Arrancou-se a calçada de Beja para
pôr lajes. Partiram-se. Agora regressa a calçada
O piso em calçada portuguesa regressa
à Praça da República de Beja, depois de ter sido preterido para dar lugar a uma
cobertura em lajes de mármore.
CARLOS DIAS 7 de setembro de 2017, 8:20
Uma das obras mais controversas do programa Beja Polis está
em fase de remodelação na Praça da República, em pleno centro histórico da
cidade. Um novo piso em calçada portuguesa, está a substituir a cobertura em
lajes de mármore que, a partir de 2004, tomou o lugar da calçada portuguesa
colocada em 1940.
A substituição das lajes por calçada, “vai custar 74 mil
euros mais IVA” referiu ao PÚBLICO Vítor Picado vereador na Câmara de Beja
(CDU), enquanto a colocação do piso em mármore com cerca de 1600 metros
quadrados de área coberta, exigiu um esforço financeiro superior a meio milhão
de euros.
Numa praça de Beja, substituiu-se calçada por laje e o
resultado é um piso partido
Numa praça de Beja, substituiu-se calçada por laje e o
resultado é um piso partido
De entre os transeuntes que vão passando e olhando para mais
uma remodelação da praça questiona-se o “faz e desfaz” nas obras do programa
Polis de Beja, onde foram investidos cerca de 19 milhões de euros entre os anos
2000 e 2004 e posteriormente mais de um milhão nos trabalhos de remodelação de
alguns dos 13 projectos que foram aprovados no início do século.
A (re) colocação do piso em calçada, está a ser uma luta
contra o tempo. A empreitada tem 45 dias para retirar da praça 1600 lajes de
mármore com um metro de lado, e deixar a praça com uma nova configuração antes
das próximas eleições autárquicas. Nem aos domingos se descansa.
No entanto, o modelo de calçada que existiu até 2004, não
está a ser replicado. “Não é bem a mesma coisa” adiantou ao PÚBLICO, João
Rocha, presidente da Câmara de Beja. Com efeito, o projecto em execução coloca
o piso da calçada ao mesmo nível dos arruamentos adjacentes, ao contrário da
solução que prevaleceu entre 1940 e 2004, que recorreu à colocação de lancis
para a destacar.
A área onde decorrem as obras, é de grande importância
arqueológica. Durante a presença romana, o sítio agora designado Praça da
República, terá sido o centro administrativo comercial da então Pax Júlia. Daí
que seja considerado pelos arqueólogos “o centro nevrálgico da memória
histórica da cidade”.
A descoberta do forúm romano nas suas proximidades, em 2012,
pela arqueóloga Conceição Lopes, adensou essa possibilidade, que só um trabalho
de pesquisa adequado permitiria confirmar. Mas tal hipótese nunca se colocou.
Em 2003, Fernando Real então presidente do Instituto Português de Arqueologia
(IPA), justificou ao PÚBLICO a impossibilidade de uma pesquisa mais profunda
poder vir a ser efectuada no âmbito do programa Pólis, alegando que “só se
intervinha na medida do estritamente necessário” por se viver “uma fase de
contenção orçamental”.
Mesmo assim foi descoberto um pavimento formado por pequenas
pedras (tesselas) embutidas em argamassa, que se encontrava muito bem
preservado. Como não foi possível proceder a uma melhor interpretação do
achado, apenas se procedeu à sua limpeza e registo fotográfico para ser coberto
com uma tela geotêxtil, deixando para os vindouros uma reserva arqueológica em
condições de poder vir a ser estudada. “Basta remover algumas placas de mármore
e proceder ao seu estudo” sugeriu Fernando Real.
Pois bem, decorridos 13 anos, o actual executivo municipal,
decidiu que fosse realizado o levantamento arqueológico do pavimento romano
descoberto em 2003. O achado vai ficar coberto com uma estrutura envidraçada
para ser visto pelos transeuntes. Ao todo, a área observável terá cerca de 80
metros quadrados.
Fica a expectativa de se saber em que estado se encontra o
pavimento romano, situado a menos de um metro da superfície. Desde que foi
remodelada a praça em 2003, a cobertura de mármore sofreu constantes maus
tratos, (lajes partidas) com a circulação de viaturas pesadas e a colocação de
palcos de razoável dimensão, para a realização de espectáculos.
Apesar da obra de colocação do piso ter acompanhamento
arqueológico, este apenas se circunscreve a vestígios que eventualmente possam
surgir durante o levantamento das lajes der mármore. Mais uma vez ficam por
fazer as escavações que tanto arqueólogos como a população defendem, sobretudo,
depois da descoberta, em 2012, do forúm romano a cerca de 40 metros do local
que está a ser remodelado.
Pinto Leite, que foi coordenador do Programa Polis, reagindo
ao cepticismo dos críticos do projecto de reformulação da Praça da República, o
lugar mais nobre da cidade de Beja, alegou ter sido “adoptada uma solução
minimalista que evidencia a sua importância e contemporaneidade”. Decorria o
ano de 2004. Hoje a proposta inovadora está a ser totalmente desmantelada,
para, no seu lugar ficar o tipo de piso em calçada portuguesa que naquele ano
foi substituído, “para “recentrar” a cidade e revitalizar o centro histórico”
propunha o Programa Pólis no ano 2000.
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