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Terá Marcelo ficado 'desagradado', comos muitos insinuam,
com a forma de como a investigação de Joana Marques Vidal se aproximou dele ?
OVOODOCORVO
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Aprende, Joana: em Portugal manda o PS
Se Governo e Presidente queriam tanto alguém com o perfil de
Joana Marques Vidal, porque é que não voltaram a convidar Joana Marques Vidal?
João Miguel Tavares
21 de Setembro de 2018, 16:20
Um comunicado às 21h, já depois de ter passado a hora dos
telejornais e a possibilidade de os diários trazerem grandes reacções pela
manhã. Em dia de futebol, para os canais por cabo não dedicarem demasiado tempo
ao assunto, já que era indispensável debater as incidências do formidável
Sporting-Qarabag. Na despedida de Marcelo da universidade, para que o tempo de
antena presidencial fosse ocupado por um fait-divers académico-social, em vez
da substituição da procuradora-geral da República. Esta é a estratégia de duas consciências
pesadas, muito reveladora das verdadeiras intenções de António Costa e de
Marcelo Rebelo de Sousa.
O ex-amigo de José Sócrates e o ainda amigo de Ricardo
Salgado nunca quiseram a continuação de Joana Marques Vidal. O que eles
queriam, como um membro do Governo explicou ao PÚBLICO, era “evitar tentações
de messianismos populistas”. Aquilo de que Costa e Marcelo sentiram absoluta
necessidade foi de o poder político mostrar ao poder judicial que a separação
de poderes é uma coisa muito bonita, sim senhora, mas um está mais em cima, e
outro mais em baixo. Uns escolhem, os outros são escolhidos. Não é que Costa ou
Marcelo sejam corruptos. Não são. Não apreciam, não gostam e até combatem.
Simplesmente, a corrupção não lhes revolve as entranhas – sendo ao mesmo tempo
cínicos e pragmáticos, encaram-na com fatalismo, como uma consequência
inevitável da acção política.
As pessoas olham para o perfil de Lucília Gago e concluem
que é muito semelhante ao de Joana Marques Vidal. É mulher. Reservada. Oriunda
dos tribunais de família. Sem ligações conhecidas ao poder político. Mas se
Governo e Presidente queriam tanto alguém com o perfil de Joana Marques Vidal,
porque é que não voltaram a convidar Joana Marques Vidal? Ah, espera, já sei, a
independência, a Constituição, o mandato “longo e único”, as boas práticas
democráticas. Não gozem comigo. O respeito pelas boas práticas democráticas
está à vista no miserável teatrinho que foi feito esta semana, com simulacros
de audições que ainda não vi devidamente denunciados. O PÚBLICO garantia na
quinta-feira que o nome de Lucília Gago tinha sido escolhido “por mútuo acordo,
há mais de uma semana”, entre Costa e Marcelo, e na quarta-feira andava a
ministra da Justiça a ouvir os partidos parlamentares para “debater a continuidade
da procuradora-geral da República”. São estas as boas práticas e o respeito
pela democracia?
Pedro Passos Coelho tem inteira razão naquilo que escreveu
no Observador: todo este processo está muito mal explicado, a decisão é
exclusivamente política, e as desculpas constitucionais são uma belíssima
treta. As declarações de Joana Marques Vidal, garantindo que a hipótese de
recondução nunca lhe foi colocada, vão no mesmo sentido. Seria muito útil,
aliás, que Observador e Expresso clarificassem as manchetes do passado
fim-de-semana, para pelo menos ficarmos a conhecer de onde veio cada uma
daquelas notícias, que muito contribuíram para alimentar o jogo de sombras. Se
ali para os lados de Belém há alguém que continua a servir vichyssoise, eu
gostava de saber. Enquanto os contornos desta decisão não são mais bem
conhecidos, resta-nos dar os parabéns ao PS, em geral, e a António Costa, em
particular, que conseguiu aquilo que queria. Quem se mete com o PS, leva. Não
acredito que o Ministério Público vá travar processos no presente. Mas talvez
mostre um pouco menos de entusiasmo a investigar certos processos no futuro.
JOANA MARQUES VIDAL
Eles atreveram-se
Rui Ramos
21/9/2018
O governo pôde sanear a Procuradora-Geral da República
porque a oligarquia política está finalmente em sintonia e porque, acima de
tudo, aprendeu a desprezar os portugueses.
Primeiro, mostraram vontade. Depois, fingiram recuar, por
entre notícias contraditórias. Finalmente, na noite das facas longas do regime,
deram o golpe, e despediram a Procuradora-Geral da República, Joana Marques
Vidal. Atreveram-se mesmo.
É bom lembrar o que estava em causa. É verdade que o governo
e o presidente da república não eram obrigados a reconduzir a Procuradora-Geral
da República. Mas nas actuais circunstâncias, era perfeitamente legítimo
esperar que o fizessem. Primeiro, porque a justiça portuguesa não tem
simplesmente entre mãos uns quantos casos melindrosos, mas, segundo a acusação
da Operação Marquês, uma conspiração para subverter a democracia, a qual só no
mandato da Dra. Joana Marques Vidal pôde ser investigada. Segundo, porque o
governo é neste momento exercido por antigos colegas de José Sócrates. Por tudo
isto, talvez se pudesse esperar do governo e do presidente da república um zelo
redobrado para não deixar nenhumas dúvidas de que o poder político não
pretendia de modo nenhum influenciar o curso da justiça, por exemplo
substituindo a Procuradora-Geral que deixou, como lhe competia, prosseguir a
investigação.
Não foi isso que aconteceu, e é importante perceber porquê.
A oligarquia portuguesa gerou, nos últimos anos, dois
projectos de domínio do Estado e do país. O primeiro, conforme descrito na
acusação a José Sócrates, assentou no controle das alavancas política,
judicial, financeira e mediática por uma pequena facção liderada pelo então
primeiro-ministro Sócrates. O objectivo era o monopólio das grandes decisões e
dos grandes rendimentos por uma clique defendida contra qualquer sério
escrutínio da justiça ou da imprensa. É uma estratégia que faz lembrar a
gestação das autocracias da Europa de leste, onde as aparências da democracia
(eleições, tribunais) servem apenas para encobrir a concentração do poder em
poucas pessoas.
A estratégia socrática, tal como analisada na acusação da
Operação Marquês, foi comprometida pela crise financeira e pela decorrente
falência do Estado, bancos e empresas que tinham sido a base de influência do
socratismo. Os seus protagonistas principais acabaram mesmo sob a alçada da
justiça, para grande espanto dos próprios e dos seus sequazes.
Mas a partir do fim do ajustamento financeiro, a oligarquia
não demorou a gerar outra forma de organização do poder. Ainda protagonizada
pela rede de amigos e de famílias que esteve com Sócrates no governo, já não
assenta, porém, no exclusivismo de uma facção, mas na sua disponibilidade, num
ambiente de fraqueza geral dos partidos e corporações, para mediar toda a
espécie de entendimentos, muito para além do que era costume. Foi assim que o
Partido Comunista, com os seus sindicatos de funcionários, e o Bloco de
Esquerda, com a sua universidade e o seu jornalismo, acabaram na rede – a mesma
rede em que um desesperado Rui Rio tenta agora arranjar o seu pequeno lugar. É
este o contexto que tornou possível a liquidação de Joana Marques Vidal, a que
os outros partidos não se opuseram, ao contrário do que teria acontecido se
ainda houvesse oposição, e que o presidente da república, também por isso,
consentiu.
O consenso, por mais alargado, nunca teria porém encorajado
a oligarquia, não fosse outro factor: a percepção que têm da sociedade
portuguesa, envelhecida, endividada e dependente. Os oligarcas convenceram-se
de que em troca de mais uns euros de ordenado ou pensão, de preferência à custa
dos impostos do vizinho, Pedrogão pode arder, Tancos pode ser assaltado, e a
Procuradora-Geral da República despedida, que ninguém lhes pedirá contas. Sim,
eles atreveram-se — porque aprenderam a desprezar-nos. Com razão?
Um tiro no pé
Só nos últimos seis anos, com a actual procuradora-geral da
República, é que foi possível serem levados a julgamento vários processos
levantados aos mais notáveis representantes dos dois maiores partidos do arco
da governação.
Teresa Sá e Melo
22 de Setembro de 2018, 6:03
Ao fim de 42 anos de Estado de Direito, só recentemente o
Ministério Público se mostrou como uma instituição soberana independente,
competente e eficaz. Todos os portugueses o reconhecem.
Só nos últimos seis anos, com a actual procuradora-geral da
República, Joana Marques Vidal, é que foi possível serem levados a julgamento
vários processos judiciais por corrupção política e financeira, levantados aos
mais notáveis representantes dos dois maiores partidos do arco da governação.
Nunca tal tinha acontecido com os anteriores procuradores,
Cunha Rodrigues, Souto de Moura e Pinto Monteiro.
Agora estes dois grandes partidos resolveram entender-se
(primeiro-ministro e Presidente da República) para, como afirmaram, dar “uma
solução de continuidade”, substituindo a actual procuradora, Joana Marques
Vidal.
E é curioso que nesta “solução de continuidade” não só não
coube a recondução da actual procuradora como nunca houve nos últimos seis anos
qualquer proposta partidária para alterar o preceito constitucional que obrigue
a esta não recondução.
Mas uma coisa é evidente para todos nós. Os actuais processos
judiciais em curso são catastróficos e arrasam os alicerces do actual regime
político. O professor de Direito e actual Presidente da República sabe-o melhor
que ninguém.
Todos nós já vimos o corrupio de políticos do mais alto
nível a serem testemunhas no processo por corrupção a Armando Vara, no Tribunal
de Aveiro, com o juiz Carlos Alexandre. Poderá vir a repetir-se a mesma cena?
A referida substituição como solução de continuidade não
colhe. São conceitos contraditórios, paradoxais.
António Costa tem o direito e a legitimidade política para
retirar Joana Marques Vidal do lugar de procuradora-geral da República. Eu,
cidadã eleitora, tenho o direito e a legitimidade política de retirar o meu
voto a António Costa e a Marcelo Rebelo de Sousa.
Como Marcelo e Costa desarmadilharam a sucessão de Joana
Marques Vidal
A escolha de alguém do Ministério Público foi a decisão
chave num processo que, no final, causou uma tempestade bem menor do que se
esperava à partida.
João Pedro Henriques e Paula Sá
21 Setembro 2018 — 22:34
Costa reitera que PGR deve ter um só mandato e que Lucília
Gago foi a "primeira escolha e a primeira aceitação"
Foi algures no meio do verão que o Presidente da República e
o primeiro-ministro consensualizaram um com o outro a decisão de não reconduzir
Joana Marques Vidal no cargo de procuradora-geral da República (PGR). O desenho
constitucional do processo decisório obriga a que haja sempre acordo porque o
primeiro-ministro é quem formalmente propõe o nome e o PR é quem formalmente
nomeia.
Para ambos, dois processos terão sido decisivos na decisão
de não reconduzir a ainda PGR: a "operação Fizz", na qual o MP
insistiu na ideia, muito prejudicial para as relações diplomáticas
Lisboa-Luanda, de que o ex-vice-presidente de Angola Manuel Vicente, suspeito
de corrupção, deveria ser julgado em Portugal; e o caso do roubo das armas em
Tancos, não só por causa da morosidade da investigação do MP mas também ter
ignorado, antes do assalto, uma denúncia anónima a alertar para o que podia
acontecer.
Marcelo e Costa combinaram então que não reconduziriam Joana
Marques Vidal com base no argumento de que o mandato do PGR deve ser único, a
bem da sua independência face ao poder político. No comunicado onde, ontem à
noite, anunciou a nomeação de Lucília Gago para o cargo, o Presidente da
República assegura que "sempre defendeu a limitação de mandatos, em
homenagem à vitalidade da Democracia, à afirmação da credibilidade das
Instituições e à renovação de pessoas e estilos, ao serviço dos mesmos valores
e princípios".
No mesmo comunicado, o PR divulgou uma carta do
primeiro-ministro onde este formalmente lhe propôs o nome da nova chefe do MP.
E nessa carta, Costa escreveu: "Entendemos que a benefício da autonomia do
Ministério Público o mandato do Procurador-Geral da República deve ser longo e
único. Apenas deste modo pode ser exercido com plena liberdade relativamente a
quem propõe, a quem nomeia e a quem possa influenciar a opinião de quem propõe
ou nomeie."
Ontem, a ministra da Justiça, Francisa Van Dunem, reforçaria
este argumento: "A existência de um único mandato é a solução que melhor
respeita a autonomia do Ministério Público." Ou, dito de outra forma:
"O Governo não pode, nem os partidos, fazer a avaliação do mérito do
desempenho de um magistrado. O procurador-geral da República, enquanto
dirigente máximo da magistratura do Ministério Público, é um magistrado e a
autonomia do MP impede do ponto de vista da conceção do modelo que haja uma
avaliação do desempenho de um magistrado sob pena de condicionar a
magistratura."
Sindicato do MP há muito que defende que mandato do PGR deve
ser único
Através de Carlos César, o PS há muito que vinha a insistir
neste argumento. Mas, mais importante do que isso, foi a certeza que Marcelo e
Costa de que a não recondução da agora PGR cessante não mereceria oposição do
influente Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMPP). Há muito que
o sindicato tinha dito que defendia só um mandato para o PGR, não por imposição
legal mas por "um princípio de não eternização nos cargos" e de independência
face ao poder político
Do que se tratava, portanto, era de escolher alguém que não
ofendesse a corporação por outras razões. Por exemplo: alguém fora do
Ministério Público (a lei nem sequer exige que o titular do cargo seja um
jurista, basta que tenha "reconhecido mérito"). "Lucília Gago
garante, pela sua pertença ao Ministério Público, pela sua carreira e pela sua
atual integração na Procuradoria-Geral da República - isto é, no centro da
magistratura - a continuidade da linha de salvaguarda do Estado de Direito
Democrático, do combate à corrupção e da defesa da Justiça igual para todos,
sem condescendências ou favoritismos para com ninguém", escreveu o PR no
comunicado de ontem. "É desejável que a personalidade a nomear seja um magistrado
do MP, com o estatuto de procurador-geral adjunto e com experiência nas áreas
de ação do MP, em particular a ação penal", acrescentou António Costa.
Lucília Gago sai diretamente da entourage de Joana Marques
Vidal para o seu lugar
A bem da pacificação, a escolha recaiu sobre uma
procuradora-geral adjunta de baixo perfil mediático e próxima de Joana Marques
Vidal. Foi por nomeação da agora PGR cessante que Lucília Gago iniciou em 2017
funções na PGR, criando e dirigindo um gabinete de coordenação dos magistrados
do MP nas áreas da Família, Jovens e Crianças. Direito da Família é aliás uma
especialidade comum a ambas. Mas a futura procuradora-geral tem também de facto
no seu currículo experiência direta na investigação criminal aos crimes de
colarinho branco (corrupção, branqueamento, etc), currículo feito no DIAP
(Departamento de Investigação e Ação Penal), que dirigiu em 2016 e 2017.
Passou-lhe pelas mãos o caso dos dois recrutadas comandos mortos e das viagens
pagas pela Galp ao Euro 2016 (caso em que são arguidos três ex-secretários de
Estado do governo de Costa).
Saber quem se lembrou do nome é algo que não foi revelado -
mas sabe-se que Lucília Gago trabalhou com a atual ministra da Justiça,
Francisca Van Dunem, na Procuradoria Geral Distrital de Lisboa (que Van Dunem
dirigia quando foi para o Governo).
PS recusa revisão constitucional para ficar explícito que
mandato do PGR não é renovável
Outra dúvida em todo o processo é se à PGR cessante foi
perguntado mesmo ou não, pelo Presidente da República, há muitos poucos dias,
se aceitaria ver renovado o seu mandato. Foi noticiado que Joana Marques Vidal
teria respondido que 'sim', aceitaria (depois de há meses ter dito 'não').
Ontem a ainda PGR adiantou que soube que não seria reconduzida pelas 20.00 de
quinta-feira, cerca de uma hora antes de o PR anunciar a escolha de Lucília
Gago. E depois assegurou: "A hipótese de ser reconduzida no cargo nunca me
foi colocada e, por isso, eu não falo de hipóteses."
Partidariamente - e com a excepção de Pedro Passos Coelho -
as reações foram calmas. Até o CDS - único partido que explicitamente exigiu a
recondução de Joana Marques Vidal - pareceu conformado: "Esperamos que
seja mantida a postura que classificámos de muito positiva da anterior
procuradora, por, independentemente das matérias, áreas e setores, ter atuado
com uma atitude suprapartidária, com independência, isenção e
imparcialidade", disse o deputado Telmo Correia. Os partidos preferiram
dividir-se sobre se a Constituição deve no futuro explicitamente determinar que
o mandato não é renovável. O PS opõe-se a qualquer revisão - e enquanto o fizer
tudo ficará como está.
Lucília Gago tomará posse dia 12 de outubro, precisamente
seis anos depois de Joana Marques Vidal ter iniciado o seu mandato, proposta
por Pedro Passos Coelho e nomeada por Cavaco Silva.
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