Itália passa a
ser o quarto país com mais casos de coronavírus e gera preocupações
Número de pessoas
infectadas já chegou aos 132, com três casos mortais. Governo italiano aprovou
diploma com fortes medidas de contenção que já abrangem dez localidades.
Empresa ferroviária estatal austríaca suspendeu ligações com Itália, após terem
sido detectados casos suspeitos num comboio na fronteira do Tirol.
Luís Villalobos
Luís Villalobos
23 de Fevereiro de 2020, 21:01
Máscaras que não
são de Carnaval no rosto de venezianos, o estádio Giuseppe Meazza, do Inter de
Milão, vazio em dia de jogo com o Sampdoria e uma fila de pessoas com a cara
tapada à porta de um supermercado na localidade de Casalpusterlengo para
reforçar as provisões em casa são três imagens que atestam bem os efeitos da
expansão do Coronavírus no Norte de Itália.
Em cerca de 48
horas, o país assistiu a um aumento exponencial de casos positivos: se até
sexta-feira estavam contabilizadas apenas três pessoas infectadas com o vírus,
e todas elas identificadas como recém-chegadas da cidade chinesa de Wuhan –
onde o surto começou no final do ano passado –, este domingo à tarde havia já
132 pessoas infectadas, três das quais morreram, entre cerca de 3000 situações
que causaram suspeitas.
Primeiro morreu
na sexta-feira um homem de 78 anos, em Véneto, seguindo-se uma mulher de 75
anos na cidade de Codogno (Lombardia), no sábado, e uma mulher idosa no
domingo, em Crema (Lombardia). Com os três casos mortais em Itália, sobem para
quatro as mortes em solo europeu relacionadas com o surto: a primeira ocorreu
em Paris, quando um turista chinês não resistiu a uma pneumonia resultante da
infecção. Itália destaca-se pela negativa, com o país europeu com mais mortes
devido ao coronavírus, e o quarto a nível global, depois da China (Xi Jinping
declarou ontem ser “a mais grave emergência de saúde desde 1949”), Irão e
Coreia do Sul.
Geograficamente,
Véneto, Piamonte e Lombardia são as regiões críticas. A vizinha Áustria
suspendeu as ligações ferroviárias, depois de terem sido detectados dois
passageiros com febre num comboio que cruzava a fronteira de Brennero, na região
do Tirol.
A maior parte dos
casos em Itália regista-se na pequena localidade de Codogno, na Lombardia, com
cerca de 15 mil habitantes. Era desta povoação o primeiro doente identificado
com o novo coronavírus em Itália: um homem de 38 anos, que no fim de Janeiro
tinha jantado, juntamente com a sua mulher grávida, com um amigo que tinha
regressado da China, relatou o jornal Corriere della Sera.
Análises feitas,
entretanto, ao homem vindo da China não encontraram anticorpos ao vírus, diz o
La Repubblica – pelo que não se confirma a suspeita de que teria sido ele a
transmitir a infecção ao amigo que continua internado, mas se encontra estável,
a recuperar.
À procura do
“paciente zero"
A rápida subida
de casos foi acompanhada de mais uma má notícia, com as autoridades italianas a
informarem que ainda não encontraram o chamado “paciente zero”, ou seja, a
fonte da propagação (o homem de negócios que viajara para a China e do qual se
suspeitava acabou por ter um teste que deu negativo). Este domingo de manhã,
quando fazia a descrição dos casos identificados, o responsável da protecção
civil, Angelo Borrelli, afirmou que a ausência do “paciente zero” tornava
difícil avançar com cenários sobre a difusão da doença.
O presidente da
região de Véneto (cuja capital é Veneza), Luca Zaia, afirmou que é de esperar
que haja casos de pessoas infectadas mas que não tiveram contacto com
indivíduos suspeitos de ter o vírus. “Pode apanhar-se de qualquer pessoa”,
afirmou, citado pela Reuters, tal como noutros casos normais de gripe.
De acordo com
Borrelli, do total de casos identificados houve 88 na Lombardia, 24 no Véneto,
seis em Piemonte, nove em Emilia-Romagna e dois em Lácio (um casal de turistas
chineses). Há 129 pessoas em observação, das quais 54 estão hospitalizadas.
Com os 132
doentes identificados até à data, Itália passou a ser o quarto país com mais
casos, depois da China (76.936), da Coreia do Sul (602) e do Japão (135). Mas o
que terá provocado mais alarme foi mesmo a rapidez da propagação, levando as
autoridades a tomar diversas medidas de contenção.
As tomadas de
posição mais mediáticas foram a interrupção do Carnaval de Veneza, que chegou
ao fim este domingo e devia terminar apenas na terça, ponto de encontro de
milhares de turistas de todo o mundo nesta cidade de ruas e canais apertados; e
o adiamento de quatro jogos da primeira divisão italiana.
No entanto, as
com mais impacto para os locais foram as medidas de contenção anunciadas este
fim de semana para dez localidades, e onde vivem ao todo cerca de 50 mil
pessoas: Casalpusterlengo, Codogno, Castiglione d’Adda, Fombio, Maleo,
Somaglia, Bertonico, Terranova dei Passerini, Castelgerundo e San Fiorano. No
sábado, o Conselho de Ministros aprovou um decreto-lei onde se estabelecem
medidas para zonas onde, por exemplo, haja um caso positivo sem que se conheça
a fonte de transmissão.
Entre as medidas
está a proibição de saída do município ou área em questão, a suspensão de
eventos em locais públicos ou privados, a suspensão de serviços de educação
infantil e escolar, o encerramento de museus e a suspensão de alguns órgãos
públicos, e a suspensão de alguns negócios e actividade comercial. Recomenda-se
ainda às pessoas nas zonas mais afectadas para ficarem em casa.
Ao mesmo tempo,
estipula-se “a aplicação da quarentena com vigilância activa àqueles que tiveram
contacto próximo com as pessoas afectadas” pelo coronavírus (designado de
Covid-19) e a obrigação de comunicação às autoridades por parte de quem entrou
na Itália proveniente “de áreas de risco epidemiológico”.
Quatro
portugueses da tripulação do Diamond Princess sem
coronavírus
Quatro
portugueses da tripulação do Diamond Princess sem coronavírus
O diploma do
Governo de Conte introduz também, de acordo com o comunicado oficial, “a
possibilidade de as autoridades competentes adoptarem medidas adicionais de
contenção, a fim de impedir a propagação do vírus mesmo fora dos casos já
listados”. Caso seja necessário está prevista a utilização da polícia, e, até,
das forças armadas.
Revisões
económicas em baixa
Por saber está
ainda qual será o impacto económico, já que a Lombardia (cuja capital é Milão)
e Véneto são, como recordou a Reuters, o coração industrial do país,
concentrando 30% do PIB. Isto além dos efeitos no turismo, num país que é uma
das maiores economias da zona euro e que tem lutado por escapar à recessão.
De acordo com as
estimativas mais recentes do FMI, a China pode ter um crescimento inferior ao
calculado em 0,4 pontos percentuais (p.p.), e a economia global crescer menos
0,1 p.p., isto caso o surto tenha uma duração curta. Se for mais persistente,
com maior propagação, o impacto negativo será maior.
Uma outra medida
de contenção tomada em Itália foi a de suspender todos os voos directos entre o
país e a China, mas foi rejeitada a ideia da Liga, partido de extrema-direita
de Salvini, de fechar as fronteiras – os países mais próximos são a França,
Suíça, Eslovénia e Áustria. O tema, no entanto, será alvo de debate neste
último país: de acordo com o ministro do Interior, Karl Nehammer, citado pela
Reuters, esta segunda-feira será discutido se a Áustria deve restabelecer
unilateralmente a fronteira, ignorando assim o acordo de Schengen.
O vírus, no
entanto, já fez levantar barreiras em outros locais, com a Turquia, o
Afeganistão e a Arménia a anunciarem o fecho de fronteiras com o Irão, país
onde já se verificaram oito mortos por causa do coronavírus – o maior número
fora da China. Isto numa altura em que também houve um novo surto na Coreia do
Sul, onde se registam agora 602 casos de infecção, com o país a declarar alerta
máximo.
Em Portugal, onde
até agora todos os casos suspeitos deram negativo, a directora-geral da Saúde,
Graça Freitas, afirmou à Lusa que “vai estar atenta ao evoluir da situação em
Itália e no resto do mundo”. Com Miguel Dantas
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