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Lisboa: sustentabilidade ou greenwashing?
Enquanto perdurar
este modelo de urbanismo neoliberal será impossível afirmar a sustentabilidade
urbana, distribuir recursos de forma mais equilibrada, contribuir para a coesão
metropolitana ou ainda resolver as carências sociais mais prementes.
Sebastião
Ferreira de Almeida
Sebastião é bolseiro
de doutoramento em Arquitectura dos Territórios Metropolitanos Contemporâneos e
investigador no DINAMIA’CET
12 de Fevereiro
de 2020, 8:00
A Câmara
Municipal de Lisboa anunciou, recentemente, o plano para a Zona de Emissões
Reduzidas de Lisboa (ZER) como “uma forma de viver Lisboa (...) mais amiga das
pessoas”. Este plano promete diminuir a poluição e melhorar a qualidade do ar,
reduzindo 60 mil toneladas de CO2, criando mais 4,6 hectares de áreas pedonais
e apostando no transporte público e na mobilidade eléctrica.
Aparentemente,
todos concordamos sensatamente com estes objectivos, perante desafios como as
alterações climáticas ou, simplesmente, a necessidade de vivermos com maior
qualidade de vida. O problema nesta equação é que a sustentabilidade e a
qualidade de vida de uma cidade não se avaliam exclusivamente a partir das
dimensões ambientais — implicam também as dimensões sociais, institucionais e
económicas.
Perguntamos: para
que pessoas a cidade se está a tornar mais amiga? Aquelas que nunca vão poder
morar em Lisboa? Aquelas que foram ou serão expulsas perante a inércia dos
políticos e das políticas urbanas? A minoria que ainda habita o centro? Na
verdade, “o que não é dito ou fica omisso” é que o retorno principal deste
“projecto histórico para a cidade” será provavelmente o aumento do investimento
imobiliário e do turismo — as principais fontes de receita do município.
Muitas pessoas terão, por isso, dificuldade em reconhecer
esta nova cidade como amiga, permanecendo na invisibilidade das suas rotinas e
das suas urgências não atendidas.
Por outro do
lado, argumentando do ponto de vista ambiental: o que dizer de uma cidade que
investiu numa estação fluvial de cruzeiros e que se prepara para sofrer os
impactos de um novo aeroporto? Segundo um estudo da Zero, os navios de cruzeiro
que passaram pelo capital libertaram 3,5 vezes mais óxidos de enxofre que os
375 mil automóveis que diariamente circulam em Lisboa. Relativamente ao impacto
do aumento do tráfego aéreo em Portugal, estima-se que em 2050 será responsável
pelo lançamento de seis milhões de toneladas de C02 na atmosfera. Mesmo do
ponto de vista ambiental, a estratégia de sustentabilidade urbana para a cidade
parece incoerente.
Para quem chega
de avião ao aeroporto da Portela, não é visível, mas junto a este está o Bairro
da Torre. Os seus moradores vivem em barracas, sem água, nem luz, sem
condições. É uma ilustração de quem nem todos têm lugar nesta cidade “das
grandes ambições”, onde os principais investimentos são aplicados de forma
redundante num centro esvaziado e transformado num mero cenário de
entretenimento.
Até a redução do
preço do passe e a integração dos transportes de toda a região de Lisboa, que
constituiu uma medida integradora, é cada vez mais um paliativo económico, num
momento em que o preço das casas nos concelhos periféricos subiu 20%, segundo
dados da Confidencial Imobiliário. Muitas pessoas terão, por isso, dificuldade
em reconhecer esta nova cidade como amiga, permanecendo na invisibilidade das
suas rotinas e das suas urgências não atendidas.
Enquanto perdurar
este modelo de urbanismo neoliberal será impossível afirmar a sustentabilidade
urbana, distribuir recursos de forma mais equilibrada, contribuir para a coesão
metropolitana, ou ainda resolver as carências sociais mais prementes. Neste
contexto, só quem estiver de passagem se deixará enganar pelo greenwashing,
mas, como sabemos, no jogo da sedução a ilusão é um ingrediente fundamental.
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