OPINIÃO
A Face Oculta do
Orçamento do Estado
Uma das maiores
rubricas do OE 2020 é constituída, tal como nos anos anteriores, por despesas
excepcionais. São sete mil milhões de gastos camuflados.
PAULO MORAIS
21 de Dezembro de
2019, 5:50
O Orçamento do
Estado, agora apresentado para o ano 2020 (OE 2020), continua a ser um motor
que empobrece o país. É reiteradamente o mecanismo através do qual, de forma
encapotada, o Estado garante os privilégios dos poderosos e canaliza os
recursos de todos para os maiores grupos económicos. Não admira, pois, que
aquando da sua apresentação pública, o ministro das Finanças tenha omitido
algumas das despesas previstas mais significativas.
Uma das maiores
rubricas do OE 2020 é constituída, tal como nos anos anteriores, por despesas
excepcionais. São sete mil milhões de gastos camuflados. Esta verba é
equivalente ao que se gasta em Educação e representa muito mais do que é
investido em qualquer outra função primordial do Estado, da Justiça à
Segurança. As “excepções” consomem, no seu conjunto, mais do que se colecta em
IRC, em todo um ano. Mas, para além de extraordinárias, as despesas são
iníquas.
Em participações
de capital irão ser despendidos 1600 milhões de euros, sem quaisquer benefícios
para os cidadãos. Esta é, aliás, uma prática reiterada nos últimos anos: em
2017 foram cinco mil milhões para a CGD, em 2019 quatro mil milhões para parte
incerta; continuará a sangria em 2020. Surpreendentemente, ninguém questiona
Costa ou Mário Centeno sobre estas “bagatelas”.
São também
despesas excepcionais as contribuições para o Fundo de Resolução da Banca, em
montante superior a 1700 milhões de euros. Serão os 600 milhões para o Novo
Banco que Centeno anunciou e mais 1100 milhões que o ministro omitiu. Estas
transferências constituem um apoio absurdo à banca. Vamos já no quinto ano –
desde a falência do BES, em 2014 – em que milhares de milhões dos nossos
impostos são enterrados numa banca perdulária e fonte de inúmeros negócios
corruptos. Aos apoios à banca, os governos não impõem qualquer limite. O Estado
chega ao ponto de, em 2020, continuar a injectar dezenas de milhões no BPN, 11
anos depois da nacionalização que custou aos portugueses cerca de sete mil
milhões e oito anos depois da sua venda, em saldo, ao BIC. Justificam-no como
“despesas de reprivatização”. Fantástico: o Estado, que vendeu, é que continua
a pagar!
No OE estão
também previstas como extraordinárias as participações de capital, que orçam em
1600 milhões de euros. A que se soma ainda uma transferência para a Parpública
de 950 milhões. Este tipo de gastos vem, aliás, na sequência de anos e anos de
injecções de capital sempre mal explicadas, nas mais diversas entidades.
Além de jorrar
dinheiro a rodos no sector financeiro, além de canalizar fundos para empresas
mal geridas, o erário público irá também favorecer, com recursos quase
ilimitados, os concessionários das parceiras público-privadas (PPP), muito em
particular as rodoviárias. No próximo ano, serão 1500 milhões em rendas pelas
ruinosas PPP rodoviárias, quantia que irá aumentar em 2021. Estas são verbas
obscenas, já que o valor adequado seria de 340 milhões, se respeitados os
cálculos disponibilizados pelo organismo de estatísticas europeias, o Eurostat.
O pagamento das PPP rodoviárias irá, por mais um ano, reflectir um custo cinco
vezes superior ao valor do activo – tal como nos anos anteriores e como está
previsto vir a ocorrer nos próximos 17 anos... pelo menos! Só esta rubrica
representará, em 2020, um esbanjamento de 1200 milhões de euros.
Ao OE 2020 falta,
para além do mais, coerência e proporcionalidade. Gastar-se-á quase tanto num
inexplicável apoio à Grécia como na valorização das Forças Armadas nacionais ou
até na construção de hospitais em todo o país – entre muitos exemplos de
incongruências gritantes. E assim se derretem os recursos provenientes dos
impostos dos cidadãos. De forma dissimulada, desviam-se todos os recursos que
deveriam ser aplicados nas funções que o Estado devia cumprir com zelo, na área
da Educação ou da Saúde. Recursos canalizados para um restrito grupo de
privilegiados e para despesas sem qualquer racionalidade social ou económica.
Mesmo com estas
características, o OE 2020 irá certamente ser aprovado, beneficiando do apoio
duma esquerda adormecida, com o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista como
cúmplices da entrega de milhões à banca e aos concessionários das PPP.
Inexplicavelmente, PSD e CDS também não denunciam estes desmandos, numa atitude
que revela uma de duas: incompetência assumida ou cumplicidade envergonhada.
Presidente da Frente Cívica
Sem comentários:
Enviar um comentário