Incidente
institucional afasta dezenas de deputados do PS da tomada de posse
Nuno Sá Lourenço
25/11/2015 - PÚBLICO
Presidente
marcou tomada de posse do novo Governo para a mesma hora em que o
Parlamento discute as medidas extraordinárias apresentadas pelo PS.
A maior parte do grupo parlamentar socialista não poderá comparecer
ao tradicional beija-mão no Palácio da Ajuda.
A tomada de posse do
novo Governo de António Costa gerou esta quarta-feira um incidente
institucional entre a Presidência da República e o Parlamento.
Depois de se saber que Cavaco Silva tinha agendado a cerimónia para
as 16h desta quinta-feira, um conjunto de deputados socialistas não
deixaram de manifestar o seu “mal-estar” pelo facto de tal ter
sido feito para uma altura em que a Assembleia marcara um debate
sobre as medidas extraordinárias apresentadas pelo PS. O resultado
prático da decisão significa que a maior parte do grupo parlamentar
socialista não poderá comparecer ao tradicional beija-mão no
Palácio da Ajuda.
As críticas não
demoraram muito. O vice-presidente da AR, Jorge Lacão, foi um dos
protagonistas. “Talvez tivesse sido prudente que o senhor
Presidente tivesse tomado isso em conta”. O também socialista
Pedro Delgado Alves confirmou que muitos deputados do PS faltariam à
cerimónia. “Haverá uma delegação da bancada, liderada pelo seu
presidente [Carlos César]. O resto de nós não terá outro
remédio”, admitia.
Essa inevitabilidade
resulta, no entanto, da posição de força que a própria Assembleia
decidiu assumir em relação a Cavaco Silva. Os partidos
disponibilizaram-se a encontrar uma solução alternativa, mas o
presidente da AR, Ferro Rodrigues, decidiu manter a agenda depois de
“contactos informais” com as diferentes bancadas. Para fazer
passar a mensagem que o Parlamento não altera a sua ordem de
trabalhos devido a uma decisão de outro órgão de soberania.
Assembleia debate
programa do Governo PS na próxima semana
No entanto, a
Presidência da República rejeitou qualquer responsabilidade no
incidente. “A hora da tomada de posse foi acordada entre o
Presidente e o doutor António Costa”, frisou uma fonte oficial de
Belém.
O mal-estar foi
ainda exacerbado pela recepção, ao meio-dia, de Passos Coelho por
Cavaco Silva para a última reunião semanal como primeiro-ministro.
Antes disso, o Governo fará a sua última reunião do Conselho de
Ministros.
Depois de frisar não
considerar “adequado uma marcação a coincidir com uma sessão
plenária”, o líder parlamentar comunista acrescentou que o PCP
manifestara a disponibilidade para que a sessão parlamentar pudesse
“começar depois da tomada de posse”. Isto porque João Oliveira
é afectado pela decisão, uma vez que a sua presença na posse o
impede de participar no debate, tal como estava inicialmente
previsto.
O PS fez saber a
Ferro que não levantava “obstáculos” a esse atraso. Da mesma
forma, o PSD transmitiu numa “conversa informal” com Ferro
“abertura” para qualquer decisão que este “viesse a tomar”.
Já o CDS, disse que não foi contactado. “Ninguém nos falou”,
disse o líder parlamentar Nuno Magalhães. “Mas, também, já não
é comigo, este Governo não é o meu”, rematou ao PÚBLICO.
Quem também não
parecia ontem muito preocupado com o incidente era Rocha Andrade, o
socialista que elaborara as propostas em discussão e que toma posse
como secretário de Estado. “Contactei o coordenador do PS na
Comissão de Finanças, basicamente, para lhe passar a pasta e lhe
dizer 'desenrasca-te'”, disse de forma bem disposta o futuro
secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
Abraços e
arrumações
Apesar da
sobreposição de agendas, a boa disposição de Rocha Andrade era
partilhada pelos restantes socialistas em vias de assumir funções
governativas. Para estes, o dia foi passado a receber cumprimentos,
arrumar gabinetes e acertar competências futuras.
Parecia ser isso que
a futura ministra Leitão Marques e a sua secretária de Estado,
Graça Fonseca, fizeram durante mais de um quarto de hora em pleno
plenário. Pelo meio iam recebendo cumprimentos de outros deputados.
À mesma hora,
Isabel Oneto e Jorge Gomes acertavam o mesmo nos corredores de São
Bento. A caminho de assumirem funções no MAI, Gomes acertava com
Oneto quem faria o quê. “A ministra deu-nos a liberdade de
podermos fazer algumas opções”, confirmava o ainda deputado.
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Por essa altura, já
o futuro secretário de Estado das Comunidades tinha feito questão
de “ouvir os deputados com responsabilidades” na área que
haveria de tutelar e fazer “uma leitura mais aprofundada dos
compromissos assumidos pelo PS”. E também ler as inúmeras
mensagens que lhe aterravam no correio electrónico e telemóvel. Só
SMS, José Luís Carneiro contavam mais de 100. E Jorge Gomes
confidenciou ter ainda para ler 172.
Quem sofreu foram as
baterias dos telemóveis dos futuros governantes. O novo titular da
pasta da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, passou grande parte
dos momentos em que esteve visível com o aparelho colado ao ouvido.
O mesmo se passou com a secretária de Estado dos Assuntos Europeus.
Já o novo ministro
adjunto parecia menos atarefado. Eduardo Cabrita passou o dia a
“encerrar coisas de quem esteve seis anos no Parlamento”. Ainda
passou por uma comissão e pelo Plenário. Afinal a sua agenda estava
mais preenchida no dia seguinte. Ao contrário de Passos Coelho e
António Costa – que se reuniram ontem – Cabrita só esta
quinta-feira se deslocará à Presidência do Conselho de Ministros
para receber a pasta do seu antecessor.
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