segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

Centro histórico de Lisboa perdeu 14,6% dos eleitores em cinco anos



Centro histórico de Lisboa perdeu 14,6% dos eleitores em cinco anos
Freguesias de Santa Maria Maior e Misericórdia, que integram bairros como Alfama, Mouraria, Castelo e Bairro Alto, concentram 45% do alojamento local de toda a cidade. (Publicado originalmente a 18 de outubro de 2018)

Alfama é um dos bairros onde não poderão abrir mais alojamentos locais© Filipa Bernardo/ Global Imagens
Susete Francisco
18 Outubro 2018 — 17:39

As freguesias do coração histórico de Lisboa perderam, entre 2013 e 2017, 14,6% dos seus eleitores - ou seja, em traços largos, de residentes. A perda atinge a mesma proporção em Santa Maria Maior e na Misericórdia, que no conjunto integram os bairros de Alfama, Mouraria, Castelo, Chiado, Bairro Alto e Madragoa. Um decréscimo que é coincidente no tempo com o boom do turismo na capital. E junta-se a outro dado relevante: nesta altura, as duas freguesias concentram 45% do alojamento local (AL) registado em toda a cidade de Lisboa.

Os números constam do "Estudo Urbanístico do Turismo em Lisboa", feito pela Câmara Municipal para fundamentar a criação de zonas de contenção ao alojamento local na cidade, a que o DN teve acesso.

De acordo com o estudo, a generalidade das freguesias lisboetas sofreu uma perda de eleitores nos últimos cinco anos, mas o decréscimo mais expressivo é precisamente no centro histórico. E, logo a seguir, surgem outras duas freguesias onde o alojamento local tem vindo a ganhar grande expressão: São Vicente, que integra o bairro da Graça, perdeu 9,5% dos eleitores. E a freguesia de Santo António, que tem menos 8,3% de eleitores.

As causas desta diminuição não são especificadas, mas fica claro que a perda de residentes ocorre em simultâneo com um crescimento exponencial dos fogos afetados a alojamento local. Em Santa Maior, a freguesia de Lisboa com mais AL, estavam registados em agosto deste ano 3672 alojamentos locais. A abertura de novas unidades aumentou exponencialmente nos últimos anos. Em 2013 abriram 42 estabelecimentos, em 2014 já foram 231, um ano depois 596, em 2016 abriram 855, o ano passado 928, e este ano, até 21 de agosto, 912.

O fenómeno é idêntico na Misericórdia, que tem registados 2942 estabelecimentos para arrendamento de curta duração, com aumentos ao ano na ordem das centenas.

Há um outro dado relevante que consta do estudo, referente à propriedade da habitação, e que enquadra as sucessivas notícias de despejos nos bairros mais antigos da capital - "É nas freguesias do centro histórico que ainda é mais alta a percentagem de fogos arrendados". Em Santa Maria Maior, 72% dos fogos são arrendados - é a maior percentagem da cidade. Logo a seguir surge a Misericórdia, com 63% das casas em regime de arrendamento.

O estudo da câmara de Lisboa é claro na conclusão de que a mudança de uso de edifícios habitacionais para turismo - nas sua diversas modalidades - tem "retirado um número de fogos muito relevante ao stock de habitação permanente e provocado uma forte pressão inflacionista no mercado imobiliário em Lisboa". Esta pressão, "muito sentida no centro histórico, está a atingir de forma mais ou menos acentuada todas as freguesias de Lisboa".

O relatório salienta que "de algum modo, a redução de stock de habitação tem sido compensada com a reabilitação de prédios que estavam em ruína/devolutos e em mau/péssimo estado de conservação". Os dados apontam para 1675 edifícios declarados devolutos e ocupados com AL, um fenómeno que também é mais expressivo nos bairros históricos. No caso do Castelo/Alfama/Mouraria, 25% do total de alojamentos locais situa-se em imóveis que estavam declarados como devolutos. No Bairro Alto e Madragoa a percentagem é de 20%.

Mais de um quarto das casas são alojamento local
Conclusões que vêm juntar-se às que foram conhecidas na passada semana - resultado de uma apresentação preliminar deste estudo, então noticiada pelo DN -, segundo as quais mais de um quarto dos fogos nos bairros do Castelo, Alfama, Mouraria, Bairro Alto e Madragoa estão afetos ao alojamento local.

LISBOA
Em cinco bairros de Lisboa, mais de 25% das casas são alojamento local
Este é precisamente o critério usado pela autarquia para definir as futuras áreas de contenção, onde vai deixar de ser possível abrir novas unidades para arrendamento de curta duração - uma possibilidade prevista na nova lei do alojamento local, que entra em vigor na próxima segunda-feira.

Castelo, Alfama, Mouraria, Bairro Alto e Madragoa já ultrapassaram a fasquia - os três primeiros bairros, situados na freguesia de Santa Maria Maior, já vão nos 29%; os dois últimos estão nos 27%.Mas há outras áreas da cidade de Lisboa que já estão em cima do valor limite. É o caso da Avenida da Liberdade, da Avenida da República e da Avenida Almirante Reis.

A declaração daqueles bairros como zona de contenção vai avançar já, antes da criação do regulamento municipal sobre esta matéria, e pode vigorar pelo período de um ano. Após este prazo, a zona de contenção pode ser mantida, já à luz do regulamento camarário, tendo de ser revista (pode ser mantida ou não) após dois anos.

Escritórios dão lugar a turismo e habitação
O estudo da câmara de Lisboa levanta também o cenário de o turismo e a habitação estarem a ocupar espaços até agora reservados a serviços - "É de sublinhar o movimento de deslocalização e reorganização dos escritórios que se verifica na cidade, tendência esta que se acentuou nos últimos dois anos".

De acordo com os dados da autarquia "estima-se que já foram subtraídos, como espaços de escritórios, cerca de 600.000 metros quadrados, os quais foram reocupados por habitação e turismo".

(Publicado originalmente a 18 de outubro de 2018)

Sem comentários: