Centro histórico de Lisboa perdeu 14,6% dos eleitores em
cinco anos
Freguesias de Santa Maria Maior e Misericórdia, que integram
bairros como Alfama, Mouraria, Castelo e Bairro Alto, concentram 45% do
alojamento local de toda a cidade. (Publicado originalmente a 18 de outubro de
2018)
Alfama é um dos bairros onde não poderão abrir mais
alojamentos locais© Filipa Bernardo/ Global Imagens
Susete Francisco
18 Outubro 2018 — 17:39
As freguesias do coração histórico de Lisboa perderam, entre
2013 e 2017, 14,6% dos seus eleitores - ou seja, em traços largos, de
residentes. A perda atinge a mesma proporção em Santa Maria Maior e na
Misericórdia, que no conjunto integram os bairros de Alfama, Mouraria, Castelo,
Chiado, Bairro Alto e Madragoa. Um decréscimo que é coincidente no tempo com o
boom do turismo na capital. E junta-se a outro dado relevante: nesta altura, as
duas freguesias concentram 45% do alojamento local (AL) registado em toda a
cidade de Lisboa.
Os números constam do "Estudo Urbanístico do Turismo em
Lisboa", feito pela Câmara Municipal para fundamentar a criação de zonas
de contenção ao alojamento local na cidade, a que o DN teve acesso.
De acordo com o estudo, a generalidade das freguesias
lisboetas sofreu uma perda de eleitores nos últimos cinco anos, mas o
decréscimo mais expressivo é precisamente no centro histórico. E, logo a
seguir, surgem outras duas freguesias onde o alojamento local tem vindo a
ganhar grande expressão: São Vicente, que integra o bairro da Graça, perdeu
9,5% dos eleitores. E a freguesia de Santo António, que tem menos 8,3% de
eleitores.
As causas desta diminuição não são especificadas, mas fica
claro que a perda de residentes ocorre em simultâneo com um crescimento
exponencial dos fogos afetados a alojamento local. Em Santa Maior, a freguesia
de Lisboa com mais AL, estavam registados em agosto deste ano 3672 alojamentos
locais. A abertura de novas unidades aumentou exponencialmente nos últimos
anos. Em 2013 abriram 42 estabelecimentos, em 2014 já foram 231, um ano depois
596, em 2016 abriram 855, o ano passado 928, e este ano, até 21 de agosto, 912.
O fenómeno é idêntico na Misericórdia, que tem registados
2942 estabelecimentos para arrendamento de curta duração, com aumentos ao ano
na ordem das centenas.
Há um outro dado relevante que consta do estudo, referente à
propriedade da habitação, e que enquadra as sucessivas notícias de despejos nos
bairros mais antigos da capital - "É nas freguesias do centro histórico
que ainda é mais alta a percentagem de fogos arrendados". Em Santa Maria
Maior, 72% dos fogos são arrendados - é a maior percentagem da cidade. Logo a
seguir surge a Misericórdia, com 63% das casas em regime de arrendamento.
O estudo da câmara de Lisboa é claro na conclusão de que a
mudança de uso de edifícios habitacionais para turismo - nas sua diversas
modalidades - tem "retirado um número de fogos muito relevante ao stock de
habitação permanente e provocado uma forte pressão inflacionista no mercado
imobiliário em Lisboa". Esta pressão, "muito sentida no centro
histórico, está a atingir de forma mais ou menos acentuada todas as freguesias
de Lisboa".
O relatório salienta que "de algum modo, a redução de
stock de habitação tem sido compensada com a reabilitação de prédios que
estavam em ruína/devolutos e em mau/péssimo estado de conservação". Os
dados apontam para 1675 edifícios declarados devolutos e ocupados com AL, um
fenómeno que também é mais expressivo nos bairros históricos. No caso do
Castelo/Alfama/Mouraria, 25% do total de alojamentos locais situa-se em imóveis
que estavam declarados como devolutos. No Bairro Alto e Madragoa a percentagem
é de 20%.
Mais de um quarto das casas são alojamento local
Conclusões que vêm juntar-se às que foram conhecidas na
passada semana - resultado de uma apresentação preliminar deste estudo, então
noticiada pelo DN -, segundo as quais mais de um quarto dos fogos nos bairros
do Castelo, Alfama, Mouraria, Bairro Alto e Madragoa estão afetos ao alojamento
local.
LISBOA
Em cinco bairros de Lisboa, mais de 25% das casas são
alojamento local
Este é precisamente o critério usado pela autarquia para
definir as futuras áreas de contenção, onde vai deixar de ser possível abrir
novas unidades para arrendamento de curta duração - uma possibilidade prevista
na nova lei do alojamento local, que entra em vigor na próxima segunda-feira.
Castelo, Alfama, Mouraria, Bairro Alto e Madragoa já
ultrapassaram a fasquia - os três primeiros bairros, situados na freguesia de
Santa Maria Maior, já vão nos 29%; os dois últimos estão nos 27%.Mas há outras
áreas da cidade de Lisboa que já estão em cima do valor limite. É o caso da
Avenida da Liberdade, da Avenida da República e da Avenida Almirante Reis.
A declaração daqueles bairros como zona de contenção vai
avançar já, antes da criação do regulamento municipal sobre esta matéria, e
pode vigorar pelo período de um ano. Após este prazo, a zona de contenção pode
ser mantida, já à luz do regulamento camarário, tendo de ser revista (pode ser
mantida ou não) após dois anos.
Escritórios dão lugar a turismo e habitação
O estudo da câmara de Lisboa levanta também o cenário de o
turismo e a habitação estarem a ocupar espaços até agora reservados a serviços
- "É de sublinhar o movimento de deslocalização e reorganização dos
escritórios que se verifica na cidade, tendência esta que se acentuou nos
últimos dois anos".
De acordo com os dados da autarquia "estima-se que já
foram subtraídos, como espaços de escritórios, cerca de 600.000 metros
quadrados, os quais foram reocupados por habitação e turismo".
(Publicado originalmente a 18 de outubro de 2018)
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