O orçamento de todos os perigos
Quando vemos o primeiro-ministro a
aplaudir autarcas que prometem aeroportos no quintal, há boas razões para temer
o pior.
João Miguel Tavares
7 de setembro de 2017, 6:53
Sabemos que o delírio começa a atingir níveis preocupantes
quando o candidato do PS à Câmara de Coimbra decide anunciar, como medida
emblemática do seu próximo mandato, a transformação do aeródromo da cidade num
novo aeroporto internacional. Note-se que Manuel Machado não apresentou tal
ideia em Casal da Misarela, depois de um roteiro copofónico pelas freguesias
circundantes e a ingestão de um par de garrafas de licor Beirão. Nada disso:
apresentou-a muito sobriamente em cerimónia pomposa, com um sorridente António
Costa a seu lado. E fez mais. Disse que queria o aeroporto e adiantou a fórmula
para a sua construção, segundo o Notícias de Coimbra: “Queremos reproduzir no
futuro Aeroporto Internacional de Coimbra o mesmo modelo que colocámos em
prática na reabilitação das margens do Mondego: a câmara assume, a câmara faz,
a câmara lidera — e o Governo apoia.” Só se esqueceu de acrescentar: e, no fim,
o contribuinte paga.
Esta ideia estapafúrdia de construir um aeroporto
internacional em Coimbra, que talvez possa ser ligeiramente mais rentável do
que o aeroporto de Beja, mostra bem os perigos que se perfilam no horizonte.
Tudo aponta para o regresso, a muito curto prazo, do despesismo irracional, à
boleia das autárquicas de 2017, das legislativas de 2019, da pressão da
extrema-esquerda para a aprovação do OE 2018 e de um crescimento a rondar os 3%
que, em vez de ser aproveitado para abater na dívida, é estoirado no costumeiro
regabofe das vacas gordas. Mal se vislumbra uma folga no orçamento, os autarcas
começam a sonhar com quilómetros de betão e a extrema-esquerda a exigir
descongelamentos de carreiras, aumentos de salários e o alargamento dos quadros
da função pública.
Eis como as boas notícias são, na verdade, péssimas
notícias. Aquilo que se tem visto até agora é um aumento da despesa permanente
(salários e pensões), compensado com cortes nas despesas pontuais (as famosas
cativações). Como é fácil de ver, esta é uma opção muito arriscada, e que tende
a agravar-se: os cortes intermédios são impossíveis de perpetuar sem uma queda
abrupta na qualidade dos serviços do Estado, e se vier nova crise o Tribunal
Constitucional vai andar a vetar cortes de funcionários públicos, salários e
pensões — que, entretanto, subiram, limitando ainda mais a margem de manobra de
um futuro governo.
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