Hungria
vai pedir anulação da distribuição dos refugiados pela UE
ANA GOMES FERREIRA
17/11/2015 - PÚBLICO
O
antagonismo para com os refugiados sobe de tom em alguns países
europeus. Junto à ilha grega de Kos, em mais um naufrágio, morreram
nove pessoas, quatro delas crianças.
Dois países da
União Europeia deram esta terça-feira mais um passo de ruptura com
a política de Bruxelas para os refugiados e imigrantes que continuam
a chegar oriundos da Síria, Afeganistão, Iraque e outros países
com guerras e conflitos. Em Budapeste, o Governo populista e de
direita vai pedir ao Tribunal Europeu para anular a decisão de
distribuir pelos países-membros 160 mil pessoas chegadas a Itália e
à Grécia. Em Varsóvia, o futuro responsável pela diplomacia
sugeriu que os sírios devem ser devolvidos ao seu país para
"lutarem pela liberdade".
Enquanto as posições
políticas e a retórica se extremam, o fluxo de chegadas de
refugiados e imigrantes não abranda e as tragédias não páram —
esta terça-feira, nove pessoas morreram afogadas ao largo da ilha
grega de Kos, depois de o barco insuflável onde viajavam se ter
afundado. Sete pessoas que seguiam na frágil embarcação foram
retiradas das águas já geladas do Mediterrâneo pela polícia
marítima grega.
Quatro dos mortos
são crianças; há mais duas crianças entre os vários
desaparecidos.
A embarcação tinha
saído da costa turca durante a noite de segunda para terça-feira e
fora detectada por um navio patrulha ao serviço da agência de
segurança nas fronteiras da UE, Frontex.
O primeiro-ministro
grego, Alexis Tsipras, esteve esta terça-feira na Turquia para
debater com o Governo de Ancara formas de travar a partida dos
refugiados.
Mais a norte, já
bem dentro do território da União Europeia, na Hungria, o
primeiro-ministro, Viktor Orbán, discursava no Parlamento. "Enquanto
este Governo respirar, não haverá quotas e não ficaremos nem com
um migrante."
Orbán fez um
discurso inflamado e conseguiu, com 145 votos a favor e 41 contra
(também houve uma abstenção), que o Parlamento aprovasse uma
resolução que permite ao Governo contestar uma decisão tomada por
Bruxelas no início do Outono que determina a distribuição de um
grupo de 160 mil refugiados pelos Estados-membros. Os países recebem
um determinado número de pessoas consoante a sua capacidade
económica — trata-se de um sistema de quotas, apesar de a UE ter
retirado esta palavra da equação, por haver muitos países contra
essa fórmula.
O texto aprovado
pelo Parlamento húngaro diz que a divisão dos refugiados por quotas
"não tem em conta o princípio de subsidiariedade e não dá
aos parlamentos nacionais a possibilidade de exprimir a sua opinião"
na matéria. "Nós decidiremos quem deixamos entrar no nosso
país e com quem queremos viver", disse Viktor Orbán no
Parlamento.
O ministro da
Justiça, Laszlo Trocsanyi, citado pela AFP, declarou que o pedido de
anulação da decisão vai chegar ao Tribunal Europeu em Dezembro.
Até lá, a Hungria — por onde passaram 400 mil pessoas até o
Governo decidir encerrar totalmente as fronteiras, em meados de
Outubro — não aplicará a decisão e não receberá qualquer
refugiado.
O Governo da
Eslováquia também ameaçara apresentar às instância europeia
(tribunais) um recurso da decisão europeia de distribuição dos 160
mil refugiados, mas ainda não o fez.
Também esta
terça-feira, em Varsóvia, surgiram sinais de que o novo Governo —
saído das eleições de 31 de Outubro, que a direita nacionalista e
eurocéptica venceu — liderado por Beata Szydlo, vai adoptar uma
linha próxima da de Orbán. Aqui, a retórica foi mais longe e
aquele que será o responsável pela diplomacia (o Governo ainda não
foi aprovado pelo Parlamento) fez declarações muito polémicas em
relação aos sírios que fogem de várias guerras — o território
do que era este país do Médio Oriente é disputado pelas forças de
Bashar al-Assad, que combatem a oposição armada que o quer
derrubar, e pelos radicais do Estado Islâmico que já dominam uma
grande parte do mapa.
Disse Witold
Waszczykowski, próximo ministro dos Negócios Estrangeiros:
"Centenas de milhares de sírios chegaram à Europa. Podiam
formar um exército. Dezenas de milhares de homens jovens saem dos
botes com os seus iPad na mão, e, em vez de pedirem de beber e
comer, perguntam onde podem ligar os telefones e portáteis. Podiam
ir combater para libertar o seu país."
Perante o
antagonismo crescente de alguns países em relação ao acolhimento
dos que fogem da guerra e do terror do Estado Islâmico — o grupo
jihadista que reivindicou os atentados de sexta-feira 13 em Paris —,
o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR)
pediu aos Estados para não quebrarem a promessa de acolhimento e,
sobretudo, para não associarem os atentados de Paris à chegada e
redistribuição dos refugiados.
"Estamos
preocupados com a reacção de certos Estados que querem acabar com o
programa de distribuição em curso e que querem erguer barreiras e
muros", disse uma porta-voz do ACNUR, Melissa Fleming.
Já quase 900 mil
pessoas chegaram à Europa nesta vaga migratória, mas desde que a
decisão de distribuição de 160 mil refugiados começou a ser
aplicada só foram distribuídas pelos Estados-membros cerca de 150
pessoas.
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