OPINIÃO
O PS faz a festa
e o TC apanha Canas
Não podemos
deixar que Portugal se transforme num país onde o PS atira os foguetes e faz a
festa, para depois ser o Tribunal Constitucional a apanhar Canas. Chumbar
Vitalino para juiz do TC é a única coisa decente que o Parlamento pode fazer
nesta sexta-feira.
JOÃO MIGUEL
TAVARES
27 de Fevereiro
de 2020, 5:51
Já vai sendo hora
de instituir neste país um respeito mínimo pela independência e dignidade das
instituições, e o Tribunal Constitucional (TC) parece-me um excelente sítio
para começar. A história do TC não é bonita no que diz respeito à sua
independência política. António Vitorino foi juiz do Tribunal Constitucional,
de onde saiu directamente para o governo de António Guterres. Rui Pereira foi secretário
de Estado do PS com Guterres, coordenador da reforma penal com Sócrates, juiz
do TC durante seis semanas em 2007 (a sério), e depois ministro da
Administração Interna. Assunção Esteves foi eleita deputada do PSD em 1987,
juiz do TC em 1989 e novamente deputada a partir de 2002. Infelizmente, tudo
isto aconteceu em Portugal – convém, ao menos, ter consciência de que nada
disto se recomenda.
O Tribunal
Constitucional é o tribunal mais elevado do sistema judicial português. As suas
decisões são inapeláveis. O mandato de cada juiz é único e tem a longuíssima
duração de nove anos. Nos termos da Constituição, os juízes conselheiros “gozam
das garantias de independência, inamovibilidade, imparcialidade e
irresponsabilidade”. São o topo da carreira jurídica em Portugal. Para além da
constitucionalidade das leis, os juízes do TC têm o dever de fiscalizar os
partidos e os titulares de cargos políticos, para além de dirimirem conflitos
eleitorais. E exactamente porque parte significativa da sua acção tem fortes
impactos políticos (como se viu na época da troika), a sua independência dos
partidos é crucial. Sim, é verdade que 10 dos 13 juízes são designados pela
Assembleia da República (os restantes três são cooptados), e que é natural ter
em conta as suas orientações ideológicas, mas é preciso ter uma lata descomunal
para querer transformar o Palácio Ratton em albergue de boys socialistas,
sugerindo para juiz conselheiro Vitalino Canas, deputado do PS durante cinco
legislaturas e o porta-voz do partido nos tempos de José Sócrates.
O Tribunal
Constitucional é um lugar sério e a sua independência deve ser defendida sem
contemplações. Vitalino Canas e o juiz Clemente Lima — o outro nome sugerido
pelo PS para o TC — têm três coisas em comum: a proximidade ao PS, a
proximidade pessoal a António Costa (em 2005, Clemente Lima foi nomeado pelo
actual primeiro-ministro para chefe da Inspecção Geral da Administração
Interna) e a proximidade à maçonaria. Os juízes portugueses aprovaram em 2009
um compromisso ético onde se lê: “O juiz não integra organizações que exijam
aos aderentes a prestação de promessas de fidelidade ou que, pelo seu
secretismo, não assegurem a plena transparência sobre a participação dos
associados.” Mas, vá lá saber-se porquê, muitos juízes acham possível ser maçon
sem violar este compromisso.
Eu não sei porque
é que o PS de António Costa apresentou um nome como o de Vitalino Canas para
juiz do Tribunal Constitucional. Não sei se é para lhe pagar os longos anos de
devoção ao Partido Socialista. Não sei se é por valorizar os amigos de casa de
José Sócrates. Não sei se é por pertencer ao sempre poderoso grupo de Macau, ao
lado de Diogo Lacerda Machado, Pedro Siza Vieira ou Eduardo Cabrita. Não sei se
é por ser maçon. Mas isto eu sei: não podemos deixar que Portugal se transforme
num país onde o PS atira os foguetes e faz a festa, para depois ser o Tribunal
Constitucional a apanhar Canas. Chumbar Vitalino para juiz do TC é a única
coisa decente que o Parlamento pode fazer nesta sexta-feira.
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