CORONAVÍRUS
Quero lá saber
quanto é que já gastou, sra. ministra
Qual a razão para
testar um Presidente da República assintomático e não testar doentes com
pneumonia internados num hospital central? É deste tipo de exigência que eu
falo.
JOÃO MIGUEL
TAVARES
12 de Março de
2020, 6:27
No meu último
artigo afirmei que o combate ao coronavírus e às suas brutais consequências na
economia portuguesa seria a prova do algodão da qualidade deste governo e da
capacidade de liderança de António Costa. Muita gente ficou indignada com tal
declaração, por entender que não se fazem contas políticas no combate a uma
pandemia – seria assim uma espécie de mesquinhice e de golpe baixo
politiqueiro. É uma teoria extraordinária, esta, e também muito tonta: se a
competência de um governo não se avalia em horas de urgência, avalia-se quando,
exactamente? Quando a economia cresce no mundo inteiro e tudo corre de feição?
Assim qualquer um serviria para primeiro-ministro.
Lamento: uma
pandemia não só não justifica a suspensão do juízo crítico sobre a competência
de um governo, como exige um escrutínio bem apertado sobre a liderança de todo
o processo e a capacidade de controlar a propagação da doença. Isto não é uma
questão de sorte ou azar. Azar teve a China, onde a epidemia nasceu, e não
podia fazer grande coisa quanto a isso. Em Portugal, já é uma questão de
competência. Nós sabíamos que o vírus iria chegar mais tarde ou mais cedo, pelo
que a preparação do país para o enfrentar (ainda ontem o director-geral da
Organização Mundial de Saúde criticou os “níveis alarmantes de inacção” em todo
o mundo), e a forma como as autoridades forem capazes de limitar a sua
expansão, é evidentemente matéria de avaliação política, e convém que ela seja
bastante exigente.
Até agora, aquilo
a que tenho assistido nestes primeiros dias de maior alarme não é especialmente
reconfortante, até porque, à boa maneira portuguesa, a informação escasseia.
Custa-me perceber tanta obsessão no “reforço” da linha SNS24, e tão pouco
esforço no desenvolvimento de aplicações digitais que aproveitem as imensas
potencialidades dos smartphones, como tem acontecido na China ou na Coreia do
Sul, permitindo aos cidadãos receberem informação diferenciada (não é, de todo,
igual viver na Póvoa de Varzim ou em Beja), em tempo real e de forma passiva, o
que evitaria o entupimento desnecessário das velhas linhas telefónicas.
Na manhã de
ontem, Marta Temido esteve no Parlamento a dizer que “as medidas aplicadas para
conter a epidemia do novo coronavírus em Portugal já tiveram um impacto de 10
milhões de euros no orçamento da Saúde” e que a tutela está muito
esforçadamente “a trabalhar para acomodar esta despesa”; e Graça Freitas esteve
a dar uma entrevista para o podcast de Daniel Oliveira. Nada contra audições
parlamentares, nem contra o podcast do Daniel Oliveira, no qual até já
participei – mas será que Freitas e Temido não tinham nada de mais urgente para
fazer na manhã de ontem?
Cara senhora
ministra: estou-me bem nas tintas para os 10 milhões que já gastou, um valor,
aliás, que me parece ridículo face à dimensão da ameaça da covid-19. É para
estas ocasiões que servem os bolsos do Estado. O que eu gostava mesmo de saber
é como é que as medidas de contenção falharam no Hospital de Santa Maria, onde,
de repente, se descobrem doentes infectados internados há vários dias com
pneumonias, comprometendo instalações e pessoal hospitalar. Importa pouco saber
se são 10, 100 ou mil milhões de euros, mas importa muito saber isto: qual a
razão para testar um Presidente da República assintomático e não testar doentes
com pneumonia internados num hospital central? É deste tipo de exigência que eu
falo; e são estas as perguntas a que é urgente responder.
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