Banqueiros
querem estabilidade, finanças consolidadas e compromissos cumpridos
Maria Lopes 18/11/2015 - 10:54
(actualizado às 20:51)PÚBLICO
Presidente recebeu a banca
em Belém, mas ninguém se pronunciou sobre soluções de Governo.
Nesta quinta-feira é a vez de economistas e cinco ex-ministros das
Finanças e amanhã Cavaco Silva reúne-se novamente com os partidos.
Com palavras diferentes mas
todos com o mesmo sentido: os sete banqueiros que esta quarta-feira
passaram pelo Palácio de Belém defenderam que o país precisa de
estabilidade económica, financeira e fiscal, de prosseguir o esforço
de consolidação das contas públicas, e de cumprir os compromissos
internacionais. Entre a maioria dos que apenas fizeram uma curta
declaração aos jornalistas e os raros que aceitaram perguntas,
nenhum quis falar sobre a natureza do próximo Governo – se de
gestão ou de iniciativa do PS –, mesmo que isso possa ter
implicações sérias seja no rating da República seja no
cumprimento dessa espécie de caderno de encargos que os banqueiros
deixaram ao Presidente da República.
Fernando Faria de Oliveira,
presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB), foi directo:
um futuro novo executivo deve ter “capacidade de acção
estratégica, muita lucidez e grande realismo”. Para isso, o patrão
dos banqueiros considera ser “fundamental” criar um “clima de
confiança e de segurança” junto dos cidadãos e dos mercados “não
só dos financeiros mas também dos mercados políticos”. Para isso
é fundamental que se continue a cumprir os compromissos
internacionais – “europeus e outros”, vincou -, se
prossiga o “rigor das finanças públicas e se acelere a
trajectória económica que o país vem seguindo desde os últimos
anos”.
O presidente da APB salientou
ser “absolutamente necessário criar condições para atrair,
mobilizar e dar segurança aos investidores”, mas também é
preciso que “haja um grande contributo do Governo para a
estabilidade do sistema financeiro”. Vincando que a criação de
riqueza depende do investimento e do financiamento”, Faria de
Oliveira defendeu que o país, as empresas e os cidadãos precisam
que haja um sistema financeiro “sólido e rentável”, com “bancos
fortes”. Porque, argumentou, “não há possibilidade de melhorar
a condição de vida dos portugueses se não houver criação de
riqueza, que antecede sempre a sua distribuição”.
Faria de Oliveira foi o último
dos sete banqueiros ouvidos nesta quarta-feira por Cavaco Silva sobre
as “condições de financiamento da economia portuguesa no quadro
da rejeição" do programa de Governo e sobre as "orientações
de política económica e financeira essenciais para assegurar a
estabilidade do sistema financeiro", descreveu a Presidência.
O presidente do Millennium
BCP, Nuno Amado, defendeu que os dois aspectos mais importantes a que
um futuro Governo deve dar atenção são a estabilidade nas
políticas, em especial nas fiscais para aumentar a confiança dos
investidores, e o cumprimento dos “compromissos mais importantes”
a nível europeu – e para isso o Orçamento [do Estado] tem um
papel “charneira”.
Eduardo Stock da Cunha,
presidente do Novo Banco, recusou qualquer relação entre a natureza
do próximo Governo e o processo de venda. Preferiu focar-se em
defender que “Portugal terá de continuar a garantir junto dos
mercados internacionais que honra os seus compromissos, que é uma
pessoa de bem” e manter a trajectória de consolidação das contas
públicas. Questionado sobre a demora do Presidente em decidir,
vincou que Cavaco Silva “sabe bem os prazos de que dispõe;
compete-nos a nós aceitar e respeitar as opções que tem nessa
matéria e assumir isso com a maior das tranquilidades”. Não há
porém, na lei, quaisquer prazos para que o Chefe de Estado decida
sobre o assunto.
À necessidade de estabilidade
do sistema financeiro defendida por todos, o presidente da Caixa
Geral de Depósitos, José de Matos, acrescentaria a “estabilidade
macroeconómica em geral para o país". "Nós somos um
banco da economia social e por isso preocupam-nos os impactos sociais
de um clima de instabilidade e de retrocesso", vincou o
presidente do Montepio Geral, José Félix Morgado, sem especificar
que tipo de Governo traria essa instabilidade. Também numa
declaração sem direito a perguntas, António Vieira Monteiro, do
Santander Totta, defendeu que Portugal precisa de um Governo "forte
e estável” e salientou a importância fundamental da diminuição
do desemprego e a justiça social - a mesma que Passos disse ser o
centro da acção do seu novo Governo - para o desenvolvimento do
país.
Fernando Ulrich, do BPI,
considerou que Passos fez um “excelente trabalho” desde 2011, mas
“confia” que António Costa, se for nomeado primeiro-ministro,
terá o “sentido de responsabilidade necessário” para manter o
“rigor das finanças públicas e a garantia da estabilidade do
sistema financeiro”.
Economistas e ex-ministros
quinta-feira, partidos na sexta
Os conselheiros de Estado
escolhidos por Cavaco, Vítor Bento e António Bagão Félix, assim
como os antigos ministros das Finanças do PS Fernando Teixeira dos
Santos, Luís Campos e Cunha, Daniel Bessa, e do PSD João Salgueiro,
e o antigo ministro da Economia Augusto Mateus (PS) são os
economistas convidados por Cavaco Silva para audiências nesta
quinta-feira. São quatro ministros de governos socialistas e dois de
executivos sociais-democratas. Amanhã será a vez dos sete partidos
com assento parlamentar.
Daniel Bessa (PS) defendeu há
pouco tempo não ser bom ter um Governo de gestão, e que este é
antes uma “solução de recurso", que poderá acabar em
“inflação”. O também socialista Campos e Cunha disse em
Outubro estar “relativamente convencido de que [um governo à
esquerda] nunca acontecerá”. Seria um “saco muito estranho” e
uma solução “possível” mas que não lhe agradava muito
prometia ser “duradoura” para o país.
Teixeira dos Santos afirmou há
semanas que "a cor política do Governo não será o que mais
importará aos agentes económicos. Será, isso sim, dissipar
incertezas criadas" e que maior desafio de governo do PS é
repor a confiança interna e externa. E o economista Augusto Mateus
considerou “muito positivo” que a nova composição do Parlamento
traga a “oportunidade para haver uma relação mais interactiva
entre os partidos e para colaborarem mais uns com os outros naquilo
que é do interesse nacional". Mas avisou: "Não podemos
correr o risco de deixar que os mercados, sobretudo os que financiam
a economia portuguesa, convirjam para uma situação de desconfiança
sobre o futuro da nossa economia. É algo, obviamente, que deve ser
profundamente acautelado."
À direita, Bagão Félix
acusou António Costa de estar a fazer uma “batota eleitoral” ao
querer impor um Governo de iniciativa do PS. João Salgueiro, embora
admita que um Governo de “maioria de esquerda consistente podia ser
uma boa experiência, ainda que arriscada”, rejeita a eficácia de
“um simples apoio parlamentar” que “dificilmente será estável
e penaliza, em especial, o PS”. Adivinha um “estado de graça de
seis meses” com a complacência da Europa, “mas depois vamos
pagar a conta”, avisa.
A audição dos partidos
costuma ser o último passo do Presidente antes de anunciar a sua
decisão, mas Cavaco Silva poderá ainda convocar o Conselho de
Estado, para o que precisa de três dias de antecedência. com Sérgio
Aníbal
Governo
de “iniciativa presidencial” não, o resto talvez…
Paulo Pena
20/11/2015 - PÚBLICO
Cavaco
Silva prepara-se para ouvir os partidos, pela segunda vez desde as
eleições. As hipóteses do Presidente são limitadas.
Sem o poder máximo
de que dispõe no sistema político português – o de dissolver o
Parlamento –, Cavaco Silva tem tentado conquistar espaço político
comprando tempo. Ouvindo figuras que escolheu, e que na sala das
bicas do Palácio de Belém transmitem à opinião pública, em
conferências de imprensa sucessivas, as suas dúvidas e os seus
anseios. Algumas e alguns coincidirão com os do próprio Presidente.
Mas restam-lhe poucas alternativas para lidar com um Parlamento que
parece disposto a levar o braço-de-ferro até ao fim.
É mais seguro
analisar o que Cavaco Silva recusa, do que aquilo que tenciona fazer.
Em 2013, durante a crise provocada pela demissão de Paulo Portas,
Cavaco mostrou-se favorável a um Governo de entendimento entre os
então três maiores partidos: PSD, PS e CDS. Enquanto duravam os
encontros entre as direcções de Pedro Passos Coelho, António José
Seguro e Paulo Portas, ganhou espaço um rumor. Cavaco poderia
indigitar um Governo de iniciativa presidencial que materializasse
esse entendimento, mesmo que os partidos não chegassem a qualquer
acordo. Cavaco foi rápido a desmentir a possibilidade, em
declarações à RTP, em Julho de 2013: “Se um Governo que passa na
Assembleia não responde perante o Presidente mas só perante a
Assembleia, então não faz qualquer sentido um Governo de iniciativa
presidencial.”
Para o efeito, o
Presidente citou a revisão constitucional que retirou ao chefe de
Estado a tutela política sobre o Executivo e a possibilidade de o
exonerar: “É um plano que está totalmente excluído, porque desde
1982 com a revisão constitucional os Governos deixaram de responder
politicamente perante o Presidente da República.”
Por isso, os
deputados que se opuseram a esta diminuição dos poderes
presidenciais criticaram, na altura, como Vital Moreira, a limitação:
“Cortam-lhe o braço direito e acrescentam-lhe um dedo à mão
esquerda”, ironizou o constitucionalista. Outros, como André
Gonçalves Pereira viram nesta alteração uma mudança de regime, do
semi-Presidencialismo para um “parlamentarismo regulado”.
Em troca, o
Presidente recebeu a tal “bomba atómica”, a dissolução, que
Cavaco Silva não pode usar (porque o Parlamento só pode ser
dissolvido seis meses após a sua posse).
Esse é o poder que
permitiu, por exemplo, a Jorge Sampaio impor limites ao Governo de
Pedro Santana Lopes. Cavaco não pode, como Sampaio, invocar o poder
de dissolver o Parlamento para fazer cumprir aquilo que considera ser
obrigatório na actuação do Governo.
Parecem restar-lhe,
então, apenas duas alternativas: indigitar António Costa, que
dispõe de uma maioria parlamentar que viabiliza o seu Governo, ou
manter Pedro Passos Coelho em “gestão”, com poderes limitados e
em minoria no Parlamento.
Cavaco Silva ainda
não convocou o seu órgão consultivo, o Conselho de Estado. Mas se
o fizer, provavelmente ouvirá dos seus 19 conselheiros a mesma
conclusão. Costa ou Passos.
Mas, tal como em
2013, Cavaco pode surpreender.
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