPD e depois do PSD tinha duas componentes
marcantes: era anticomunista e antimaçónica, e esses “anti” tinham que ver com
a composição social do partido moldado nos anos do PREC. O anticomunismo era
essencialmente o anti-PREC, e a antimaçonaria era o anti-PS. Mas neste último
caso ia-se mais longe para a percepção popular, que juntava elementos
verdadeiros com imaginários, que atribuíam ao segredo maçónico, e à ajuda mútua
entre maçons, uma conspiração permanente pelo controlo secreto do poder
político. Ora, este elemento de recusa de uma organização secreta que era
transversal aos partidos políticos, e que explicava promoções, carreiras,
negócios, escolhas, e acima de tudo protecções, fazia e ainda faz parte da
cultura política das “bases” do PSD.
Era mais fácil
admitir que os socialistas fossem maçons quase por regra, mas era visto com
muita desconfiança que houvesse PSD que o fossem. É por saberem que é assim
que, quando se suscitou a questão de haver candidatos à liderança do PSD que
eram maçons, os dois candidatos que tinham ou têm ligações à maçonaria, e que
sabem que essa filiação ainda é pestífera dentro do partido, vieram negar a sua
pertença, ou afirmar que foi apenas uma relação passageira lá muito no passado.
Compreende-se que o façam, mas só a ignorância dos rituais maçónicos, a começar
pelos seus aspectos iniciáticos, é que pode atribuir a essa pertença uma
ligeireza que nunca existiu. Fazer parte da maçonaria é uma ligação “pesada” e
densa, que não tem comparação com a pertença a um clube desportivo ou a uma
associação de desenvolvimento regional. E fazer parte da maçonaria, para quem
se formou politicamente dentro do PSD nos tempos mais recentes, nada tem que ver
com os maçons sociais-democratas do passado. Já se fossem para a Opus Dei, aí
não me espantaria.
Se eu sei qual a
presença das tradições clássicas da maçonaria no aparelho do PS, na política e
na ideologia, quase natural pela história dos socialistas, vejo com muita
dificuldade que essa presença exista qualitativamente no PCP, ou no Bloco, ou…
no PSD. Todos têm maçons, mas não é a mesma coisa: as duas primeiras
instituições não lhes permitem usar a maçonaria para efeitos de poder interno,
mas na evolução recente do PSD, associada à viragem à direita nos anos da
troika, já é outra história.
O que sobra então
na atracção pela maçonaria de gente que vem de zonas cultural e politicamente
tão alheias, e cuja história partidária tem muito que ver com a inflexão de
carreiras feitas na sociedade para carreiras feitas dentro do partido ocorrida
nos últimos anos? Não é certamente o amor pelo Supremo Arquitecto, mas o
incremento do poder que dá pertencer a um grupo que pode dar “conhecimentos”,
oportunidades, negócios, relações e protecções, e que pode ser uma alavanca
almofadada para ambições políticas. É como no reclame do Restaurador Olex, um
negro com cabelo louro ou um branco de carapinha não é natural, o que é natural
é cada um usar o cabelo com que nasceu. Poupo-vos a descrição do que neste caso
significa para homens maduros ter o cabelo louro ou carapinha e andar de
avental e luvas brancas num partido como o PSD.
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