Quase duplicou o número de estrangeiros a viver em Portugal
Condições do país e benefícios fiscais atraíram no último
ano e meio mais estrangeiros. Foi um aumento de 83% no número de residentes não
habituais, que faz subir para 23 767 as pessoas com este estatuto. São
sobretudo franceses, britânicos e italianos que estão a subir. Também há
portugueses a voltar, mas são apenas 6% do total.
© Orlando Almeida/Global Imagens
Lucília Tiago
24 Setembro 2018 — 00:05
Santos Silva.Portugal mantém benefícios fiscais para
residentes não habituais
Em apenas um ano e meio, entre janeiro de 2017 e agosto
deste ano, o número de residentes não habituais (RNH) em Portugal aumentou 83%,
atraídos pelos benefícios fiscais oferecidos pelo governo. Ao todo são já 23
767, a grande parte franceses, britânicos e italianos. O regime fiscal criado
em 2009 para atrair estrangeiros (trabalhadores qualificados e reformados)
também pode ser usado por portugueses desde que não tenham residido no país nos
cinco anos anteriores. Mas poucos o fazem. Apenas 1502 residentes não habituais
(6%) têm naturalidade portuguesa.
Em traços gerais, o regime dos RNH permite a trabalhadores
que integram uma lista de profissões consideradas de elevado valor acrescentado
pagar uma taxa de IRS de 20% sobre os rendimentos do trabalho e confere uma
dupla isenção de tributação aos reformados (nas pensões). Para se beneficiar
destas condições (que são concedidas por um período de dez anos, não renovável)
é necessário ter tido residência fiscal fora de Portugal nos cinco anos
anteriores ao pedido de adesão e passar a morar em Portugal pelo menos 183 dias
por ano.
Regime dos Residentes Não Habituais rende mais do que
desconto de 50% no IRS
A vaga de emigração a que o país assistiu durante o período
da crise abre caminho para que muitos portugueses possam aderir àquele regime,
caso regressem a Portugal. Mas os dados facultados pelo Ministério das Finanças
indicam que o número tem um peso relativo reduzido.
Os 1502 aderentes portugueses contrastam com os quase sete
mil pedidos que, ao que o DN/Dinheiro Vivo apurou, terão chegado à Autoridade
Tributária e Aduaneira. Os consultores fiscais que habitualmente acompanham
estes processos admitem que a diferença se deva a alguns entraves que encontram
na formalização do pedido e que travam o seu deferimento. E exemplificam com os
casais em que apenas um dos elementos regressa a Portugal, mas ao qual é vedada
a adesão ao regime dos RNH porque - apesar de o regime da tributação em
separado ter passado a ser regra - a administração fiscal entende que não estão
preenchidos os requisitos.
À semelhança de Portugal são vários os países europeus que
têm regimes fiscais desenhados com o objetivo de atrair determinada tipologia
de rendimentos ou de contribuintes, mas o facto de por cá ter sido decidido não
cobrar IRS aos reformados estrangeiros (desde que a pensão seja paga por outro
país) colocou o regime português na mira das críticas das Finanças finlandesa e
sueca.
Mas os dados agora divulgados mostram que há somente 2071
suecos que têm o estatuto de residente não habitual em Portugal, tendo sido
2042 os que vieram da Suécia - o que indicia que 30 já viviam fora do seu país
natal e se mudaram para cá. Os países de onde têm vindo mais RNH são França
(5448), Grã-Bretanha e Irlanda do Norte (2718) e Itália (2513). Da Finlândia
vieram apenas 491.
O Bloco de Esquerda, nas medidas propostas para o Orçamento
do Estado, defende o fim deste regime fiscal. Mas quem acompanha estes casos vê
com preocupação eventuais mudanças na lei pela instabilidade que causam e por
poderem levar a que muitos destes estrangeiros, mais qualificados e com maior
poder de compra, se mudem para um outro país europeu onde poderão beneficiar de
soluções fiscais que foram desenhadas com o mesmo fim.
António Costa, paralelamente, já anunciou que o próximo OE
incluirá medidas fiscais (em sede de IRS) dirigidas aos portugueses que
deixaram o país no período da troika e queiram regressar nos próximos dois
anos. A solução passará por um desconto de 50% no imposto, mas os contornos da
medida não são ainda conhecidos.
Bloco de Esquerda diz que regime de residentes não habituais
é "um dos principais fatores de especulação imobiliária" e quer
alterações no próximo Orçamento do Estado
Susete Francisco
25 Abril 2018 — 00:12
O Bloco de Esquerda quer mexer nos benefícios fiscais
atribuídos ao abrigo do regime de residentes não habituais, uma medida que visa
travar a especulação imobiliária que se faz sentir, atualmente, em Portugal. Os
bloquistas preparam-se para levar esta exigência às negociações do Orçamento do
Estado para o próximo ano. A par deste regime fiscal, o BE quer rever também os
vistos gold.
"Vamos propor a alteração deste regime nas negociações
do OE", diz ao DN o deputado bloquista Pedro Soares, defendendo que os
benefícios fiscais atribuídos aos residentes não habituais tem sido um "um
dos principais fatores que contribui para a especulação no mercado
imobiliário" - e o mesmo é válido para os vistos gold. Os bloquistas
abrem, assim, uma frente política interna contra um regime que tem sido
contestado pelo governo de outros países, caso da Suécia e da Finlândia, que já
ameaçou rasgar o acordo fiscal com Portugal, firmado há mais de 40 anos.
O regime de residentes não habituais permite a reformados
estrangeiros não pagar IRS e contempla uma taxa reduzida de imposto para os
trabalhadores ligados a determinadas áreas, consideradas de elevado valor
(também se pode aplicar a portugueses emigrados há mais de cinco anos). Os
beneficiários têm de ter domicílio fiscal em Portugal e passar 183 dias no
país. O caso dos reformados é o que tem levantado mais polémica, na medida em
que permite uma situação de dupla não tributação - impede o país de origem de
cobrar impostos sobre as pensões, enquanto atribui isenção de IRS em Portugal.
Um privilégio fiscal que o BE quer agora alterar. Em que medida, é uma questão
que ainda não está fechada.
Ao que o DN apurou, a revisão do regime de residentes não
habituais é uma medida que conta com adeptos no interior do próprio governo. E
ontem foi, aliás, um deputado socialista, Luís Vilhena, a perguntar ao ministro
do Ambiente, numa audição no parlamento, se não será altura de redirecionar os
benefícios que são dados no âmbito deste regime. Ficou sem resposta de João
Pedro Matos Fernandes.
Se a possível revisão deste regime fica remetida para o
Orçamento de 2019, o BE vai avançar já esta semana com outras três propostas em
matéria de habitação e combate à especulação imobiliária. Um dos projetos visa
fixar a duração dos contratos de arrendamento nos cinco anos e impor que a
saída seja comunicada ao inquilino com dois anos de antecedência. Um segundo
pretende alterar o Código Civil quanto ao regime do direito de preferência, que
o BE diz estar a ser "contornado por empresas que vendem as casas "em
pacote"", impossibilitando que os inquilinos possam exercer o direito
de preferência sobre os imóveis; e um terceiro pretende retirar o investimento
em habitação dos limites de endividamento das autarquias.
Esquerda quer mais medidas
As três propostas do BE somam-se a duas iniciativas já
apresentadas pelo PCP, uma das quais - a revogação do atual regime do
arrendamento urbano - está agendada já para a próxima semana. São cinco
propostas das bancadas da esquerda, que dão corpo à posição assumida ontem
pelos dois partidos numa audição parlamentar com o ministro do Ambiente: as
medidas avançadas pelo executivo não chegam, na medida em que não dão uma
resposta imediata aos problemas da habitação. A discussão à esquerda começa
agora - não houve negociação prévia do executivo com os partidos que sustentam
o governo.
Para a deputada do PCP Paula Santos o governo "não
rompe com a financeirização da habitação" e não dá resposta à
"urgência de travar os despejos". "Vivemos uma situação crítica,
é preciso enfrentar esta situação de emergência", defendeu também Pedro
Soares. Ao DN, Paula Santos reitera que o governo "não rompe com os
interesses especulativos e dos grupos financeiros" no setor da habitação,
defendendo "uma intervenção direta do Estado" neste setor - a começar
pela revogação do novo regime do arrendamento urbano, que apelida de "lei
dos despejos". Já quanto às propostas do governo, a deputada comunista
remete uma posição para o futuro, na medida em que não existem ainda propostas
concretas. O mesmo diz Pedro Soares, do BE.
PSD antecipa "efeitos desastrosos"
Já o PSD antecipou ontem "efeitos verdadeiramente
desastrosos" no mercado de arrendamento, em consequência da Nova Geração
de Políticas de Habitação, anunciada na última segunda-feira pelo governo. Para
Jorge Paulo Oliveira, coordenador dos sociais-democratas na comissão
parlamentar de Ambiente, as medidas avançadas pelo executivo representam um
"regresso ao congelamento das rendas" e aos "contratos
vitalícios", além de constituírem uma "mudanças nas regras, com o
jogo já em movimento". João Pedro Matos Fernandes devolveu as críticas,
acusando os sociais-democratas de insensibilidade social.
Sem comentários:
Enviar um comentário