Será possível definir um limite máximo de turistas em
Lisboa? PCP acha que sim
Samuel Alemão
28 Agosto, 2018
A ideia de que Lisboa ultrapassou, há muito, o limite da
capacidade para acolher turistas tem vindo a generalizar-se. É até frequente
ouvir quem habita ou trabalha na capital portuguesa confessar publicamente não
ter mais paciência para tamanho influxo de visitantes. Seja pela influência que
tal fenómeno tem sobre os preços praticados no comércio, seja pela escassez de
habitação de longa duração devido ao crescimento do alojamento local e ainda
pela hiper-especialização das lojas do centro – ou até pela pura embirração por
se ver tanta gente a atrapalhar a circulação nos passeios -, são muitos os que
dizem “isto já é de mais”. É a pensar sobretudo nos problemas causados na
oferta de da habitação a preços razoáveis que o PCP quer agora ver definida a
Capacidade de Carga Turística (CCT) para Lisboa, à imagem do que fizeram já
outras cidades europeias. Trata-se de criar um instrumento para a “prevenção
dos impactos negativos do turismo intenso”, estabelecendo valores máximos para
a actividade.
A proposta dos vereadores comunistas, que será apresentada
em detalhe aos jornalistas, na manhã desta terça-feira (28 de Agosto), foi
entregue em Julho passado na Câmara Municipal de Lisboa (CML), aguardando
agendamento para discussão em reunião de vereação. Um debate que promete
evidenciar, ainda mais, as divergências existentes sobre o assunto. Apesar de
Fernando Medina (PS) ter já dito, por diversas vezes, ser favorável à imposição
de quotas à actividade do alojamento local em certas zonas da cidade, também
lhe são conhecidas declarações confessando não entender o que será, afinal, ter
turismo “a mais”. Há, contudo, quem pareça saber. Nomeadamente a Organização
Mundial do Turismo, que definiu o conceito de Capacidade de Carga Turística
(CCT) como “o número máximo de pessoas que podem visitar determinado local
turístico, sem afectar o meio físico, económico ou sociocultural e sem reduzir
de forma inaceitável a qualidade da experiência dos visitantes”, salienta o PCP
na sua proposta.
Os vereadores comunistas consideram ser essa a melhor forma
de balizar os limites na utilização do espaço da cidade por parte da actividade
turística, permitindo que a mesma se decorra “no quadro de uma perspectiva de
desenvolvimento urbano sustentável e equilibrado”. Por isso, pedem à Câmara de
Lisboa que o conceito de Capacidade de Carga Turística passe a fazer parte dos
processos de planeamento e ordenamento da cidade, nas diferentes escalas de
planeamento urbano –seja o Plano Director Municipal (PDM) ou os planos de
urbanização (PU) e de pormenor (PP) -, “enquanto forma de estabelecer os
limites críticos da intensidade turística no território da cidade”. E propõem
que esse diagnóstico do impacto turístico a nível local, envolvendo não apenas a
CML como universidades, associações e outras organizações da sociedade civil,
passe a ter reflexos na revisão do Plano Director Municipal (PDM). Pede-se
ainda a elaboração de uma “Carta do Turismo de Lisboa como instrumento de
suporte ao diagnóstico, planeamento e ordenamento da actividade turística”.
É nas freguesias do centro histórico de Lisboa que o
problema se coloca com mais acuidade.
Nos considerandos da sua proposta, os eleitos do PCP
salientam que “em várias cidades com dinâmicas intensas de turismo, como
Amesterdão e Barcelona, foram efectuados estudos para avaliação dos impactos
causados pelo turismo, com base no conceito de Capacidade de Carga Turística,
enquanto ferramenta de planificação e de ordenamento da actividade turística,
aferindo-se a sustentabilidade desta actividade na relação com a cidade”. E são
ainda lembrados estudos recentes, como o intitulado ‘Novas Dinâmicas do Centro
Histórico de Lisboa’, elaborado por uma consultora a pedido das juntas de
freguesia de Santa Maria Maior, Misericórdia e São Vicente, e divulgado em
Janeiro deste ano, nos quais se dá conta do perigo de destruição da identidade
dessas áreas, consequência da sobre-especialização turística das mesmas.
A alternativa a tal transformação, dizem os comunistas,
“passa pela promoção de um desenvolvimento turístico urbano que reequilibre a
economia urbana através da geração de dinâmicas e actividades novas,
potenciando a regeneração urbana em várias dimensões da vida social urbana, mas
mitigando os impactos negativos introduzidos nas comunidades de destino”. O que
implica a “integração equilibrada” do turismo com outros sectores da economia e
sociedade urbanas, tais como a habitação, os transportes, a energia, os
resíduos e o emprego”. Na apresentação deste conjunto de propostas, além dos
vereadores do PCP, estará presente o geógrafo Luís Mendes, voz destacada na
denúncia na capital portuguesa do processo de gentrificação – a apropriação por
classes afluentes de espaços urbanos antes desqualificados -, o qual tem
apontado o dedo à ligação entre a actividade turística e os fundos imobiliários
especulativos.
Em Setembro de 2016,
o presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina, afirmou desconhecer o perigo
da existência de um excesso de actividade turística na capital. “Oiço aí, por
vezes, aquela pergunta muito interessante que é saber se Portugal, Lisboa em
particular, já tem turistas a mais. Pessoalmente, tenho de dizer que não sei
que conceito é esse, não sei o que é ter turistas a mais”, disse, na altura,
numa conferência organizada pela Confederação do Turismo Português.
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